...

4 0 0
                                    

soubessem que estivemos lá, e Touch me encontraria no gramado. Então, escutei
o cachorro latir.
Droga, quase disse em voz alta. Esquecendo de ficar em silêncio, puxei
aquela janela com toda a minha força, mas parecia estar colada com tinta.
Finalmente notei que a trava estava fechada, mas mal pude tocar nela antes que o
cachorro entrasse voando dentro do quarto, latindo feito um louco e com Joe
Wheeler logo atrás dele. Ergui as mãos. O cão por si só nem era tão ameaçador,
uma criaturinha malhada com orelhas pontiagudas.
— Mas que diabos? — Joe gritou. Ele me pareceu estar bem indignado e
bastante bravo. Eu já tinha escutado essas mesmas palavras nas lembranças de
Wendy Lee, mas eu não estava preparada pra vê-lo. Apesar de ser apenas um
homem comum de meia-idade, com cabelos ruivos meio grisalhos e sardas
desbotadas, parei de respirar pelo que pareceu um minuto inteiro. Eu sabia que
não tinha lógica alguma, mas meus sentimentos acabaram feridos pelo fato de
que sua única reação ao me ver ali foi ter ficado com raiva. Ele não parecia estar
nada amedrontado e só continuou a gritar: — O que diabos você pensa que está
fazendo, garota?
Sua esposa e o casal de crianças (uma adolescente e um menino de uns dez
anos) se amontoaram no quarto por trás dele. Joe ergueu o braço, mandando que
as duas crianças saíssem do escritório, e fiquei um tanto comovida com seu
instinto de proteção. Mas logo parei de me emocionar quando vi seus olhos
recaírem sobre a gaveta da escrivaninha onde estava aquela Magnum .365, e me
pareceu bem óbvio que ele não hesitaria em atirar em mim por causa de um
maço de dinheiro e uma saia indiana. Sem dúvidas, o Colorado era um estado
“faça meu dia” igualzinho ao Mississipi.
Antes que pudesse me conter, falei:
— Nem pense nisso, Jo Jo. Você sempre foi péssimo de mira.
O olhar confuso no seu rosto me deu tempo suficiente pra pegar a arma da
gaveta. Num piscar de olhos, me certifiquei de que a trava de segurança estivesse
mesmo ativada. Eu com certeza não queria atirar em ninguém, muito menos em
duas crianças.
Joe abriu os braços enquanto sua esposa empurrava as crianças pra fora do
quarto. Eu as teria deixado ir embora se não fosse por Touch. Sabe-se lá onde ele
estaria agora.
— Fiquem aí — eu disse, gostando do medo no olhar de Joe, sem contar a
confusão (tinha certeza, pela sua reação, de que ninguém o tinha chamado de Jo
Jo desde Wendy Lee). Empurrei meu dedo para trás, fazendo de conta que tinha
liberado a trava de segurança. — Preciso de que todos fiquem aqui. Ninguém
precisa se machucar. Eu vou sair tranquilamente por essa janela e vocês vão
esquecer que um dia me viram.
Dei alguns passos pra trás em direção à janela. O cachorro não sabia que
devia ter medo daquela arma, é claro, então só correu pra mais perto de mim,
latindo feito um louco.
— Chama aí seu cachorro, Jo Jo.
Eu sinceramente não queria atirar no cachorro de ninguém, nem mesmo no
de Joe Wheeler. Deu pra ver a expressão de pânico no rosto da sua filha, e seus

olhos cheios de lágrimas, como se estivesse com mais medo que eu atirasse no
cachorro do que no pai. Ao mesmo tempo, dei-me conta de que não havia nada
particularmente terrível em Joe, assim ao vivo e a olho nu.
— Radar — ele o chamou. — Volta aqui, garoto.
Soltei uma pequena risada.
— Pelo amor de Deus, Jo Jo. Será que você não consegue pensar em outro
nome pra um cachorro?
O rosto de Joe ficou tão vermelho que nem deu mais pra ver as sardas. Sua
esposa o encarou de um jeito engraçado.
— A gente se conhece, moça? — Joe perguntou, todo confuso, e eu não pude
conter o riso. A essa altura, meu coração já estava completamente tomado pelo
de Wendy Lee. Talvez ele nem fosse tão terrivelmente terrível assim. Mas, por
outro lado, não vi nada de especial nele. Agora que Wendy Lee já tinha acordado
do seu coma, torci pra que ela fosse capaz de passar por cima de todo esse
sofrimento e encontrar um bom rapaz solteiro que pudesse amá-la. Mas mal
pude concluir meu raciocínio antes que...
Pá! Creque! Bum!
Merda. Àquela altura eu já sabia bem que barulho era aquele e o que ele
significava: pessoas do planeta de Touch vindo atrás dele (e agora de mim) com
aquelas armas apavorantes. Imaginei mesmo que seria apenas uma questão de
tempo até que Touch e eu tivéssemos de enfrentar os problemas dos dois mundos
ao mesmo tempo.
— Corram! — gritei o mais alto possível pra Joe e sua família. — Protejam
suas vidas!
Pela primeira vez na vida, Jo Jo deu ouvidos a alguém. Ele e sua família
correram pra fora da casa com o cachorro logo no encalço, o mais rápido que já
tinha visto quatro pessoas e um cão correrem. E vou contar, estaria bem atrás
deles se não fosse por Touch. Eu não arredaria o pé dali antes de saber pra onde
ele tinha ido. Vindo da garagem, escutei um carro dar partida e sair voando. Era
certo que iriam direto pra delegacia de polícia, mas esse era um problema que
eu teria de resolver depois.
— Touch!
Aquela barulheira toda tinha vindo da cozinha, então foi pra lá que eu corri.
Havia uma luz vindo daquela direção, um pouco forte mas nada ofuscante. E pude
ouvir vozes assobiantes conversando entre si (eu já conseguia distinguir a voz de
Touch quando ele falava na própria língua). Nenhuma das vozes soava tão brava
ou urgente quanto da última vez na concessionária, mas eu nem sequer tive a
chance de ponderar sobre isso, pois, antes mesmo que eu chegasse à cozinha,
algum tipo de monstro saiu rosnando lá de dentro e partiu direto na minha
direção.
“Monstro” pode até não ser uma denominação tão específica assim, mas
aquela coisa que me fez sair fugindo em disparada não se encaixava em nenhuma
outra categoria que eu jamais tivesse visto. Só o que vi, mesmo, foi uma grande
quantidade de pelos e dentes grudados a uma criatura que era pelo menos do
meu tamanho e estava doida atrás de mim. Eu já tinha percorrido metade da casa
até que dobrei numa curva e, em questão de segundos, ele já estava bem na

X- Men: OToque Da VampiraOnde histórias criam vida. Descubra agora