Capítulo 31

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A água caía do chuveiro, batendo em meu rosto erguido para o alto. Descia por minha pele, percorrendo o meu pescoço, meus seios, minha cintura, minhas pernas. Ao mesmo tempo em que me lavava de toda a sujeira e da minha ansiedade, enchia-me de energia. Renovava-me para a nova vida que poderia começar a ter.

Apesar de o banho estar agradável, tinha que terminá-lo, pois não queria me atrasar. Enxuguei-me devidamente e terminei esse trabalho com a ajuda de um secador de cabelos. Em seguida, fui para o quarto, onde me esperava, pendurado num cabide na porta de meu guarda-roupa, um belo presente inesperado.

Mais cedo, no meio da tarde, o porteiro ligou para o interfone do meu apartamento, avisando-me que um homem havia deixado uma encomenda para mim. Estranhei, pois não havia pedido nada pela internet, sequer ligado para um serviço de entregas.

Quando desci, mal podia acreditar naquela peça de roupa devidamente embalada em um plástico protetor. Lá dentro, um bilhete com os dizeres "Um presente como prova da minha amizade. Estou sempre aqui para apoiar você. De seu amigo F".

Bem, se fosse realmente presente de amizade, não haveria problemas em colocar o nome dele. Mais importante para Fernão, porém, era manter a imagem de político sério, homem de família e da Igreja, incapaz de trair a esposa e insinuar-se para a namorada do próprio filho.

Tanto que duvido muito que o governador em pessoa tenha deixado aquela roupa ali. Era mais fácil, portanto, ter contado com a ajuda do seu motorista particular.

Já era dezenove horas da noite quando retirei aquele vestido do cabide. Coloquei-o pela cabeça, e o tecido leve deslizou tranquilamente por minha pele. Caminhei quase saltitando para a frente do espelho, ansiosa para ver como a roupa tinha ficado em mim.

O seu corte era perfeito. Era um vestido cinza claríssimo, quase branco. Era de alças, com um decote em formato de V bem generoso. A roupa descia até um pouco acima dos joelhos, numa distância de mais ou menos um palmo.

Impressionei-me com o olhar bem treinado do meu sogro. Acertou o meu número de primeira. Pelo visto, os anos paquerando e presenteando as moças que ele queria levar para cama o fizeram desenvolver essa habilidade, algo admirável para um machão metido a galanteador.

Peguei o meu celular em cima do colchão. Meu sogro ainda não havia me ligado. Também, não revelou o local de nosso jantar. Fiquei realmente curiosa para saber para onde ele me levaria. Provavelmente, seria bem privado, pois ele não iria querer ser visto pelos seus eleitores com uma garota jovem num jantar íntimo.

Quem me fazia mistério também era o meu querido Henrique. Meu namorado de chantagem não retornou nenhuma de minhas mensagens ou ligação desde nossa briga na casa de seus pais. Já havia se passado três dias e não obtive notícias do rapaz. Igualmente, Hilda não tentou entrar mais em contato, nem me ameaçar.

Por enquanto, estava tudo na paz, apesar de ainda sentir no ar a turbulência dos últimos acontecimentos.

Nesse meio tempo, entretanto, conversei com Fernão algumas vezes ao telefone, tarde da noite. No primeiro dia, quando eu havia feito a visita a minha sogra, meu sogro me ligara para saber como estava. No decorrer das outras vezes, porém, o tom da conversa estava mudando. Aos poucos, eu deixava de perguntar de Henrique e da minha sogra.

Conversávamos sobre coisas da vida, expectativas, do que gostamos. Eu, sempre tão tímida, até conseguia me abrir com aquele homem. Afinal, ele próprio disse-me, repetidas vezes, que queria me conhecer melhor. Resolvi, portanto, satisfazer essa sua curiosidade.

Terminei de me aprontar, calçando um salto cinco de couro preto. Sequei e prendi os cabelos num coque displicente com algumas mechas soltas, enquanto no rosto coloquei uma maquiagem suave com o lápis bem marcado no olho. Um cordão de prata discreto no pescoço e estava pronta. Bem na hora que Fernão me ligava para avisar que já me esperava lá embaixo.

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