➵ 6 | Um abraço amigo

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| RYVEN |

Sei que tem algo de errado acontecendo quando Beverly sai correndo sem aviso prévio. Eu a chamo, mas ela não retorna.

— Ol, o que aconteceu?

Minha irmã mexe nervosamente no brinco grande de argolas.

— Não posso te contar aqui. — Ela segura minha mão e cochicha algo no ouvido de Rachel.

Ol me puxa até estarmos do lado de fora da casa, no jardim frontal — onde, por incrível que pareça, não tem mais tanto movimento. Nos sentamos em um dos bancos de frente a fonte de passarinhos. Ela verifica. Quando vê que não há mais ninguém bisbilhotando, segura minhas mãos.

— Eu preciso que você entenda que a Beverly não era assim tão solta, Ryv. — Eu continuo em silêncio, esperando-a continuar. — Você se lembra? Ela nunca foi beijoqueira.

— Eu lembro. Por isso fiquei tão surpreso quando soube da fama dela.

Olívia gesticula.

— Sim, exato. E ela continuou assim depois que você foi embora... Até se apaixonar. — É visível que minha irmã não gosta do assunto. — Há uns três anos ela conheceu o Flynn. Foi amor à primeira vista. Eles começaram a namorar, sabe? Ela estava tão feliz naquela época..., mas ele era um escroto. Traiu Bev várias vezes e até já foi... você sabe, violento. — Cerro os punhos. — A Beverly perdoava tudo. Ela estava cega. Não importava o quanto eu e Rachel tentássemos os afastar, não adiantava. Até que, com o tempo, ela foi se desgastando. Flynn terminou com ela depois de seis meses e, Ryven, eu juro que nunca a vi tão mal. Ela chorava todos os dias. Para piorar ele ainda espalhou um boato de que ela era fácil. E é óbvio que todo mundo acreditou na palavra dele. Vários garotos começaram a flertar com a Beverly depois disso. No começo ela não gostava, depois começou a ficar com eles pra tentar esquecê-lo. — Olívia pausa, respira e termina: — Quando ele foi embora da cidade, ela esteve na pior fase. Não comia, não dormia, não fazia nada. Foi um processo difícil. Ainda não sei como ela conseguiu se erguer.

Fico alguns segundos sem falar. Primeiro, meu peito se enche de um ódio enorme direcionado ao tal Flynn. Estou tão bravo que posso parti-lo em dois se surgir na minha frente. Meu coração se parte por Beverly em segundo. Ela não merecia passar por isso. Quando nós éramos amigos, na infância, a achava uma garota incrível. Meu passatempo favorito durante anos foi tentar fazê-la sorrir.

— Caramba, eu não fazia ideia.

— Não tinha como você saber, Ryven. — Ol coloca a mão no meu ombro. — Agora ela deve estar por aí, arrasada com a volta dele.

Eu não vou deixá-la sozinha. Se tem uma certeza que acabo de ter na minha vida é a de que preciso encontrar Beverly Anderson.

— Acha que a Bev foi pra casa?

— Não.

— Tem ideia de para onde ela pode ter ido? Algum lugar especial? Quando pequena, ela ia pra casa da árvore quando estava triste. Talvez ela possa estar lá.

Minha irmã pensa.

— Não. A casa da árvore foi destruída a muito tempo... — droga. Me levanto, inconformado. Olívia chama me salva de sair chutando uns anões de jardim. — Mas, pensando bem eu acho que existe um lugar....

Minha irmã me disse que a melhor amiga gostava de ir à um lugar escondido na floresta Austin. Tento seguir as coordenadas com precisão. Por sorte, encontro um Corolla conhecido estacionado em meio as árvores. Desço do carro de Michael, tomando cuidado de trancá-lo — se bem que suspeito que não tenha mais ninguém por aqui para roubá-lo. Os troncos são espaçados. Como Ol me instruiu, ando pelo chão repleto de terra e folhas secas até a paisagem se abrir num espaço amplo e limpo. Agora o solo é de grama-verdinha, margaridas emoldam a paisagem e vagalumes iluminam o ar. Um lago corre o a alguns metros à diante da clareira. O lugar é de tirar o fôleg; sereno e belo. O que se destoa é uma presença feminina sentada solitariamente num espaço vago. Aproximo-me de Beverly com cuidado. Quando me olha, seu rosto está molhado. O rímel escorreu nas bochechas. Ela continua a criatura mais linda que já vi. Linda e triste. Eu ajoelho e a puxo pelos ombros para mim sem hesitar. Ela não recua. Me abraça forte e mais soluços irrompem. A acaricio nas costas. Não tenho pressa. Ela também não. É um momento delicado demais para pressioná-la.

— Como se sente? — sussurro muito depois que o choro cessa.

Ela parece um passarinho com a asa quebrada: indefesa.

— Me sinto péssima... E devo estar horrível — Stelle tenta limpar inutilmente o estrago de cosméticos.

Tento animá-la. 

— Não tá tão ruim assim. Você ainda dá de dez a zero na noiva do Chucky.

Beverly ri, então volta a seriedade.

— Olívia te contou?

Admito que sim.

— Não precisamos falar disso se não quiser.

Beverly suspira e se limita a um agradecimento. Nos deitamos no meio das flores, lado a lado, encarando o céu estrelado. Devagar, enrosco meu dedo mindinho no dela como eu fazia há muitos anos atrás. Viro o queixo de lado. Beverly está de olhos fechados. Mesmo com a maquiagem borrada, continua angelical. A pele banhada pela luz natural da lua, os cabelos estendidos no verde e os traços relaxados a deixam como uma boneca de porcelana. É a pintura de um anjo triste. E agora eu tenho mais uma certeza: não quero retornar a vê-la assim. E farei o que estiver ao meu alcance para que Flynneas Colleman pague por ter sido uma babaca. 

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