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mas achei que seria uma boa ideia seguirmos seu curso. Antes de chegarmos ao
riacho, acabamos nos deparando com uma pequena fonte. Fiquei de joelhos à sua
margem, tirei minhas luvas e mergulhei as mãos pra lavar meu rosto.
Não demorou um segundo até que eu as puxasse de volta o mais rápido
possível. Aquela água estava completamente escaldante. No instante seguinte,
escutei Touch cambaleando por trás de mim e se tremendo todo de frio. Em
algum lugar na minha mente, um de nós (eu, Cody ou Wendy Lee) tinha ouvido
falar sobre umas fontes termais que brotavam no oeste. E então lá estava eu,
apertando a vista pra conseguir enxergar na escuridão e, enfim, observar o vapor
d’água subindo das tais famosas fontes.
— Touch — eu o chamei. Ele parecia estar à beira de uma hipotermia.
Alguma medida teria de ser tomada para resolver essa situação climática.
Fui a passos largos até ele e cutuquei seu cotovelo com meu braço.
— Olha lá — eu disse, apontando pra fonte. Era funda o suficiente pra que ele
pudesse ficar submerso até o pescoço.
Não acho que já tenha escutado um suspiro tão grato quanto o que Touch
soltou ao escorregar pra dentro daquela água escaldante. A única peça de roupa
que ele continuava usando era meu chapéu, enfiado na cabeça até as orelhas. Ele
simplesmente ficou lá dentro d’água, escaldando um pouco, com um sorriso meio
insano e feliz escancarado no rosto, como se fosse a primeira vez que ele se
sentia aquecido desde que tinha deixado sua casa pra trás. Tentei não olhar
demais pra ele, nem pra todos aqueles músculos que definiam seu corpo.
Àquela altura, eu já tinha começado a tremer um pouco. Juntei todas as
roupas que ele tinha deixado de lado e as empilhei pra formar uma cama, dobrei
suas calças pra usar como travesseiro e puxei seu longo sobretudo de couro por
cima de mim, feito um cobertor. Dava pra sentir seus dois tesouros (o anel de
ouro e a bolinha azul) pulsando contra meu corpo de dentro do bolso. Aquela
arrumação toda com certeza não me deixou tão confortável quanto Touch, mas,
pelo menos, acabou garantindo meu sono até o sol raiar.
Touch continuava dormindo sublimemente durante as primeiras horas da
manhã, enquanto eu tinha acordado já nos primeiros raios do sol com uma ligeira
falta de ar, superconsciente de que estávamos sendo perseguidos. Se tivesse papel
e caneta, teria feito uma lista de prós e contras. Com certeza um dos problemas
dizia respeito a quantas peças de roupa ainda nos restavam (todo aquele maldito
couro, em vez de de lã e flanela). Seria bem difícil passarmos despercebidos pela
multidão a qualquer hora dessas num futuro imediato. Só nos restava, portanto,
conforme eu já tinha decidido, encontrar um carro que pudesse ser roubado, e
depois, seguir por estradas rurais remotas. O outro problema era a falta de um
destino predeterminado.
Os olhos de Touch se abriram. Ele parecia meio grogue e ficou surpreso ao
se ver ainda submerso n’água. Aí logo fechou os olhos de novo, aproveitando pra
se deliciar um pouquinho mais.
— Essa é a primeira vez que eu me sinto aquecido nas últimas semanas.
— Desculpa te dizer, mas é melhor a gente seguir em frente. Vai saber por

— Desculpa te dizer, mas é melhor a gente seguir em frente. Vai saber por
onde estão nos procurando...
Felizmente o sol acabou subindo bem rápido; quando enfim chegamos a uma
cidadezinha chamada Alcove, eu já tinha tirado minha jaqueta e meu suéter, e até
Touch os dispensou. Pelo que parecia, aquela fonte termal o tinha deixado bem
aquecido por dentro, e torci pra que isso durasse um bom tempo.
Aquela cidadezinha não tinha muito a oferecer. Na verdade, ela lembrava um
pouco os arredores de Caldecott, a região que cabia ao condado e não à cidade
em si, com suas estradas poeirentas, grandes extensões de terra e seus casebres
modestos. Touch e eu nos afastamos da estrada e fomos caminhando pelo pasto
até chegarmos a uma cabana que tinha duas camionetes caindo aos pedaços
estacionadas no gramado. Uma delas era uma velha Chevy azul que se parecia
muito com a picape da Tia Carrie. Bati no capô.
— Eu dou conta de fazer essa belezinha andar.
Entramos na cabana na ponta dos pés, tentando ter uma ideia do que se
passava lá dentro. Pelo que parecia, ela estava bem deserta fazia tempo. Sem
luzes acesas, nenhum sinal de movimento, e a garagem onde provavelmente
guardavam os carros (os que funcionavam) estava vazia. Tive a impressão de que
era uma casa de verão, e seus donos já tinham voltado pra onde passariam o
inverno. Pedi que Touch enchesse nossas garrafas de água na torneira do quintal.
Então retornei à camionete e abri a porta. Touch deu a volta e olhou pela janela
do lado do passageiro. Antes que tivesse a chance de me lamentar pela perda da
minha chave de fenda, notei que tinham deixado as chaves do carro embaixo do
banco do motorista.
Fui tomada pela tristeza. Aquela casa era agradável o suficiente, ainda que
com toda sua modéstia. E o fato de ser uma casa de verão era (ou deveria ser)
reconfortante. Mas, ainda assim, dava pra ver que seus donos não eram ricos, e
talvez até dessem um duro danado pra mantê-la. E imaginaram que esse seria
um lugar sem maiores índices de criminalidade, onde alguém pudesse
simplesmente deixar as chaves no carro.
Infelizmente, não era hora de ficar com a consciência pesada. Era hora de
continuar sobrevivendo. Isso pra não dizer que era a hora da verdade. Girei a
chave na ignição. O motor engasgou, tossiu e morreu. Bombeei o pedal umas
duas vezes e, depois, tentei de novo. Dessa vez o motor pegou. Não sem reclamar
um pouco, claro, mas acabou pegando no tranco. Touch abriu a porta e sentou ao
meu lado.
— Pronta para pegar a estrada e ganhar algum chão para longe desse lugar?
Podemos ir atrás de um caixa eletrônico.
— Roubar dos bandidos — eu retruquei. Isso me pareceu muito melhor do
que roubar de pessoas normais. Conduzi a camionete pela grama até a entrada
principal, anotando mentalmente o endereço escrito na caixa de correios
enferrujada. Talvez pudéssemos depositar algum dinheiro num envelope e
remetê-lo aos donos como pagamento.
Por ora, precisávamos tomar alguma distância entre nós e a cidade, onde as
pessoas provavelmente reconheceriam aquele carro. Pegamos as estradas vicinais
até conseguirmos encontrar uma estreita estradinha rural. Por sorte, estávamos

X- Men: OToque Da VampiraOnde histórias criam vida. Descubra agora