Quando eu acordei, percebi que meu relógio de pulso estava de volta ao meu braço, marcando quase seis da manhã. Em vez de voltar a dormir, decidi me levantar para treinar, mas não as escaladas com os pés flamejando, apenas a arquearia.
Peguei meu arco e a aljava de flechas e comecei a disparar contra os alvos. A princípio, tive um pouco de dificuldades para lembrar os movimentos de anteontem, portanto foram feios os erros de grande parte dos tiros, mas depois fui pegando o jeito e voltei a acertar o muro, mesmo um pouco longe dos alvos. E quando o estoque de flechas acabava, eu pegava as que estavam pelo chão e enchia a aljava para uma nova rajada de tiros.
Treinei por mais de duas horas, meus braços já doloridos, e Yasmim finalmente apareceu, uma cara de sono engraçada. Ela sentou-se à mesa e me observou por mais algum tempo, e disse que o relógio no meu pulso fora criado por ela enquanto eu dormia, o que só me deixou constrangido. Provavelmente, Yasmim percebeu que eu durmo de boca aberta.
Então Hara finalmente acordou.
- Não conseguiu ainda? – disse encarando o muro recheado de flechas encravadas. Eu sequer havia conseguido acertar os alvos, então foi inevitável não ficar sem jeito.
Nós tomamos o café da manhã e Hara solicitou que eu treinasse com os pés, mas dessa vez Yasmim levantou um novo muro, considerando que o dos alvos já não estava mais viável para pisar. Não havia sequer um espaço sem alguma flecha enterrada. Lamentável.
E treinei por várias horas, o suor cobrindo o meu rosto como uma segunda pele, minhas pernas ardendo por dentro e eu sentindo como se estivesse andando por dentro de um vulcão, as lavas tocando as solas dos meus pés violentamente. Escalava o muro mas não passava do quarto passo. Pelo menos eu já conseguia controlar melhor o fogo, embora as dores só aumentassem. E treinei até a hora do almoço.
- Eu estou morto de cansaço – murmurei, desabando na cadeira.
- Por quê? – Hara ironizou. – Os treinos estão apenas começando. Vai se acostumando.
Tentei imaginar o que viria pela frente.
- O que virá pela frente? – decidi perguntar.
- Por ora, nada, apenas arquearia e concentração de energia nos pés. Precisamos aperfeiçoar isso, primeiro.
Yasmim surgiu com três pratos – que buscara no Mundo Espiritual – e almoçamos. Fiquei feliz, porque comi frango cozido com batata.
E depois voltei a treinar.
E assim seguiu minha rotina.
E durante dias Hara apenas observou os meus treinos, raramente dando alguma instrução ou caçoando de mim. Eu dividia os treinos em dois turnos: antes do almoço, treinava arquearia; depois do almoço, escaladas. Evidentemente, havia melhoras na minha pontaria e no meu controle de energia, mesmo esse avanço sendo extremamente minúsculo. Tentava não pensar nos meus amigos, o que certamente não funcionava. Queria saber como estavam, o que estavam fazendo durante o meu coma, mesmo com Hara alegando que, fazer uma "visitinha" lá fora, poderia ser um risco enorme para nós três. O máximo que ele poderia fazer era ir ao Mundo Espiritual, o que ele e a Yasmim só faziam para buscar as nossas refeições – e eu ainda me perguntava quem as preparava. Pandora? Ela era a única Condenada da Natureza que eu conhecia a despeito dos meus dois protetores, e eu não conseguia vê-la como uma cozinheira.
Hara estava certo: eu provavelmente nasci para ser arqueiro. Eu só não manjava muito em manejar um arco, mas claro que isso mudou. Em poucos dias peguei as manhas e já atirava feito um arqueiro profissional. Errava às vezes, mas a maioria das minhas flechas encravavam no centro dos alvos. Até mesmo as dores que eu sentia nos braços – por segurar o arco por muito tempo – já era adaptável, e percebi que a musculação que eu fizera durante o mês de janeiro fora fundamental para esses treinos.
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Caçador Herdeiro (4) - Luz Envolvente | COMPLETO
AdventureLivro 4 da saga CAÇADOR HERDEIRO. Surge uma nova ameaça. O equilíbrio está sendo devastado. Portais estão fechando. E o Conselho não pensa duas vezes em mandar sua melhor caçadora para investigar. Investigar uma organização nova que está causando tu...