17. Problemas - Heitor

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Quem é você? — eu perguntava.

Você precisa me ajudar! Não me deixe... — ela apenas gritava, como se não pudesse me ouvir.

Seu vestido de águas turbulentas tragava tudo que estivesse por perto. Livros rodopiavam e eram atirados em todas as direções. Os longos cabelos negros flutuavam acima da sua cabeça enquanto seus olhos pareciam mirar o infinito.

Deixe-me te ajudar... — eu tentava gritar acima de toda confusão.

Então ela se movia em minha direção, as mãos buscando algo em que se agarrar. Eu queria que ela me visse, me achasse. Mas algo a impedia de me focalizar, como se eu não estivesse ali. Até que ela começou a chegar mais e mais perto, um terror incontido nos olhos, nossas mãos a centímetros de distância...

E aí, acordei.

Eu arfava e minha pele estava febril. Passei as mãos na cabeça, tentando afastar o mal-estar que me acometia. Quem era aquela garota? E o que fazia nos meus sonhos? Por que não conseguíamos nos comunicar?

Desde que Hanaros voltara a fazer parte de minha vida, a misteriosa garota do vestido de águas também me assombrava. Bem, não era ela que me assombrava, na verdade era o que assombrava ela.

Tentei a todo custo arrancar sua imagem de minha mente para que eu pudesse continuar minha vida naquele momento. Afinal, eu precisava ir à escola.

Após tomar banho, desci as escadas atordoado. O sonho estranho se repetia a cada dia, e cada vez mais as lembranças ficavam mais fortes. Era como... Um aviso.

— Ei, Bela Adormecida! — exclamou Daniel ao ver-me. — Cinco minutos para chegar na escola, e você aí com cara de quem passou a noite acordado.

Ele me lançou um pacote de biscoitos sobre a mesa. Peguei-o no ar, e comi apressadamente.

A garota ainda estava lá, em meus pensamentos. Apesar de tudo, tentei me desvencilhar deles e seguir sóbrio para a escola.

Passamos pela sala de estar, Lucinda não estava. Se ela não estivesse na prefeitura da cidade talvez se reunisse com Zínia para acertar detalhes de nossa missão. Estranhamente elas não envolviam a mim ou Daniel nas tais reuniões. Tudo só girava em torno dela: a Imperatriz.

— Eu me atrasei.

— É, percebe-se — disse enquanto esperava que eu fechasse a porta. — A questão é: por quê?

— Não sei. As coisas estão estranhas. Tem uma garota....

Daniel me interrompeu com um assobio.

— Então teve uma noite agitada? Na companhia de alguém? Talvez os cabelos dela sejam rubros e...

— Você tá viajando legal — cortei. — A menina mal falou comigo esses últimos dias. Aquela velha acha que ela é muito superior para falar com o covardão aqui.

Era daquela forma que Zínia se referia a mim.

— Mas vocês não precisam do consentimento de Zínia para, sabe... transar — disse em tom malicioso.

Eu sequer conseguia acreditar que aquele maldito só pensava naquilo.

— Cara, eu não vou sair com a Imperatriz. Sei lá, tem alguma coisa naquela menina muito sinistra e relacionamentos estão fora do meu cronograma.

— Karen? Sinistra? — ele me olhou como se eu fosse um retardado. — Está doido?

— Okay, se era o que estava querendo saber... o caminho está livre para você — disse, querendo parecer brincalhão, mas com uma ponta de verdade. — Só preciso que ela me ajude com estas questões de Hanaros e mais nada. Fora isso, nós apenas seremos, quem sabe, amigos.

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