11. Reencontros - Heitor

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A notícia de que a imperatriz estava viva, apesar de ser boa, me deixou bastante apreensivo. Como ela sobreviveu aos magos? E como conseguiram achá-la?

Quando o avião aterrissou em Recife, Arminda já tinha os nervos à flor da pele. Ela olhava para todos os cantos buscando indícios de que estaríamos sendo seguidos, e eu não me encontrava muito diferente dela. No avião, uma miríade de esqueletos e madeira queimada dançava sob minhas pálpebras.

— Precisamos arrumar um táxi.

A guardiã disse assim que desembarcamos no aeroporto.

Esperamos no máximo dois minutos quando apareceu um deles. O taxista era um senhor de meia idade um pouco acima do peso, e com os óculos na testa. Gotas fartas de suor desciam por suas têmporas. Também, eu não o culpava, aquele lugar fazia um calor quase insuportável. Até eu, que tinha alguma coisa a ver com o fogo, estava fritando ali.

O homem comentava algo sobre a corrupção no país e a situação financeira, enquanto abria caminho em meio ao trânsito caótico de Recife. Ele não respeitava muito as regras de direção, mas em pouco tempo nós estávamos frente a um hotel na orla da praia.

— Aproveiteis meu querido, penso que a calmaria logo terá findado — falou Arminda enquanto me mostrava o que havia em nossa frente.

Bem, aquilo era lindo.

A água se estendia pelo horizonte até onde a vista alcançava. Quando morava em Santa Catarina eu não era muito adepto às praias de lá, mas ali a vontade de nadar era inevitável. Imaginei se fazendo parte do fogo, eu teria problemas ao entrar em contato com a água, ou algo parecido. Se realmente houvesse alguma coisa, seria o fim da minha carreira de nadador. Tentei não pensar muito naquilo e ser mais otimista.

Arminda dispensou o taxista — que vez ou outra lhe soltara uma cantada, deixando-a sem graça. Ela fez as reservas em dois quartos no hotel. Depois que subimos, me toquei que eu não trouxera mala alguma, apenas a roupa que tinha no corpo e o grande livro.

— Não vos preocupeis — pediu a guardiã —, eu trouxe sua mala.

Arminda murmurou alguma coisa e uma mala preta apareceu em suas mãos. Ah, era aquela coisa com o rifind. Eu demoraria a me acostumar. A guardiã me passou uma pequena mala e depois entrou no seu quarto. O meu era ao lado.

Meu quarto tinha um aspecto asséptico, todo branco e com uma grande janela com vista para o mar. Na parte esquerda havia uma pequena cama e a porta para a suíte. Ver um banheiro me fez olhar para mim e perceber que eu estava repleto de fuligem e em alguns pontos minhas roupas se encontravam chamuscadas. Meu aspecto não deveria estar mesmo muito bom, e eu me via extremamente cansado. Após lutar contra esqueletos demoníacos e encarar uma longa viagem ao outro lado do país, tudo o que eu mais desejava era tomar banho e dormir, quem sabe, até o outro dia. A ideia do banho deve ter passado rapidamente por minha mente, pois caí num sono profundo logo ao entrar em contato com o colchão da cama.

No sonho havia vários esqueletos, mas ao invés de envoltos em fogo estavam em água. Aparentemente eu estava novamente no interior daquele porão imundo, conseguia avistar Carla através das paredes antigas. Ela estava na entrada do alçapão, sentada sobre uma pedra e conversando com o melta de cabelos platinados. Senti meu peito se retorcer ao notar como parecia bem e viva.

— Carla? — chamei, descrente de que ela respirava mais uma vez.

Seus olhos se voltaram em minha direção, mas permaneceram apáticos. Ela esperou meio segundo antes de dizer:

— Desculpe, nos conhecemos?

E então voltou a conversar como se eu simplesmente não estivesse ali.

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