Capítulo 12- Filho de demônio...

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               —Amanhã?— pergunto, confuso, encarando os olhos negros de Nin— Não, eu não quero ser julgado amanhã! Eu tinha ao menos o direito de me preparar para me defender. Eu... Tenho meus direitos!

                Nin olha para mim, com um sorriso tão irônico que me faz murchar, abaixando a cabeça. Eu não estava mais entre os "Homens brancos", as leis dos semideuses eram diferentes. A Árvore Flamejante tinha regras diferentes do resto do Brasil... Como um país avulso. Pelo menos foi isso que entendi com "O Conselho", que havia visto Nin mencionar antes de mencionar. Fecho minha boca, escutando o que Nin tinha a me dizer.

               —Já acabou?—pergunta a Índia ruiva. Apenas balanço a cabeça positivamente, enquanto ela puxa o ar, se preparando para responder— Agora que acabou com o pití... Vou te explicar como as coisas funcionam por aqui. Nem todo tipo de criaturas magicas podem se abrigar sobre o Andurá. O Andurá é regido pelo conselho... Composto pelos semideuses, filhos dos Poderosos. Nós não costumamos admitir filhos dos Perverosos aqui... Eles costumam morar sozinhos aqui.

                 Olho para ela, com minha melhor cara de paisagem... Eu até aceitava o preconceito pela cor da pele, mas preconceito por ser filho de Jurupari? Levanto minha mão. Pedindo para que ela parasse de falar, para que pudesse fazer a minha pergunta. Estava possesso. Eu havia acabado de recusar Jurupari para ser escorraçado por esse bando de índios preconceituosos!

                 —Escuta, o que você quer dizer com Perversos e Poderosos? Não estou entendendo... Ou melhor, não quero entender— digo, encarando a garota com um olhar feio— O que eles tem contra mim, Nin? Pode me dizer, por acaso?

                 —Os Poderosos são os filhos dos deuses mais poderosos, como Tupã ou Guaraci... O conselho é formado de um filho de cada um desses deuses, o mais velho de cada.— diz Nin sem graça— Os Perversos são filhos de deuses como Anhangá e Jurupari... Os que são associados ao demônio. Nós não admitimos demônios em nosso santuário.

               Me levanto furioso, arrancando uma das tiras de couro, com penas decoradas preso em meu braço. Jogo a tira em Nin, rangendo os dentes e olhando para ela irritado. Ela havia acabado de me ofender na cara dura. Eu não aturaria que ninguém ficasse me ofendendo daquele modo, uma vez só já era demais. Emito barulhos estranhos, pensando no que dizer.

              —Escuta aqui— digo, olhando para ela— Eu não falei dessa porcaria que me obrigaram a usar, enquanto você usa essa roupa descolada. Também não reclamei da baleia tentando me amaldiçoar... Ou de ser julgado a respeito de minha vida valer a pena ou não. Porém, se tem uma coisa que não aceito, é você me chamando de demônio. Pensei que você fosse diferente deles, Nin, mas parece que alguns minutos são o suficiente para conhecer o caráter de alguém. É a propósito, engole essa porcaria de santuário que só protege durante a noite! Ainda se fosse como Hogwarts, com barreiras magicas... Mas não, essa porcaria de árvore velha nem funciona direito.

              Me viro tentando caminhar para longe, bufando de raiva. Enquanto isso, alguns grãos de Aiba Aimirim se aproximavam de mim na floresta... Talvez atraídos pela minha raiva. Nin não perde tempo, se levantando e andando ao meu lado, enquanto eu caminhava pela floresta, sem rumo e irritado. A ruiva me segue, com uma expressão de tédio no rosto.

              —A roupa é uma das regras de Andurá— diz Nin, inexpressiva— Eu tenho permissão de usar vestes comuns por ser a mediadora com o mundo lá fora... Decidiram me declarar mediadora pela minha ligação com o fogo. Vocês não entendem, chegaram na pior hora que poderiam... Nós estamos enfrentando um problema, o maior problema que já enfrentamos... E está direitamente ligado a Jurupari. Você só não foi assassinado pela vontade de Lizzy.

Crônicas da Floresta- Livro 1- A Árvore FlamejanteOnde histórias criam vida. Descubra agora