Capítulo 17

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Aquele domingo terminou com pipoca e um filminho na televisão. Tive que distrair minha cabeça para conseguir baixar o meu nível de adrenalina.

Deixei o meu celular com a campainha e a vibração desligados. Ao término da sessão, peguei o aparelho e vi dezessete chamadas não atendidas de Henrique.

Àquela hora, provavelmente ele ainda deveria estar no sítio dos seus pais no interior. A combinação daqueles remédios com álcool era forte o suficiente para impedi-lo de se levantar da cama e dirigir. Estranhamente, não havia mensagem de texto, ou algo parecido. Era como se ele quisesse saber o que havia ocorrido, porém ao mesmo tempo não queria descobrir.

Deitei-me na cama apenas com roupas de dormir. Desliguei o meu celular, pois havia deixado o aparelho ligado apenas para saber quando Henrique tinha acordado.

Ao repousar o dispositivo no criado-mudo, dei uma risadinha ao lembrar que havia deixado um bilhete debaixo do celular de Henrique, sobre a mesinha de cabeceira da cama. No papel, estava escrito em letras de forma:

"Não pergunte ao caseiro e nem tente chamar a polícia. Você não vai querer que todo mundo descubra porque o seu bumbum está doendo e sangrando. Beijo e me liga".

Suspirei, olhando para o teto. Aos poucos, deixei-me levar pelo sono que chegava com toda a sua força. Não demoraria para que Henrique viesse atrás de mim. Restava-me, portanto, esperar.

***

Não acordei muito cedo na segunda-feira seguinte, pois a aventura dos últimos dias havia me cansado bastante. Ainda deitada entre meus lençóis, tive que lutar para domar a preguiça em meu braço e estende-lo.

Sem olhar, tateava a mesa de cabeceira procurando o meu celular. Quando encontrei o aparelho, pressionei o botão de ligar e esperei o sistema ser iniciado. Com um olho fechado e outro aberto, tentava focalizar a tela do dispositivo em minha visão.

Primeiro, conferi a hora. Dez da manhã. Logo em seguida, seguiram-se diversos bipes. Eram as muitas notificações de ligações encaminhadas para a caixa postal; catorze, no total. Com toda a certeza do mundo, era Henrique.

Levantei-me, e quase pude escutar a ferrugem dos meus ossos estalarem. Após vestir um roupão, saí do quarto. Lenta e tateando a parede, andei na direção da varanda.

De modo sorrateiro, abri o vidro da sacada e fui pelos cantos até encontrar o batente. Escondia-me, escrutinando cada local de minha rua.

Lá embaixo, bem na esquina, encontrei um carro esportivo azul-escuro, escondido entre as árvores da calçada. Era difícil ver um modelo importado como aquele na rua do meu edifício. Facilmente, reconheci o veículo. Sim, Henrique me esperava.

Bem, ele não havia mandado mensagem, apenas ligava. Também, não tentou passar por cima do porteiro para subir ao meu apartamento, apenas esperava. Era como se ele estivesse me evitando, ao mesmo tempo que me procurava. Era o desejo e o medo de descobrir porque seu traseiro doía durante a viagem de volta para Recife.

Resolvi deixá-lo esperar mais um pouco. Tomei banho, almocei, arrumei a casa e coloquei um vestido simples e claro de alça que ia até os joelhos, com uma sapatilha escura.

Coloquei meu celular em uma bolsinha de mão e andei até a porta. Por fim, saí de casa como se fosse à padaria comprar um pão doce para o lanche da tarde.

Distraidamente, dei boa tarde ao porteiro e fui andando pela calçada da minha rua. O dia não estava ensolarado, pois no céu havia diversas nuvens, contudo estava longe de ameaçar chuva.

Caminhava observando o pouco movimento, enquanto as árvores balançavam com o vento do fim da temporada de chuva. O barulho do farfalhar das folhas tomava conta do quarteirão.

De repente, um sobressalto. Um carro invadiu a calçada, pondo-se na frente do meu caminho. Mais ágil do que eu poderia prever, o motorista abriu a porta do veículo e deu um pulo. Era Henrique, a face mais cheia de fúria do que nunca.

Como uma tempestade, o rapaz avançava sobre mim. Num bote, o loiro agarrou o meu braço. Fui arrastada como um simples graveto até o banco do carona. Algumas poucas senhoras na rua apenas observavam, perplexas com toda aquela cena.

Quase me jogando sobre o banco do passageiro, Henrique apontava para a minha face, enquanto grunhia:

– Não levanta, ou mato você.

Ele ergueu a frente da camisa. Presa ao cós de sua calça, pude ver uma arma.

Sim, a sua reação não seria nada bondosa comigo.

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