Capítulo 22-Piscinoe

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Lily demorou para alguns bons minutos para me convencer a entrar na água do mar. Não que a água do mar fosse um problema em si, mas como era aparentemente o lar da tal 'Mãe de Todos' deveríamos adentrá-lo como viemos ao mundo. Porque aquilo simbolizaria que ela estaria me aceitando como filha e que eu a partir dali seria também parte dela.

Decidi parar de protestar quando descobri que a índia podia ser tão irritante quanto bonita, o que em poucas palavras resumia que ela era chata pra caramba. Tirei minhas roupas com a exceção do medalhão e fiquei ali estática com os braços pendendo em torno do meu corpo nu, branco e normal, completamente equilibrado e sem surpresas.

A brisa do mar era fresca e me fazia arrepiar, remexendo as madeixas castanhas dos meus cabelos revelando as minhas orelhas feias. Os fios grudaram no meu rosto por causa do calor demorei alguns minutos para desgrudar tudo da minha cara. Lily me disse que aquilo que eu estava prestes a fazer deveria ser um processo solitário e que eu deveria ficar a sós com o Akkorokanu. Ela instruiu-me contando-me o que eu deveria fazer, basicamente entrar na água até a cintura, deitar na água flutuar e esvaziar meus pensamentos, escutar o que Moana tinha a me dizer.

Agora eu estou aqui. Nua sozinha numa praia deserta prestes a entrar no mar pra ver se uma entidade indígena me aceita. Sempre que penso que a minha vida está louca ela atinge um nível completamente diferente que eu sempre penso ser insuperável.

Meus pés tocaram a areia fofinha. Fui pisando devagar sentindo a areia se amassando e se moldando na forma do meu pé como se fizesse massagem. A água tocou a ponta dos meus pés e depois as minhas canelas, o meio das minhas panturrilhas, o inicio das coxas, o começo das nádegas, a barriga, a cintura, os seios, até o meu pescoço e finalmente até os meus pés não tocarem mais o chão de areia. Quando me dei conta estava flutuando olhando para o céu azul e as nuvens disformes na minha frente.

A lembrança do mar me lembrava da vovó Jane. Minha mãe, meu pai, minha avó, toda minha família resumida em uma mesma mulher. Ela e sua afixação pelo amar, por histórias mirabolantes de sereias e monstros e piratas aventureiros que não obedeciam nada além da sua própria cobiça. Ela que costumava a ter uma casa nos limites de Londres o mais próximo possível que podia viver do mar sem vender a velha propriedade da família. Vovó que me contava histórias de ninar, que acordava de madrugada quando eu tinha pesadelos ou fazia xixi na cama. As suas cantigas que me embalavam, as broncas, tudo...Agora eu estava aqui longe dela a pelo menos um mês. Havia a abandonado sem mais nem menos, sem mostrar consideração nenhuma antes da nossa briga. Eu sabia que ela estava sozinha e que odiava se sentir só. Mesmo assim eu a havia largado sem ao menos me importar.

A culpa estava me consumindo.

A correnteza me empurrava cada vez pra mais longe da praia, porém eu sabia que a distância não era grande e que no final conseguiria voltar nadando.

Soltei um grito. Gritei alto, tão alto até a minha garganta estalar e doer e depois eu deixei que as lágrimas quentes e salgadas simplesmente escorressem pelo meu rosto e se juntassem a água do mar.

Chorei em silêncio, chorei enquanto arfava e gritava.

Chorei.

Chorei de felicidade e de tristeza, de culpa e diversão, de medo e de saudade. Chorei pela minha avó, pela lembrança dos meus pais. Chorei por Mabel. Chorei pelo irmão da minha avó. Chorei por Wendy. Chorei pelo garoto na floresta, por Tiger Lily, por Tinker Bell,seu amor não correspondido e seus segredos ocultos. Chorei pelos meninos perdidos. Chorei por Peter e pela Terra do Nunca, chorei por tudo e ao mesmo tempo sem motivo nenhum.

No final acabei chorando de verdade pela primeira vez em toda a minha vida. Aquele choro de verdade e no final me peguei rindo, boba, nostálgica e cantando:

Me Leve Para A Terra Do Nunca ( EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora