21° capítulo.

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Acordei muito, MUITO, tarde (comparado com o século em que eu estava), umas 10:30. Tomei um banho rápido, mal tive tempo de enxugar os cabelos, coloquei um vestidinho rosê, meu bom e velho chinelão e desci as escadas um pouco apressada. 
 Quando, enfim, cheguei a sala de jantar, não havia ninguém lá, eu não me importava de fazer as refeições sozinha, então me sentei e tomei meu leitinho com pão. Uma empregada me disse que todos saíram juntos para resolverem alguma coisa da guarda real, mas ela não me disse o quê.
 Resolvi ir treinar a mira no arco e flecha e, como eu não tinha um, usava o de treinamento. Eu treinava no mesmo lugar em que Páris, no pátio, e os alvos eram espantalhos de palha que ficam espalhados por todos os lugares. 
 Treinei durante duas horas seguidas e nem reparei o tempo passar -como é bom você fazer o quê gosta...- Fui para a sala e vi que todos já haviam voltado, me aproximei e falei gentilmente:
 -Καλημέρα (Kaliméra/ Bom dia)! -Eles respondem o mesmo em coro.
 -Pat, -Andrômaca o chamou depois de mastigar um pedaço de maçã.- vá para perto de Safira -ela se levantou do sofá e Pat fez o mesmo só que permaneceu imóvel.
 -Certeza? Eu não quero que… -ele parecia preocupado e hesitou em chegar perto.
 -Sim, vamos logo, garanto que nada vai acontecer -ela puxou ele e o colocou de pé em minha frente, nós nos encaramos sem jeito.- Você está sentindo algo Safira?
 -Não, nada -respondi simplista e dei de ombros.
 -Isso é bom, é ótimo, na verdade -ela mordeu de novo a maçã e depois de um tempo voltou a falar:- você é bem mais forte do que eu pensava em… -e fez um beicinho, ri.
 -É, ela é -Pat me sorriu e bagunçou meu cabelo, brincando, lhe sorri em resposta.
 -Gente! -Lena chamou nossa atenção.- Eu programei um dia incrível para nós hoje! -Ela estava com os olhinhos brilhando.
 -Como assim? O que vocês estão me escondendo, em? -Perguntei curiosa e cruzei os braços.
 -Nada Safirinha… -Andrômaca riu misteriosamente.- Saímos depois do almoço -ela piscou.

                                  ***

 No tempo antes do μεσημεριανό (mesimerianó/ almoço), as meninas e eu apresentamos a biblioteca aos meninos e acho que paguei mico ao ficar espantada quando Pat disse que gostava de ler, Aquiles ainda confirmou e falou que ele lia muito lá na Ftia, onde eles moravam. Comecei a reparar que Pat era igual aos outros adolescentes: brincalhão, gosta de sair com os amigos, faz cara de durão mas tem um coração enorme, está sempre atrás de uma nova aventura… essas coisas.
 Para o μεσημεριανό (mesimerianó/ almoço), teríamos χοίρου (choírou/ porco), como Andrômaca sabia que eu não podia comer esse tipo de carne, ela mandou preparar para mim uma comida que eu adorava (obs.: Era um costume na Grécia antiga): era a cevada ou trigo cozido, que misturados com água, azeite e mel tinham a consistência de um mingau. Magnifique!
Após comermos, subimos para os quartos e fomos arrumar nossas τσάντες (tsántes/ bolsas), que ficariam nos cavalos. Eu coloquei folhas de papel, um carvão, para desenhar e escrever, algumas maçãs enroladas num "guardanapo", um vestido reserva e a gladiadora que ganhei de Briseis. Substitui o meu chinelão pelas gladiadoras de Lena, fiz um rabo de cavalo, fiquei com o mesmo vestido e desci para selar meu cavalo. 
 -Safira! -Lena chegou no estábulo  muito séria- Vá até os portões e nos espere lá.
 -Tudo bem… -ela realmente não brinca em serviço.
 Não questionei, arrumei Lipaleza e cavalguei até chegar nos portões. Ah é, e sabe quem estava lá? O guarda cujo eu não sabia o nome e não podia chamá-lo só de "guarda amigo de Asti". Ele estava sério, como de costume, acho que ele tinha uns dezoito ou dezenove anos, quando me viu, parou o serviço e foi em minha direção, eu não desci do cavalo:
 -Senhorita… -ele fez uma pequena reverência.- O que deseja? Por favor não fale que quer sair -ele riu, fiz o mesmo.
 -Na verdade, nem eu sei, a princesa Helena pediu-me para esperar ela aqui, você sabe de algo? -Perguntei apertando os olhinhos, tal gesto fez ele rir.
 -Não fomos informados de nada, -me surpreendi, mas, se era mesmo uma surpresa, era natural que ninguém sabia.- mas tenho uma notícia da qual você vai gostar de saber… -ele arrumou a espada na bainha.- os gregos resolveram dar uma trégua, de pelo menos uma semana - aí foi que me surpreendi.
 -Mas isso é ótimo! -Deixei escapar um sorriso.- Obrigada… como te chamam? -Perguntei.
 -Pode me chamar de Lemo -ele respondeu com um sorriso simples.
 -Obrigada Lemo -lhe sorri também.
 -Nossa! -De repente, ele pareceu se lembrar de algo.- Com licença senhorita… -ele fez mais uma reverência e se retirou.
 Achei estranho pois foi só ele sair que os meninos chegaram, até tentei segui-lo com o olhar porém ele sumiu entre os demais soldados. 
 Os meninos estavam de armadura, com espadas e montados nos cavalos, estavam muito elegantes. 
 -Oi prima… -prima? Foi a primeira vez que Aquiles me chamou daquele jeito.- O que faz aí?
 -Oi, -não o chamei de primo.- Lena me pediu para esperar vocês aqui, sabem de alguma coisa? -Eles se entreolharam.- É, pelo jeito sim e sei que vocês não vão me contar, então eu nem vou me dar o trabalho de perguntar né… -dei de ombros, eles ficaram admirados por minha pouca insistência. 
 -Eu não te conheci assim mocinha, o que aconteceu? -Ulisses riu.
 -Pois é, eu não me conheço mais -fiz um draminha e demos risada.
 Vindo longe, avistei as meninas, elas estavam de armadura, o que era estranho pois, naquela época, mulheres não podiam lutar e nem qualquer coisa do gênero. De pouco em pouco elas foram se aproximando e, enfim, chegaram onde nós estávamos. 
 Percebi que elas também estavam armadas, Briseis e Andrômaca estavam com espadas e Lena com dois arcos e flechas. Ela chegou e me entregou um dos arcos e algumas flechas.
 -Obrigada Lena -recebi agradecida.- Vocês sabiam que os gregos deram uma trégua de uma semana? -Les perguntei organizando o arco e as flechas.
 -Sim, nós já sabíamos, por isso estamos aqui… -Andrômaca deu um sorrisinho e fez sinal para um dos guardas abrir os portões.
 -A gente não pode sair… -hesitei.
 -Você -Lena apontou para mim.- não pode sair sem nós ou algum adulto.
 Eles passaram pelos portões tranquilamente e eu os segui, fiquei surpresa por tudo estar tão calmo, geralmente podíamos ouvir alguma movimentação vinda da praia. Confesso que fiquei com um pouco de medo e me lembrei do episódio que Asti e eu passamos antes da viagem dele.

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