14. Esperanças - Briseis

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Esperar que os dez minutos indicados por Alane passassem pareceu para mim o equivalente ao tempo que permaneci presa em minha cela fétida. Meu coração palpitava como um tambor, eu mal podia acreditar que teria uma pequenina chance.

Após algum tempo, percebi uma forma redonda e grande despontar no início do corredor. Era o médico maníaco, acompanhado da enfermeira que derrubei na primeira vez que acordei no manicômio. Eu podia ver um sorriso de satisfação em seus rostos. Recuei para dentro do quarto.

— Minha criança! — exclamou mais uma vez o gordão.

Comecei a imaginar se ele possuía algum trauma relacionado à idade infantil. Ora esta... Eu não era criança, muito menos daquele verme.

Era minha hora de iniciar a atuação. Lancei-me ao chão inspirando e expirado pesadamente, segurando no braço onde Alane deveria injetar-me o medicamento letal.

— Pelo que podemos perceber, Dr. Aníbal, o papel já foi cumprido com êxito — constatou a enfermeira com imensa satisfação. Ela içou-me pelo colarinho da camisola de hospital, fazendo-me sufocar. Uma sensação estranha atingiu minha garganta e por um segundo pensei que seria morta por asfixia. — Garotinha insolente...

— Não. — disse a bola de circo, afastando a enfermeira colérica de perto de mim. — Eles estão aqui e desejam vê-la viva pela última vez.

A enfermeira se recompôs em um rápido segundo, como se houvesse sido possuída por um demônio algum tempo atrás.

— Levante-a do chão. Pelo braço. E a leve para a ala 02 — Minha redenção, a ala de minha redenção. — Os senhores Abídio e Emma a espera lá.

A enfermeira me levantou, novamente eu sentia minhas pernas fracas. Mas não pela atuação, e sim pelo medo que sentia ao ter que rever aquelas pessoas... Aquelas pessoas.

— Vamos, garota, você tem quinze minutos agora. Está sentido palpitações fortes? —perguntou.

Balancei a cabeça, receosa que ela desconfiasse que eu estivesse bem demais para alguém só tinha dez minutos de vida.

— É a droga fazendo efeito, ela começa a fazer o coração pulsar rápido, cada vez mais e mais rápido. Até que... Puff! Ele para — finalizou com uma risada sinistra.

Apoiei as mãos nos joelhos para dar mais ênfase à encenação.

Ela puxou-me com mais força até que chegamos à ala 02, mais um dos corredores brancos e iguais daquela clínica. Mas havia um diferencial... A porta no final, aberta. Meu coração palpitava com uma quase alegria. O plano de Alane poderia enfim dar certo.

— Aguarde aqui. Em pé, quieta. Logo, tudo vai mudar garota.

A enfermeira saiu. E depois Alane apareceu na porta do lado sul junto a uma equipe de cinco enfermeiros e, atrás dela, Emma e Abídio. Emma usava um vestido da Chanel que minha mãe houvera comprado numa de suas viagens a Nova Iorque, o cabelo bem escovado. Uma típica dama de alta classe, mesmo que houvesse algo diferente em sua feição. Um nariz retorcido, talvez. Abídio ainda parecia o mesmo. Mas eu não poderia enganar-me, eles dormiam em camas verdadeiras, sob um teto verdadeiro, bancados com o dinheiro de meus pais. Enquanto eu estava ali, apodrecendo em uma cela fétida, sem direito a condições de higiene e alimentação. Um ódio me atingiu. A vontade de esmurrá-los, fazê-los passar por tudo ao que fui submetida naquele último mês, me veio forte e incontrolável. Mas eu necessitava de controle. Era pouco o tempo, cinco, seis minutos. E então eu estaria livre, para ser uma sem-teto. Uma garota sem família nem apoio.

— Olá Bri... — quase sibilou Emma. — espero que tenha gostado de sua estadia aqui neste hotel de... Hum... Cinco estrelas? Sim, cinco estrelas considerando o local que você estará daqui a algumas horas. Não se preocupe, compramos uma bela lápide de concreto. Em meio a tantos corpos, ninguém nunca desconfiará que a filha dos Del Mont descansa juntamente com a ralé.

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