Capítulo 20-Cassiopeia.

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"Vê de Cassiopeia a fermosura..."

-Camões.

As estrelas estavam especialmente belas naquela noite. O preto escuro do céu era enfeitado por milhares de pontos brancos distantes, brilhantes, hipnotizantes ao longe. Peguei-me procurando por elas. Pelas constelações. Passará tanto tempo da minha infância aprendendo cada uma delas, olhando pela tela do computador, pelas fotos, pelos mapas nos livros de ciências...

Nenhuma matéria verdadeiramente me agradava. Só astronomia, tive apenas uma vez no terceiro ano do fundamental e depois nunca mais. Foi a partir da descoberta do cosmos, das estrelas, dos planetas que comecei a notar que nunca realmente as tinha visto sem ser através dos livros.

Ser proibida de ver o céu a partir da quatro horas da tarde só tinha tornado a minha obsessão por estrelas e pelo mundo desconhecido da noite ainda maior. Te conheço muito bem querido leitor: sei que você acha que eu sou uma vagabunda que não fazia nada demais a não ser fugir da escola e beijar desconhecidos alheios. Pra ser franca preciso te contar algo: nenhuma pessoa por mais monótona que seja é sem graça. Todos são de certa forma intrigantes.

Sim, eu em partes era vagabunda e fugia da escola para beijar desconhecidos alheios. No entanto, quando chegava em casa e me trancava no quarto e fingia ser uma daquelas adolescentes tipicamente chatas de filmes hollywoodianos-isso pra minha avó, porque pra ela eu literalmente só dormia e comia- eu pegava livros da biblioteca, todos que falavam sobre astronomia e usava aquele computador decrépito, caindo aos pedaços, com a internet lenta para pesquisar as constelações, as estrelas e os planetas.

Agora você sabe o motivo das minhas sonecas nas aulas de química. Pra falar a verdade, desde o meu aniversário de dezesseis anos tinha chegado, eu mal tive tempo de me dedicar aos estudos de astrologia.

Nos meus devaneios mais profundos, achava que quando visse o céu seria capaz de reconhecer cada constelação (como Cassiopeia) e planeta distante. E que, talvez vovó me compraria um telescópio para que eu pudesse ver de perto.

Que o primeiro momento que meus olhos vissem a tela escura a minha frente seria inesquecível e mágico. De certa forma foi, se você considerar que eu vi a noite pela primeira quando estava prestes a fugir de casa com uma fada pra uma terra que só existia na imaginação e em histórias infantis.

Não tive tempo de ver o céu direito, de analisa-lo, de testar meus conhecimentos. Cheguei a fazer isso algumas vezes quando cheguei aqui. Olhava o céu na esperança de conseguir ligar pontos e de certa forma, me sentir mesmo sozinha.

Só agora, analisando as estrelas recostado na parede de palha da oca sei que estou acordada. Porque não reconheço nenhuma. Nem mesmo Cassiopeia que nos mitos era a mais vaidosa e arrogante das estrelas queria aparecer pra mim.Talvez esse nem seja o mesmo céu com a qual eu sonhei e de alguma maneira isso é triste.

-No que você está pensando?- perguntou Peter se arrastando para o meu lado para também olhar o céu.

-Em como as estrelas daqui são bonitas.- respondi meio sem vontade tentando dar um sorriso que simplesmente não existia.

-Você sabe que é uma péssima mentirosa?- disse pra mim, sem me olhar enquanto se encostava preguiçosamente na oca.

-Desculpa se não sei disfarçar as minhas emoções.- e isso soou bem mais grosso do que eu gostaria.

-Olha, você sabe que não precisa falar se não quiser. Mas caso queira eu sou todo ouvidos.- respondeu-me, enquanto retirava a adaga da bainha presa a calça.

Ele passou a mão pela lâmina afiada e reluzente que brilhou na luz do luar. Seus dedos apertaram a ponta e havia algo escrito na bainha da faca, duas letras: J.J. Peter lançou a adaga para o alto e ela deu piruetas e rodou no ar antes de cair de volta na mão dele.

Me Leve Para A Terra Do Nunca ( EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora