Em seguida, Briseis e eu saímos, ouvimos a porta se fechar atrás de nós e corremos para meu quarto. Ao chegarmos, tranquei a porta e Briseis já foi logo se sentando em um lado do divã, me sentei do lado contrário. Ela se esticou para pegar um travesseiro, conseguiu, o agarrou e começou a falar:
-Eu não contei nada para seus primos, muito menos para Heitor e Andrômaca -ela estava séria.- Eu falei que Páris e Ulisses viram porque sei que eles não vão visitar Pat hoje e ele não vai ter como perguntar -abaixei a cabeça.- Safira, -ela a ergueu delicadamente.- se Aquiles ou Pat, souberem do que aconteceu, que Asti te tratou daquela maneira, nós não sabemos o que vai acontecer. Mas… -ela relaxou.- se você quiser contar, a decisão é sua, Ulisses e Páris viram e podem te ajudar, Lena e eu também, mas não garanto que eles vão ficar “na boa” de saber que Asti fez aquilo.
-Não, -respondi.- não irei contar nada agora, pelo menos, por enquanto. Heitor já está muito bravo com ele… -apoiei os cotovelos nos meus joelhos e me escondi nas palmas de minhas mãos.- Ah, não sei o que eu faço…
-Acho que você deveria relaxar -a olhei com dúvida.- Ah, não me olha assim, -ela revirou os olhos e riu.- vamos mostrar para todos que você está bem -ela se aproximou de mim.- Olha, eu sei que o que irrita mais Asti na vida, do que qualquer coisa, é a gente ignorá-lo.
-Como assim? -Eu realmente não estava entendendo nada.
-Mas gente… -ela bateu com a mão na testa.- Dá um gelo nele, mostre que você é muito melhor do que ele pensa -espera, pode dar certo.- Ele não te falou que você não significou nada pra ele? -Fiz que “sim” com a cabeça.- Então, mostre que, para você, ele também não significou nada -me endireitei para ouvi-la melhor.- Siga sua vida feliz, tenho certeza que ele vai vir falar com você daqui a um tempo.
Pode dar certo. Com certeza vai dar certo! Eu sei o que muitos aí estão pensando: Nossa, mas ela nunca deu gelo em ninguém na vida? A resposta é não. Eu nunca tive problemas com amigas nem com namorados, até porque, eu nunca namorei, nunca tive ex nem atual. Acho que, o que eu poderia fazer, era seguir os conselhos dos “mais velhos”. Eu conhecia Asti desde que ele era pequeno e, em parte, o que Briseis falou era verdade, ele não gostava de ser ignorado.
-Adorei! -Levantei e bati palmas.- Você está certa.
-Isso, obrigada -falou ela ironicamente, em seguida se levantou.- Olhe, eu já até pensei em um plano, -nossa que rápida.- hoje ninguém está com clima para nada então vamos deixar para amanhã.
-Mas fala qual é o plano! -A motivei a continuar.
-Amanhã... amanhã eu te conto -ela deu um sorrisinho, ela sabe que eu sou ansiosa.
-Poxa Briseis! Isso é maldade… -fiquei emburrada de propósito, ela riu e foi em direção a porta.
-Depois a gente conversa mais, -ela apontou para mim.- mas não vá ficar aqui encruada no quarto -ela abriu a porta, mandou um beijinho, saiu e escorou a porta.
Fui até lá e a fechei melhor. O que Briseis está aprontando? O ruim é que eu teria que esperar até o dia seguinte para saber.
Durante o resto da tarde, fiquei no meu quarto jogando joguinho no meu celular que, estranhamente, ainda estava no 90%. Só desci para pegar uma maçã e não havia ninguém, além de Pat e eu em casa. Como estava inteditada, acabei de comer e resolvi ir ver se Pat estava acordado. Subi e bati na porta sussurrando:
-Pat, você está acordado? -Logo ouvi o trinco se abrindo.
-Oi Safira, tudo bem? -Ele estava com o cabelo molhado, devia ter acabado de tomar banho.
-Você está ocupado? -Perguntei.
-Não, acabei agora de tomar banho -sabia- e, para falar a verdade, estou entediado.
-Eu também -rimos.- Não tem ninguém no castelo, acredita? Está um silêncio só. Vim saber se você não precisa de ajuda com algo e -me lembrei.- se você está melhor, é claro.
-Na verdade, eu preciso de ajuda para trocar os curativos, eu já ia chamar a οικονόμος (oikonómos/ empregada) -ele escorou na porta.
-Se quiser, eu ajudo -me ofereci, embora eu não tenha nenhuma habilidade com medicina.
-Claro, pode ser… -ele abriu mais a porta.- Entre, por favor -ele não a fechou.
Entrei e me deparei com a mesa, antes sem nada, cheia de tecidos, umas espécies de ervas, água e algodão, então me lembrei de Grey's Anatomy (risos). Eu havia assistido com minhas amigas a alguns episódios.
Ele se sentou em uma poltrona, coloquei uma almofada atrás de sua cabeça para ele não ficar desconfortável. Comecei desamarrando o antigo curativo, ele fez uma careta por conta da dor, eu ri e continuei. Até que não estava tão feio quanto eu imaginava, era mais superficial mesmo, era só um corte raso que sangrava. Peguei o algodão, mergulhei na água que estava quente, passei sobre o corte para limpar, reconheci que, em uma das garrafas, havia algumas folhas de arnica e, essa planta, é muito boa para aliviar a dor e curar hematomas, peguei um pouco do líquido com o algodão e passei sobre a ferida, notei que Pat estava com os olhos fechados. Para encerrar, peguei um pedaço do pano e amarrei de modo que protegesse o corte.
-Prontinho! -Falei me afastando e dando um sorrisinho simplista.
-Obrigada, Safira -ele se levantou.
-Denada -respondi ainda sorrindo.
-Eu tô com fome… -ele bateu no estômago.- Vamos descer e ver o que tem pra comer?
-Acho que não moço -o puxei delicadamente o colocando novamente sentado na poltrona.- Você precisa descansar, eu vou lá embaixo, vejo o que tem, o que você PODE comer e trago -me virei e fui em direção a porta.
-Não quero dar trabalho -ele falou sem jeito.
-Ah não, -me virei para ele novamente.- não é trabalho nenhum. Eu já volto -sai rapidamente.
Desci as escadas cantarolando a música "Sem Sal" da rainha da sofrência, Marília Mendonça atravessei a sala e, ao passar pela porta da sala de jantar para a cozinha, dei de cara com Asti, por pouco não esbarramos. Fiz como Briseis falou, fingi que ele não estava ali. Não o olhei nos olhos, ergui a cabeça e passei por ele.
-Cuidado, lá vem a princesa beijoqueira -ele falou para as νοικοκυριά (noikokyriá/ empregadas) que estavam na cozinha, para onde foi aquele amor? Em seguida, saiu.
Não revidei, me apoiei em uma mesa e arrisquei um sorriso, uma das meninas reparou o que aconteceu:
-Não fique assim senhorita, ele só está com raiva, mas logo isso passa -ela me sorriu e parou de picar a cebola.
-É, pelo jeito, todos já sabem o que aconteceu… -olhei para a mesa de madeira.- Mas, -me lembrei do meu propósito e voltei a olhar para ela.- será que você tem algo que Pat possa comer?
-Claro, tenho sim -ela secou as mãos em um pano.- Falaram que ele tinha que comer coisas moles, temos algumas frutas… -ela foi até um armário e retirou uma cesta cheia de diversas frutas.
Como ele tinha que comer coisas moles, lembrei-me de uma receita que minha mãe faz para mim. Fui até onde a moça estava e peguei duas bananas.
-Senhorita, deixe que eu faço isso -ela mantinha certa distância.
-Obrigada mas hoje, sou eu quem vai te ensinar uma receita… me ajude, pegue um prato -pedi com educação, ela logo trouxe e ficou observando o que eu fazia.
Descasquei as bananas, peguei um garfo, amassei elas no prato, peguei o leite que estava em uma jarra, despejei no prato junto com as bananas e comecei a mexer.
-Tem aveia? -Perguntei e a moça já estava com a aveia ali do lado.- Obrigada -lhe sorri.
Adicionei a aveia e misturei um pouco mais. Em seguida, com a pontinha do dedo mindinho, provei, top!
-Obrigada -agradeci colocando o prato em uma bandeja com uma colher.
-Pelo o quê senhorita? Eu nem fiz nada -ela corou.
-Fez sim, aliás, -aumentei o tom de voz para que todas ouvissem.- vocês fazem muito aqui, obrigada meninas -lhes sorri, elas retribuíram alegres e eu saí.
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𝔼𝕞 𝕞𝕖𝕦 𝕞𝕦𝕟𝕕𝕠...
Ficción históricaSafira é uma garota de dezesseis anos e que tem uma rotina bastante normal. Nas suas férias de julho, em uma noite, ela resolve assistir seu filme preferido: Tróia (2004), quando algo diferente acontece e ela entra para dentro do filme. Tudo no fi...