7. Mudanças - Briseis

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Durante todo o tempo minha cabeça estava fixada apenas no que a diretora dissera: no fato de que eu estaria logo, logo, prestes a ser entregue a outra família, como uma mercadoria ou algo do tipo.

Passei algumas horas, talvez, em paz. Mas depois de uns minutos senti o calor de um corpo ao meu lado e o cheiro de um perfume conhecido, que antes me traria boas lembranças, mas naquele momento me deixava tonta. Assim como tudo naquele dia.

— Briseis? — falou a conhecida voz em meus ouvidos.

— Hãn? O que há Pietro?

Não consegui ser menos fria com ele, após vários dias me ignorando aquilo era o mínimo que ele merecia.

— Nossa, para que isto? Então já que é assim... — disse se virando.

Eu odiava aquilo, aquela chantagem emocional. Já trazia coisas demais em minha cabeça.

Mesmo assim resolvi relevar.

— Não, não me leve a mal. É que estou passando por um momento difícil.

— Sim, todos estão percebendo — falou sentando-se na cadeira ao meu lado. — Este fantasma ainda anda por aí, não é?

Eu não queria que ele me fizesse companhia. O único fantasma presente em minha vida era aquele imbecil! Será que já não bastava tudo o que causara?

— Não fique assim, tudo vai ficar bem, você vai ver — falou tentando parecer acolhedor. — Algo muito... pior poderia ter te acontecido.

— Ah é, tipo o quê?

— Han... tipo morrer.

— Tipo morrer, Pietro? — repeti incrédula. — Eu morri. Morri no dia em que meus pais entraram naquele maldito barco que os levou de mim. Morri quando você me deixou no instante em que mais precisei. Morro todos os dias quando ninguém mais acredita no que falo.

Pietro franziu o cenho. Ele permaneceu alguns segundos calado, como se escolhesse cuidadosamente as palavras antes de acrescentar:

— Eu só queria que soubesse que me senti aliviado em descobrir que não era quem eu procurava. Eu... realmente me importo com o que poderia te acontecer.

Estreitei os olhos. Mas que porcaria aquele otário estava falando?

— Não se preocupe, eu entendo — sibilei. — Espero que Karen seja a pessoa certa para você. Sabe, quem você esteve procurando.

— Bem, ela é.

Pela primeira vez naquela conversa levantei a cabeça e mirei seus olhos cinzas. Ele ainda era o mesmo: os mesmos cachos macios que lhe davam um ar jovial, o mesmo rosto bonito e com um sorriso estonteante. A mesma maneira de dar piscadelas para mim que constantemente me fazia suspirar. Mas eu não era a mesma, não fazia questão de sorrisos, nem amores, nem amigos. No meu coração só havia espaços para dor e eu estava farta de toda aquela idiotice.

— Quer saber, Pietro? — falei. — Esqueça tudo o que eu disse. Eu quero mais que você vá se foder!

Quando terminei de falar outro sinal irritante invadiu meus tímpanos, mas não tão mais irritantes do que angustiantes. Aquele era o sinal da saída.

— Hãn? — disse confuso enquanto me via pegar minha mochila e ir em direção à saída.

Eu estava aliviada, nunca mais teria que olhar para seu rosto e me lembrar das lágrimas que já rolaram devido a ele. Mas também estava preocupada, eu nunca mais veria rostos nenhum daquela escola, e até talvez nem daquela cidade. Quem garantiria que minha nova família não era de outro país?

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