Pode chorar

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Poderia ter acontecido qualquer coisa, qualquer coisa. Duda poderia ter acordado e me chamado, alguém poderia ter batido na porta, a consciência dele poderia ter nos impedido, porém o destino é um fato e contra ele não há argumentos.

Alissom me beijou com doçura, com amor, com saudade, com toda a saudade do mundo e se entregou para mim. Entregou seu coração, sua boca e seus mais secretos sentimentos.

Um beijo muda tudo, um beijo transforma pessoas, transforma corações, mas poderia um beijo restaurar todas as memórias guardadas e esquecidas? A resposta é sim!

O cérebro guarda apenas memórias importantes, não guarda detalhes bobos e insignificantes. Mas com um beijo, pude me lembrar de cada detalhe do meu amor.

Assim como quando você não enxerga bem e você coloca óculos; um mundo novo se forma diante de você e a sua única opção é deixar aquilo tomar conta.

Por alguns segundos eu mantive o meu mundo em meus braços e o mantive forte e bem perto de mim.
Alissom nos afastou um pouco só pra me olhar e sorrir novamente como se estivesse ganhando o maior prêmio da vida dele.
Então ele parou, olhou para o fundo dos meus olhos, o que deve ter feito eu corar como um pimentão, e disse:

— Você é maluca  — ele sorriu, mas ainda me mantinha perto.

— Sou? Eu não sabia.

— É a minha maluca.

E então voltamos a nos beijar como se o universo fosse uma pequena bolinha de papel.

Porém nossa felicidade durou pouquíssimo tempo.

— Alissom? Você está aqui? — Agnes chegou gritando.

— É a Agnes! — sussurrei assustada.

— E daí? — ele disse confuso.

— E daí que se eu contar pra ela que nos beijamos, o mundo inteiro vai saber — falei ainda sussurrando e pude perceber uma faísca de desapontamento em seu olhar.

— Porque não quer que "O mundo inteiro saiba" ?

Por que? Tipo, começando pela parte do eu ainda tenho um ódio guardado por você e também você namora outra pessoa, tirando isso tem só mais 45 motivos.

— Ok Kate, vou ver se a Duda precisa de mim — ele saiu antes que eu pudesse abrir a boca.

Droga homem! Por que ele tem que ser tão dramático?

— Agnes, o que faz por aqui? — perguntei saindo da cozinha.

— Como assim o que eu faço aqui? O que você faz aqui? — ela perguntou cruzando os braços.

Eu odiava guardar segredos da minha melhor amiga, porém era necessário.
Agnes começou a falar, e falar, e falar sobre os enjoos, as vontades, os medos, os possíveis nomes do bebê e eu sinceramente não prestei atenção.
Quando ela perguntou se Alissom estava, eu disse que ele estava dormindo com as crianças e ela acabou indo embora.

Subi a escada quase que torcendo pra não morrer de ataque cardíaco, pois seria uma longa conversa.
Mas quando eu cheguei no meu quarto ele não estava lá, nem em nenhum lugar da casa.
Escutei então o barulho do violão, vindo da sacada.

Passei pela porta de vidro e pelas grandes cortinas e lá estava ele encostado no parapeito com o violão e quando me viu ele tocou essa:

— Eu odeio seu sorriso e seu jeito de falar, eu odeio quando você me olha e eu do risada sem pensar.

Sorri, sorri pra valer.

— Por que eu tenho a sensação de que você quer me esconder do mundo? — ele disse largando o violão e cruzando os braços.

— Nos separamos por quase seis anos, nos beijamos umas cinco ou quatro vezes, brigamos pelo menos umas cinquenta vezes, eu perdi a memória, você começou a namorar, nos separamos de novo. Eu tô cansada de sermos o casal problema.

— Não somos um casal.

— Você vai ficar bravo comigo? Ah sério?

— Como que depois de eu ter te entregado todo meu amor naquele beijo, você ainda está confusa?

— Eu não estou confusa!

— Então o que? Me diz!

— Eu tô com medo!

— Ah, que novidade! A senhorita perfeita acha que se tudo não for do jeito que ela planeja, então é porque está tudo fora de controle e nada vai dar certo. Mas deixa eu te contar que não é assim, o mundo não é do jeito que a gente quer! Se fosse assim eu não teria perdido minha mãe, meu pai, meus tios e você! — ele gritou.

Meus olhos encheram de água.

— Toda a sua vida, Kate, você teve medo. Medo de se apaixonar, medo de amar, medo de abandonar sua casa, medo de dizer o que sente, medo de sentir, medo de chorar, e medo de me ter. Você não acha que já está mais do que na hora de  acordar e ver que eu estou aqui mais uma vez? Mais uma vez depois de seis anos, depois de muitos julgamentos, depois de muito soco e trabalho eu estou aqui. E pra que? Pra você ter medo? Pra você ter vergonha?

— Vergonha de ter beijado alguém que tem uma namorada? — ele se retraiu.

— Eu não tenho uma namorada. Não mais.

Coração acelerou.

— Pode me dizer porquê?

Ele deu passos em minha direção e segurou minhas mãos. Seu perfume inundou meus pulmões.

— Porque ela me pediu em casamento, e a única pessoa com quem eu quero casar é você Kate.

Ok, eu vou ter um ataque cardíaco.

— Que bom que disse isso. Porque se você casasse com outra pessoa que não fosse eu, eu iria aparecer no dia do seu casamento e estragar tudo — falei trazendo seu rosto para perto.

— Eu vou casar com você e com ninguém mais.

— Eu só estou cansada, sabe? Eu sou a menina que ninguém leva a sério, a menina que todo mundo fala o que quer, a frágil que sempre reclama de tudo, a menina que faz drama, a menina que chora de madrugada... Eu tô cansada...

Eu estava esperando qualquer conselho vindo dele, eu aceitaria até uma crítica dizendo que eu era idiota e estava fazendo drama, porém ele só me abraçou.
Ele me teve ali em seus braços por longos minutos e eu senti uma paz tenebrosa.

Foram os melhores minutos que eu vivi, pelo menos até agora.
Uma lágrima solitária escorreu de meu rosto e molhou a manga dele.

— Pode chorar se quiser, dessa vez não vai ter ninguém pra dizer que você é fraca. Seu segredo está bem guardado comigo.

O irmão da minha melhor amiga 2 Onde histórias criam vida. Descubra agora