Capítulo 14

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A viagem para o sítio dos pais de Henrique transcorreu numa falsa calmaria. Apesar das conversas quase triviais que tínhamos no carro, era perceptível o desejo sexual do rapaz. Estávamos nos aproximando do nosso destino, e eu reconhecia o local da nossa última grande briga.

Apesar de o dia não estar nublado, em meus olhos passava a lembrança da tempestade, dos raios, e eu acuada debaixo de uma árvore, vestindo apenas um roupão. Tudo isso por ter negado a Henrique algo guardado por mim há tanto tempo.

Já naquela segunda vez, ele agia como se não tivéssemos trocado tantas ofensas e ameaças. Como pude imaginar, o rapaz bem poderia ter ignorado os problemas da nossa última tentativa, pois eu não era tão relevante assim em sua vida. Ou, ainda, ele preferia dar prioridade a garantir mais uma transa no final de semana, e escolhera voluntariamente deixar seu ego ferido e levar-me para cama, a fim de sentir-se "vingado".

Talvez, eu nunca soubesse das suas reais intenções. A única certeza que eu possuía era a de que ele contava os segundos para enfiar seu membro em mim e conseguir finalmente demarcar o seu território.

Pude confirmar essas minhas impressões em todo o seu gestual durante a viagem, as conversas provocativas, a mão em minha coxa levantando a barra de meu vestido floral.

Seus dedos grossos muitas vezes paravam próximos a minha virilha, e ele parecia hesitar, por um curto instante, se prosseguia. Claramente, estava afoito. Fazia, porém, certo esforço para não se afobar demais como da última vez, todavia era inútil. Dava para ver no seu olhar a vontade de me levar para cama.

Em poucas horas de viagem, chegamos ao sítio dos pais dele. Mesmo em fim de tarde, o sol mais presente dera novo brilho ao verde onipresente do lugar.

Ao atravessarmos a porteira eletrônica da propriedade, percebi que eu prendia a respiração. Lentamente, soltei o ar, deixando o meu tórax relaxar.

Após estacionarmos o carro, ele pediu-me para não descer de imediato. Confusa, esperei. O rapaz contornou o automóvel e abriu a porta para mim. Saindo do transporte, dei-lhe sorriso absoluto de surpresa e alegria pelo seu gesto de cavalheirismo. Brincando, ele ainda fez reverência para eu passar e falou-me:

– Madame...

Embarcando em seu gracejo, fiz outra referência em agradecimento. Rimo-nos os dois. Ele pegou na minha mão. Ainda empolgado, andou comigo de mãos dadas até a varanda de sua casa. E foi assim que atravessamos a sala e as escadarias a nos levar para o segundo nível da casa.

Enquanto caminhávamos pelo corredor de vidro do andar superior, Henrique falava-me que, dessa vez, seria algo mais especial. Disse-me que, se eu preferisse, poderia até mesmo dormir em um quarto separado.

Eu estava com a boca aberta, entretanto não sabia o que responder. Ver tanto gentileza assim daquele rapaz era algo absolutamente inédito, até mesmo assustador. Longe de estar mais tranquila, falei:

– Calma, Henrique. Isso até pra mim é muito século dezenove.

Ele deu uma gargalhada com minha piada, enquanto eu forçava um riso para parecer mais relaxada. Justificando-se, Henrique contou-me que, caso eu não me sentisse preparada ainda e precisasse ficar um tempo sozinha, teria espaço para tanto.

Nesse momento, parei a minha caminhada e fiquei de frente para aquele homem alto. Olhando fixamente em seus olhos cor de mel, procurava estudar a sua expressão.

Claro, todo aquele cavalheirismo não-natural era para me fazer sentir-me mais segura, de modo que relaxasse e conseguisse me entregar a ele. Por mais que suas intenções finais fossem egoístas, porém, dessa vez ele fazia um esforço consciente para não ser agressivo.Resolvi, portanto, ficar menos na defensiva, para não provocar o lado mais afobado dele. Suavemente, repousei uma mão minha no lado do seu rosto e lhe sorri, agradecendo.

Permanecendo de mãos dadas comigo, abriu a porta de nossos aposentos. Franzi o cenho ao perceber sobre a cama, um pedaço de tecido vermelho. Soltei a mão de Henrique e lentamente caminhei na direção daquele leito. Era um lindo vestido de tecido acetinado na cor escarlate.

Meus dedos finos e alvos estenderam-se, tocando aquela maciez infinita da alta-costura. Com as duas mãos, ergui-o na altura dos olhos, com o sorriso trêmulo de emoção. Num impulso, abracei a roupa. Esfreguei meu rosto. Com as narinas, inspirei profundamente o seu perfume.

Vindo por trás, Henrique abraçou-me, encostando todos o seu corpo em mim. Pude sentir os seus músculos firmes pressionando-se contra a minha pele. Mesmo vestido, aquele rapaz emanava muito calor.

Voltei-me para Henrique e lhe abracei, agradecendo-lhe pelo presente. Permanecendo inesperadamente carinhoso, ele retribuiu o gesto. E, por um longo momento, aquilo permaneceu só assim, um longo abraço bem terno e calmo.

Quando nos afastamos, o rapaz encarou-me profundamente nos olhos. Era a primeira vez que via uma expressão serena em sua face. Sua mão forte desceu pelo meu rosto, enquanto seu polegar brincava com as curvas de minha boca. Com a voz calma, num tom reconfortante, ele disse:

– Quero que você se sinta bela hoje, se sinta a mais especial do mundo. Essa noite vai ser sua, hoje.

Um sorriso espontâneo iluminou a minha face, enquanto meus olhos marejavam-se por todo aquele cuidado inesperado por parte daquele loiro bronzeado de praia. Sem prolongar muito a nossa conversa, Henrique foi andando em direção à porta, enquanto falava:

– Vou cuidar deixar tudo certo pro nosso jantar.

– Você cozinha?

Ele deteve-se à porta, rindo.

– Claro que não, comprei tudo pronto de um maravilhoso restaurante tailandês de Recife, você vai gostar. Hoje, preparei tudo especial pra você.

Após ele fechar a porta, voltei a abraçar o vestido que havia ganhado. Rindo, deitei com aquela maravilha de um vermelho profundo na cama. Rolávamos no colchão macio, enquanto controlava-me para não gargalhar. Parei de barriga pra cima, com os braços jogados e relaxados acima da cabeça.

Inspirei profundamente o ar daquele sítio. Logo em seguida, deixei meus pulmões relaxarem, expirando e levando consigo todas as minhas preocupações. Mesmo que fosse um grande esforço consciente para manter toda aquela gentileza, ao menos eu sabia que ele não tentaria me atacar logo de cara. Aos poucos, já começava a me tranquilizar.

Talvez, meu plano poderia dar certo.

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