Os delírios recomeçaram novamente mais ou menos nos últimos dois minutos do segundo tempo. Eu podia jurar que um cara de aparência bizarra me observava do outro lado da arquibancada.
Daniel tinha saído de perto de mim há apenas alguns minutos, provavelmente havia ido tomar banho depois da incrível vitória por cinco a zero. Dos quais, três gols foram dedicados de forma quase cômica para mim. Eu podia sentir meu rosto quente cada vez que seu dedo era apontado em minha direção e todos buscavam meu rosto. Provavelmente, muitos ali imaginavam que éramos namorados ou qualquer coisa. Talvez nunca passasse pela cabeça de alguém que éramos apenas uma maluca e um cara legal tentando fazer ela se sentir melhor.
E então, a estranha sensação de ser observada recomeçou. Primeiro eu acreditei que fosse só impressão. Afinal, um homem alto, vestido de preto e me encarando tinha que ser algo normal. Percebi tarde demais quando pouco a pouco ele se aproximou sorrateiramente, até que a distância entre nós fosse de apenas um assento. O homem levantou-se, ficando em minha frente e tampando meu campo de visão. Ele estendeu a mão para me tocar e eu imediatamente escapei pela lateral descendo da arquibancada.
Olhei para trás, ele continuava se esgueirando entre as pessoas no caminho até mim.
Eu não sabia o que fazer. Ninguém parecia perceber que eu estava sendo perseguida, minha apreensão só aumentava. Onde Daniel estava?
Assim que desci algumas arquibancadas e cheguei ao nível do chão, comecei a correr em direção a saída sem parar, até que bati fortemente de frente com alguém. O cheiro de banho tomado invadiu minhas narinas e percebi que estava diante de um Daniel com o cabelo molhado. Minha atenção foi atraída até seu rosto que carregava uma expressão genuína de confusão.
Olhei para trás novamente e o homem estranho de repente sumira. Era como se nunca estivesse lá. Mas eu tinha certeza de que não era ilusão... Eu podia sentir o calor de seu corpo na minha frente. Ou melhor, o frio. Ele emanava um frio surreal.
Não pude deixar de ficar aliviada ao notar que estava segura.
— Briseis? O que aconteceu?
— Nada — menti. — Apenas vamos sair daqui.
— Mas os jogos nem terminaram... — começou a protestar, contudo, algo em mim devia parecer suplicar. Porque ele baixou os ombros e me seguiu até a saída.
— O que aconteceu lá? — perguntou assim que entramos no carro.
— Não foi nada. Eu... juro.
— Garotas realmente odeiam jogos, não é? — disse olhando para frente.
— Ah, me desculpe — murmurei. — Eu sou uma egoísta mesmo. Você estava se divertindo... Era o que você queria. Vamos voltar.
— Ei, nada disso! — Ele deu a partida no carro com um solavanco. — Eu vim para te distrair. Não vou ficar aqui se não quiser. Além disso, os jogos já estavam acabando.
— Tudo bem então? — quis saber.
— Lógico — decidiu, os olhos fixos nas sinuosas ruas da cidade. — Agora vem a parte mais legal do passeio...
— Qual?
— Espere e verá.
Ele guiou o carro em direção à saída da cidade. Até que alguns metros depois, parou em frente a uma grande construção com fachada em mármore negro. Eu não tinha prestado atenção quando estávamos indo ao centro. Mas aquilo me parecia muito fora do contexto em uma cidade pequena. Era um clube bem grande.
— E então? O que me diz? — sugeriu.
Ele já tinha saído do carro e abria a porta do carona para que eu saísse.
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Vale das Estações
FantasyHá dezessete anos, num país em que poucos acreditariam haver magia e as lendas eram vistas como tolices para assustar crianças, surgiu um lugar fantástico onde as estações coexistiam e as histórias se tornavam reais. Após uma série de coincidências...