44. Rios, pontes e overdrives - Briseis

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A enxurrada súbita de informações ainda fazia minha cabeça girar quando ouvi os assobios ao longe. Fiquei longos segundos tentando processar os comichões constantes atrás da minha nuca que me permitiam saber da aproximação de Karen, Daniel e... Não podia ser. Era a maldita coisa que se denominava uma dríade. A que me arrastou pela mata noite adentro até o covil dos Meltas — os mesmos caras responsáveis por toda a desgraça que havia acontecido no Vale das Estações.

Por minha visão periférica, consegui ver que o relógio que guardava a pedra preciosa de Heitor havia voltado ao normal. Não pude evitar me sentir aliviada. O que fora aquilo?

Me obriguei a ignorar minhas indagações quando ficou claro que o Imperador não esboçaria reação alguma e eu precisaria nos proteger com o que estivesse ao meu alcance. Fiz a magia de ataque fluir por entre os meus dedos, cintilando com uma luz inicialmente tênue que progressivamente se intensificou. Invocar a magia fez com que os tremores, que me tomavam o corpo anteriormente, fossem amenizados.

— Você não precisa fazer isso — Heitor falou, sua voz estava gélida como o vento que começava a agitar as árvores ao nosso redor.

Ele se afastou de mim e desceu do barranco, de onde vigiávamos as fronteiras, sem olhar para trás.

Embora Heitor não houvesse perguntado, eu sabia o que se passava em sua cabeça. Estava com medo e eu não o julgava, porque também estava horrorizada com o que havia feito.

Comecei a descer logo depois, quando ao longe notei o monstro de longos cabelos vindo em nossa direção ao lado de Daniel. Karen também os acompanhava, embora estivesse mantendo uma distância razoavelmente grande. O pandemônio de comichões era explicado por aquilo, embora eu não fizesse ideia do que estava acontecendo.

— Eu não acredito que vocês permitiram que eu viesse até aqui com esse ser nojento — Karen olhava para Flor com asco.

A figura se pôs sobre quatro apoios e rosnou para a Imperatriz, ela por sua vez recuou com medo.

— Mas o que diabos Flor está fazendo aqui? — perguntei, alarmada.

Heitor não fez menção a se virar para me olhar. Ele me temia mais do que a Flor, eu havia feito algo muito errado, só não entendia como e o que era. Meu coração estava apertado.

O garoto continuou em silêncio.

— Posso descobrir sozinha — murmurei, conjurando meu poder mais uma vez. Mas antes que eu fosse até eles, Heitor segurou meu braço firmemente.

O fuzilei com os olhos ignorando a sensação bizarra que irradiava da sua mão em minha pele. No que ele estava pensando?

— Você não fará nada — sussurrou em meu ouvido. — Flor não vale sua força vital.

— Me solte. Agora — sibilei, puxando o braço com força mas acatando o que ele falara.

Um assobio alto ecoou ao longe enquanto se aproximavam. Os pequenos olhos de Flor cintilavam sob o véu de cabelos em frente ao seu rosto quando ela nos olhou. Sua imagem tremulou e ela desapareceu, reaparecendo milésimos de segundos depois ao lado de Heitor. Perto demais.

— Ah! —gritou o garoto. — Mas que porcaria você...

— Ela não gosta muito de mim, meu senhor — pude ouvir a dríade com voz estridente. — A poderosinha que tentou me matar. Diga-lhe que vocês têm uma dívida a pagar, diga-lhe que me prometeram.

Sobre o que ela estava falando? Se achavam que eu iria cooperar com aquela coisa, estavam muito enganados.

— Você tentou me levar até os meltas! — vociferei.

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