Capítulo 38

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Com muita preguiça e cansaço, aquele homem acordou ao meu lado. Eu ainda estava deitada em seu peito, apenas de calcinha e sutiã. Com a face completamente inchada, ele questionou-me que horas eram. Conferi no relógio do meu celular, dizendo-lhe que já eram quase dez da manhã.

Fernão arregalou os olhos, espantado por ter dormido tanto. Disse-lhe que provavelmente deveria ser pelo cansaço das últimas horas, pois desde a viagem ele não havia parado de trabalhar.

Concordando com os meus argumentos, ele envolveu-me em seus braços. Ficamos assim por um longo tempo, abraçados naquela cama.

Ouvi o ronco de seu estômago. Nós nos entreolhamos, rindo. Ainda com sua bela face bronzeada inchada pelo sono, Fernão me falou:

– Acho que minha solitária quer comida.

– Mas aqui tá tão bom – falei, abraçando-o com mais intensidade.

– Então, vamos pedir pra que tragam o café da manhã aqui.

Com um telefonema, o desejo do governador foi atendido. Fomos tomar o desjejum na varanda. Os serventes limparam a mesa da sacada, tirando as taças e o vinho que eu havia colocado ali na noite anterior.Após nosso café estar posto, sentamos para comer, admirando o infinito do mar Atlântico, com o sol lançando seus raios dourados sobre aquele tapete tremulado do oceano.

Fernão planejava o resto de nosso dia. Queria levar-me para mergulhar no mar, para vermos tubarões, nadarmos com golfinhos, iríamos experimentar toda a natureza intocada daquele arquipélago. Já eu, atenta e apaixonada, observava tudo o que aquele homem dizia.

Feliz com a minha empolgação de menina, ele passou a mão em meu rosto, dizendo:

– Sobre a noite anterior...

Abaixei ligeiramente o olhar, já pedindo desculpas.

– Não é isso – ele se corrigiu. – Eu já disse que estou disposto a esperar. – Tornei a encará-lo. – E também disse que eu vou cuidar de você. Até de sua prima posso cuidar.

Franzi o cenho, porém sorrindo.

– Vou ajudar vocês duas. Você me disse que estava com aluguéis atrasados.

– Por favor, eu não quero que você pague meus aluguéis. Não ia me sentir confortável.

– Tudo bem! Então, vamos fazer assim; eu tenho muitas propriedades, alguns flats e apartamentos que alugo. Geralmente, pego esse dinheiro pra dar de mesada aos meus filhos. Só que eles não precisam tanto quanto você. Que tal você e sua sobrinha morarem num deles por enquanto, só enquanto tudo se arranja?

Fiquei boquiaberta, gaguejando alguma resposta que não parecia querer vir. Ele riu-se com meu atrapalho, e se adiantou:

– De qualquer forma, já que vamos ficar junto, vamos precisar de um local bem discreto e só nosso, pois Henrique já conhece o teu apartamento. E você não precisa pagar aluguel, nem se preocupar com as despesas de lá. Depois, eu arranjo com algum amigo político um emprego pra você. Daí, você vai poder trabalhar e se sustentar. Por enquanto, eu vou ajudar você. Agora, só tem uma condição.

– Qual? – questionei, franzindo o cenho e torcendo para que não fosse fazer sexo de chupeta e Maria-Chiquinha.

– Já está na hora de você terminar o seu relacionamento com Henrique. Eu vejo o quanto a culpa tá te atormentando. Essa é a coisa mais correta que você pode fazer. Então, você vai ser somente minha.

Suspirei, dando-lhe um sorriso algo desanimado. Em seguida, confessei:

– Tenho medo do que ele pode fazer comigo quando eu terminar esse namoro. Você sabe o quanto que ele é nervoso.

– Então, marque em um lugar público.

– Acho que não vai adiantar muito. Ele é capaz de ignorar as outras pessoas e me agredir mesmo assim. – Repousei minha mão na de Fernão. – Eu não teria você pra me proteger. – Ele sorriu, envaidecido. – Já tinha pensado em terminar, mas não tinha pensado ainda em uma maneira segura... a não ser que... você me ajude.

Naquele momento, foi a vez de Fernão fazer uma expressão de confuso. Resolvi me explicar:

– Calma, você não vai se intrometer diretamente nesse assunto. Eu queria ter uma conversa definitiva com teu filho na casa de vocês. Dessa forma, você estaria por perto caso ele surtasse e partisse pra cima de mim. Agora... – suspirei, com certa impaciência – você vai ter que convencer Hilda a me deixar ir pra lá. Da última vez que eu fui, ela até me jurou de morte.

– Não se preocupe. Nem que eu bote uma focinheira em Hilda, ela vai deixar você ir lá. Desde que você seja só minha, vou fazer tudo por você.

Dei um pulo, beijando-lhe a face. Muitos, muitos beijos, enquanto ríamos. Quando voltei pra minha cadeira, ainda estava sorrindo. Após um gole em seu suco de laranja, Fernão me perguntou:

– Quantos anos mesmo tem essa prima?

– Onze.

– É tão bonita como você?

– Ela é uma graça. Mas é muito mais tímida do que eu, quase não fala.

– Ótimo. Pelo menos já sei que ela não vai dar trabalho.

Trocamos sorrisos. Escondemos intenções. Para mim, no entanto, estava tudo mais claro do que os raios jogados sobre o mar azul-turquesa de Fernando de Noronha.

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