Capítulo 48

2.1K 276 65
                                    

Sempre fui de analisar bem as pessoas com as quais me envolvia. Dessa forma, poderia escolher com certa segurança em quais relacionamentos investir, e quais conflitos deveria evitar.

Logo, não era para mim nada temerário confrontar Maria Cecília. A gordinha era só uma menina problemática e mimada recém-saída da adolescência. O máximo de dano que ela poderia me causar era nos meus tímpanos, por conta de sua voz aguda e alta.

Com Hilda, porém, sempre foi diferente. Desde o começo, sempre soube que enfrenta-la me traria mais malefícios do que vantagens. Dessa forma, esquivei-me ao máximo do faro apurado de minha ex-sogra; inclusive, intensifiquei essa atenção quando comecei a relacionar-me com Fernão.

Também pressenti que Hilda notava algo entre mim e o marido dela. Eu estava, no entanto, protegida pela incerteza da mãe de Henrique. Também, encontrava-me resguardada pela tendência daquela senhora em querer manter as aparências de seu casamento.

Logo, ela dificilmente confrontaria o esposo de modo direto, tentando esclarecer sua dúvida se o governador estava ou não tendo um caso comigo.

Se Hilda tivesse alguma prova concreta, porém, eu pressentia que ela seria capaz de atear fogo naquela casa para terminar minha relação com Fernão. Ainda, se ela foi capaz de ameaçar minha vida para me separar de seu filho, não queria nem imaginar o que ela faria comigo para acabar com o meu caso com o governador.

Naquele instante, porém, todo o meu esforço se esvaia por conta das fofocas de uma empregada doméstica.

Hilda terminou de escancarar a porta. Com gestos calmos, a senhora deu dois passos para dentro do banheiro. Cecília e eu encarávamos a dona da casa, ambas imóveis.

A esposa de Fernão estava vestida numa elegância ímpar, bem-disposta e com as duas mãos juntas em frente ao seu corpo. Dando um passo para o lado, para desbloquear a passagem, Hilda falou para a filha, porém olhando fixa para mim:

– Cecília, por favor, saia.

A gordinha tentou abrir a boca para falar algo, contudo a surpresa ainda havia roubado suas palavras. Teve um tempo apenas de balbuciar um "mamãe", pois Hilda acabou ordenando de modo mais firme a saída da filha:

– Saia e vá buscar seu irmão. Ele quem trouxe essa mulher, ele quem vai coloca-la pra fora. Não se atreva a voltar sem Henrique.

Cecília abaixou a cabeça, concordando com um sussurro. Ainda com o olhar atônito, a garota saiu do banheiro do escritório rapidamente, quase tropeçando nas próprias pernas.

Quando ficamos sozinhas, Hilda andou calmamente até a porta, fechou-a e girou a trava. Já eu continuei parada ao lado da pia, sem me mover.

A dona da casa posicionou-se a poucos centímetros de distância de mim. Era mais baixa, porém o olhar altivo e firme a faziam crescer mais meio metro. Por fim, estávamos face a face. Sem máscaras.

Juntando as duas mãos novamente na frente do corpo, Hilda começou:

– Quando Henrique me falou que traria uma namorada pra jantar em casa pela primeira vez, eu até ri e perguntei "Qual delas?". Ele não me respondeu. Na verdade, acho que ele nem saberia realmente quem iria trazer pra casa. – Deu mais outro de seus sorrisos suaves. – Meu menino não tinha condições de adivinhar que estava com uma piranha completa.

Enquanto suas palavras eram jogadas em minha face, eu tentava raciocinar uma saída. Faltava pouco para realizar a última etapa de meu plano, portanto não queria que aquela senhora estragasse tudo. Ainda tentando continuar calma, Hilda prosseguiu:

– Eu pensei que você era só uma passa-fome deslumbrada com um rapaz rico e bonito. Pensei até que você tinha ilusão de embuchar e dar o golpe da barriga. Rezava a Deus todos os dias pra que você nunca engravidasse dele.

CobiçaOnde histórias criam vida. Descubra agora