22. Por entre as barras - Briseis

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Ah! — gritei largando abruptamente o livro no chão.

Em parte, eu havia largado porque a presença de alguém na biblioteca me assustara realmente. Afinal, a porta foi fechada com a chave. Mas por outro lado... era ele, eu tinha certeza.

— Briseis?! — exclamou Heitor assim que eu gritei.

— Eu estou louca, só posso estar louca... — murmurei segurando minha cabeça, enquanto abaixava para pegar o livro na tentativa de me certificar que tudo fora uma ilusão.

— O que... — disse Heitor correndo para me ajudar a pegar o objeto. Quando seus olhos perceberam de qual se tratava, ele me olhou surpreso. — Como você pegou este livro? Quem o entregou a você? Por que está aqui? O que viu?

— Para! — gritei. Lágrimas escorriam pelo meu rosto enquanto eu pegava a obra e constatava que apenas folhas amareladas e vazias estavam em seu interior. — Não me interrogue deste jeito quando sou eu que preciso de respostas...

Sentei-me no chão mirando o incunábulo e olhando para o rosto atônito do garoto que estava à minha frente. Era ele, eu poderia jurar.

— Você não deveria estar aqui. Com este livro — falou, arrancando-o da minha mão.

— O que eu devo fazer nesta droga de vida?! — bufei. — O que aconteceu com o "amigo" que eu tinha nesta madrugada? Você acredita nela, não é? Acha que eu sou louca...

— Eu... não acho que você seja louca. Mas você não deveria ser capaz de detectar ele... — disse. Seus olhos agora expressavam preocupação. Ele estava sentado na minha frente, as pernas cruzadas com o livro sobre o colo como que para protegê-lo.

— Você está cometendo um erro... porque eu sou louca sim, merda! — falei. Grandes soluços saiam do fundo de minha garganta. Eu chorava como criança pequena. Não podia ter desenvolvido esquizofrenia. Minha organização mental era uma das coisas que eu mais prezava em mim. Haviam me roubado, precisamente, tudo!

Inclinei-me para Heitor, buscando pegar o objeto em minhas mãos novamente. Ele resistiu. Eu devo ter lhe lançado um olhar mortífero, porque ele o soltou na hora.

Abri a capa folheando, buscando indícios dos desenhos que eu tinha certeza estar ali anteriormente.

— O livro falou! — Minha voz tremia. — Algo sobre um solstício de inverno... E você estava aqui — apontei para uma das folhas amareladas do livro. — Bem aqui. Eu conseguia ver, Heitor, podia jurar que era real. Havia a mulher com lindos cachos castanhos, uns seres que usavam roupas negras... Certos aspectos assustadores. Mas algumas coisas eu já vi em algum momento da minha vida... Eram desenhos tão reais...

Seus dedos tocaram suavemente a minha pele. Ele fechou o livro e sua mão fez uma trajetória até minha face, se apoiando no ângulo da mandíbula e levantando meu rosto.

Ele me analisava, não com medo ou pena, mas intrigado.

— Você não deveria ser capaz... — sussurrou.

Todo o meu corpo tremia.

— Talvez seja melhor me levar de volta a alguma clínica, eu preciso de choques, uma lobotomia. Eu prefiro esquecer quem sou a viver com estas alucinações. Tenho medo do que minha mente possa criar.

Ele não disse nada. Apenas se inclinou e passou o braço sobre meus ombros lentamente, como se pedisse permissão para me abraçar. Em qualquer outro contexto isso soaria estranho. Afinal, nos falamos pela primeira vez há poucas horas. Mas eu sabia que havia algo de especial ali.

Me virei e o apertei com todas as minhas forças, como se tentasse me segurar a realidade.

— Você não está louca. Tudo vai ficar bem... — sussurrou contra meu ouvido.

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