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suportar tudo isso — apontou pra bagunça deixada pra trás, a agulha e os band-
aids ensanguentados e as várias embalagens.
Um homem como eu. Que pensamento estranho. Que pensamento incrível.
— Que fim ele teve? — perguntei. — Esse homem como eu.
— Bem — Touch disse, como se estivesse escolhendo as palavras com muito
cuidado —, de onde eu venho, a maioria é como eu. Pessoas comuns, com
talentos e habilidades variados. Mas existem outros. Eles são maiores do que a
vida. Têm poderes. Poderes especiais, como o seu.
— Todos eles? — perguntei. Depois de todo o whisky e daquela novidade, eu
mal conseguia formular uma frase direito.
— Todos são especiais de alguma forma. Alguns mais, outros menos. Uns são
capazes de voar, outros conseguem mudar de forma. Às vezes chega a ser
perigoso, como quando se é capaz de criar fogo, por exemplo. Ou chuva.
— Mas como? Quero dizer, como eles ficaram assim?
— Da mesma forma como qualquer pessoa recebe seus atributos. Como eu
tenho olhos azuis? Como você é alta? É a genética, Vampira. A maioria é produto
de mera hereditariedade. Mas alguns são produtos de mudanças. Mutações.
Não me pareceu uma boa resposta, mas decidi deixar passar naquele
momento.
— E o que vocês fazem com os perigosos? Os que são como eu.
— Existem centros, como escolas. Para ajudá-los a controlar suas
habilidades. Como esse homem que eu conheci. Gordium seria como vocês o
chamariam aqui. Ele aprendeu a controlar o efeito de sua pele.
Essa informação me fez idealizar o que pensava ser impossível. Sentei com a
coluna perfeitamente ereta. Até o corte parou de latejar.
— Como assim, controlar?
— Ele aprendeu a evitar que sua pele desencadeasse esse efeito a não ser que
quisesse.
— Então ele podia tocar nas pessoas?
— Sim, podia. Se ele quisesse. Ele podia tocar nelas sem provocar efeito
algum. Ou então era capaz de tocar nelas e sugar somente um pouco do que
precisasse. Controlava sua pele.
— Você acha... — eu disse, com medo até de completar a pergunta. — Você
acha que poderia me levar de volta com você, depois que tudo isso estiver
resolvido? E eu poderia ir pra esse centro, essa escola, e aprender como... tocar
nas pessoas?
Touch contorceu o rosto.
— Não — ele disse, com bastante firmeza na voz. Como se já tivesse
decidido antes mesmo que eu perguntasse. — Eu jamais poderia levá-la para lá.
— Mas...
Ele suspendeu a mão.
— Eles estão perto, eu já falei demais. Você precisa descansar e se recuperar
logo. Não podemos correr o risco de outro confronto.
Concordei com um sinal de cabeça. Mas, ainda assim, aquela velha palavra,
“esperança”, tinha despertado no meu coração. Nada que Touch dissesse seria
capaz de destruir a fantasia de voltar com ele ao seu planeta e aprender a

controlar meu flagelo (não, minha habilidade!), saindo de lá capaz de me juntar
ao mundo. Capaz de caminhar de mãos dadas e catar os cílios caídos nas
bochechas dos outros e usar vestidinhos de verão sem me preocupar em esbarrar
no cotovelo de alguém. E, o melhor de tudo, poder tocar nele, Touch, onde,
quando e como eu quisesse.
Não deu pra ouvir o que ele disse em seguida. A dor, a exaustão e o álcool
tomaram conta de mim. Dormi por doze horas seguidas, o que deve ter sido meu
sono ininterrupto mais longo desde que partimos nessa jornada.
Quando acordei, vi que Touch tinha me embrulhado num lençol feito uma
mumiazinha, e seus braços estavam firmes em torno de mim. Mal me importei
com a pontinha de dor ainda remanescente no ombro.
Juntamos nossas coisas, entramos na camionete azul e seguimos rumo a
Utah.

X- Men: OToque Da VampiraOnde histórias criam vida. Descubra agora