Tárcio - A consequência da distância.

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Tárcio não teve reação. Sem sua mão interrompendo o fechamento das portas, o elevador se fechou e ele ficou sozinho ali dentro.

Eram muitas coisas para processar.

Bárbara havia falado com ele. Bárbara não era casada. Bárbara havia voltado a ser Obreira. Bárbara tinha um filho. E o filho era dele.

-Meu Deus... -Ele suspirou.

Como assim? Ele era pai?

Tárcio pensou na criança... Ela deveria ter quase dois anos... O tempo que o rapaz deixou Bárbara para voltar para a Obra.

Suas mãos suavam, ele não fazia ideia do que aconteceria ali para frente. O rapaz esperou até o término da reunião, mas Bárbara não usou o mesmo elevador, ele queria encontrá-la, dizer que aquilo não era justo! Que ela deveria ter contado para ele!

Ele tinha o direito de saber que era pai.

Tárcio orava, mas ainda sentia a adrenalina em seu corpo. Ele queria falar com alguém, ao seu Pastor, um amigo...

Mas se ele tivesse um filho tudo aquilo mudaria. Não eram muitos Pastores que ele conhecia que tinham filhos. Muitos haviam entrado na Obra já casados quando era o caso... Mas e ele?

O que aconteceria? Ele sairia de Pastor novamente?

Ele precisava ter certeza que a criança era filha dele. Ele precisava conversar com Bárbara.

Bárbara... Como ela havia ficado por todo esse tempo? Ela parecia bem, Deus havia cuidado dela...

Mas ele sabia que a garota estava chateada pela forma como ela o havia tratado dentro do elevador.

Quando o dia da sua folga chegou, ele conversou com o seu Pastor, pediu autorização para visitar a igreja da moça.

Ele não faria mais nada que seu Pastor não soubesse. No começo ele foi contra, mas deu apenas aquele dia, e se fosse verdade, Bárbara e ele seriam enviados novamente para os Pastores Estaduais e consequentemente o Bispo.

Tárcio respirou fundo, e naquela segunda-feira ele foi até a igreja de bairro. Não havia mudado muitas coisas, uma nova pintura, os bancos com estofados novos...

Ele entrou na igreja e um Obreiro veio até ele:

-Posso ajudá-lo?

Tárcio estendeu a mão para cumprimentar o homen, quando seus olhos se encontraram com os de Nelson, pai de Bárbara.

-Tárcio? -Ele franziu as sobrancelhas.

-Sim, senhor... Obreiro...

-O que você está fazendo aqui? -A voz do senhor se elevou.

-Por favor, senhor Nelson... Eu não quero arranjar confusão... -Tárcio gaguejava. -Eu só quero conversar com a sua filha...

-VOCÊ SOME POR DOIS ANOS E AGORA QUER CONVERSAR COM A MINHA FILHA?! -Ele gritou e o Pastor Auxiliar da Igreja saiu. -VOCÊ MOLEQUE, MERECE UNS TAPAS QUE SEU PAI NÃO DEU PARA VOCÊ APRENDER A SER HOMEM!

-Obreiro Nelson, o que está acontecendo?! -O Pastor veio correndo até eles.

-PASTOR, FOI ESSE MOLEQUE QUE ENGRAVIDOU A MINHA FILHA E SIMPLESMENTE SUMIU!

-Senhor Nelson, eu posso explicar... -Tárcio tentou falar.

-EXPLICAR? A FALTA DE RESPONSABILIDADE? NÃO SEI SE VOCÊ TEVE PAI, MAS AINDA ASSIM, DESDE QUANDO EU TINHA DEZ ANOS EU APRENDI A RESPONDER SOBRE OS MEUS ATOS! -Ele respirou fundo claramente alterado. -Você não imagina, Tárcio! Quantas noites eu acordei com o choro da minha filha no quarto ao lado! E eu não podia fazer nada, porque a mesma coisa que poderia parar com a dor, era o que estava causando a dor. Você! Você não estava lá quando ela descobriu que estava grávida! Quando ela descobriu que era um garotinho e pensou que certamente ele teria os mesmos olhos de um homem que ela tanto amor na vida! Você não esteve lá para segurar a mão dela quando a criança veio ao mundo! Você não estava na primeira vez que o Gustavo falou ou que deu o primeiro passo! -O homem parecia prestes a querer dar um soco em Tárcio, mas o Espírito Santo o dominava. -POR QUE ACHA QUE TEM O DIREITO DE VIM AQUI?

Os olhos de Tárcio estavam cheios de água, mas antes que pudesse abrir a boca para dizer alguma coisa, Bárbara apareceu:

-Pai? O que está acon... -Ela parou no meio da frase quando seus olhos cruzaram com os de Tárcio.

-Bárbara... -Ele sussurrou com a voz rouca.

-Filha!

-Eu preciso conversar com você, Bárbara. -Tárcio falou.

-Filha! -Nelson se colocou a frente dela como se a estivesse protegendo. -Você não precisa conversar com ele se não quiser!

Bárbara deu um sorriso fraco para o seu pai, mostrando a força que ela havia adquirido durante todo aquele tempo.

-Pai, está tudo bem. -Ela colocou as mãos nos ombros de seu pai. -Eu preciso conversar com o Pastor Tárcio.

Pastor Tárcio... O rapaz engoliu em seco, sabia que os dois estavam distantes, mas naquele momento sentiu aquilo na pele.

-Venha Pastor, vamos andar.

Canção de um servo.Onde histórias criam vida. Descubra agora