58° Capítulo.

27 3 0
                                    

Acordei com um cheiro maravilhoso de pão e logo a fome bateu. Levantei-me em um pulo e corri tomar banho.
 Deixei meus cabelos loiros soltos, nem os sequei direito, troquei o curativo, coloquei um vestidinho amarelo com detalhes azuis, uma das minhas gladiadoras e desci. 
 Quando estava descendo as escadas, antes que eu pudesse chegar a sala de jantar, alguém me puxou pelo braço para baixo da escada. 
 -Que susto, Pátroclo! -falei arrumando meu vestido e dando pequenos safanões em Pat.
 -Eu sonhei com Leia… -os olhos dele estavam marejados, dei dois pequenos tapinhas em seu ombro, tentando o confortar.
 -E como foi? -perguntei curiosa. 
 -Bem, ela parece estar muito bem e me disse que, quando eu menos esperasse, eu iria ter uma surpresa -ele enxugou uma lágrima que caira acidentalmente.- Eu tentei perguntar a ela, mas acordei antes disso.
 -Ela te ama muito, primo. Você não sabe o quanto -disse com absoluta certeza.
 -É, eu sei, e eu amo ela também. Sei que vamos nos reencontrar um dia -ele sorriu.
 -Vão sim, acredite -voltei-lhe o sorriso.- Mas vamos comer, estou faminta… -ele riu e balançou a cabeça em concordância. 
 Estávamos quase entrando na sala de jantar quando Pat começou a rir, parei esperando uma explicação.
 -O quê foi? -quis rir também.
 -É que… -ele riu mais.- Assim que eu te vi, da primeira vez, -ele tentou se manter sério.- eu gostei de você -meus olhos se arregalaram. 
 -Co...como? -cruzei os braços.- Gostou de que maneira?
 -Da mesma maneira que gostei da Leia, por isso fui tão chato, eu só queria chamar a sua atenção -ele voltou a rir, bati a mão na testa.- Depois que eu descobri que éramos primos, esse sentimento foi passando e se transformou em pura parceria e amizade.
 -Você tá me zuando? -questionei ainda séria, o que fez ele rir mais ainda. 
 -Eu não queria te contar mas não aguentei, tinha que te falar isso -ele continuou rindo e eu ri também.
 -E, para ser sincera, -cala a boca, Safira!- eu te achei um gatinho… -pisquei e rimos mais.
 -Achava? -ele jogou os cabelos loiros para trás e ergueu uma das sobrancelhas.
 -Ainda acho, seu convencido -bati de leve no seu ombro, ele beijou minha testa e fomos para a sala de jantar, onde todos estavam.
 O pão recém assado estava com o cheiro maravilhoso, como tudo na mesa. Eu provei TUDO, aproveitei que eu havia emagrecido, por causa do livro e toda a coisa com os meninos, e comi mesmo. 
 -Vamos todos para a praia! -Lena sugeriu depois de um tempo.
 Todos pararam de comer e olharam para a loira que estava ainda mastigando um pão com geléia. 
 -Claro, amor, o que você quiser -Páris respondeu fazendo um biquinho a qual Lena retribuiu. 
 Então, após o πρωινό (proinó/ café da manhã), nos arrumamos e fomos para a praia. 
 Briseis, Ulisses e eu não podíamos entrar na água, por conta dos ferimentos, então estendemos tecidos no chão e nos deitamos sobre eles. Aquiles também não entrou para ficar vigiando a amada, é claro. 
 Todos riram muito naquela manhã, tanto pelas brincadeiras que o pessoal fazia, quanto com as piadas que contávamos sentados na areia.
 Estávamos tostando no sol faziam algumas horas quando uma água fria me despertou do meu quase cochilo. Me levantei rápido para ver quem me despertara e dei de cara com Asti rindo e segurando uma concha cheia de água. Todos começaram a rir.
 -Eu não acredito… -falei enxugando a água do meu corpo com violência. 
 -Ninguém mandou você tentar tirar uma soneca na praia -Asti deu de ombros e posicionou-se como fosse lutar.- Está pronta para a batalha? 
 -Mas é claro que sim -fiz a mesma posição de luta e ele começou a correr para dentro do mar.
  Como minha garganta já não doía mais e o sangramento já havia parado, não vi problema em entrar na água. 
 Corri também para o mar e começamos uma guerrinha de água, parecíamos duas crianças, igual antes. 
 Observei a margem, Heitor caiu na areia ao lado de Andrômaca, Páris e Lena foram para um cantinho mais reservado onde ficaram trocando carícias, Pat se juntou ao primo, a Briseis e a Ulisses e começaram a conversar. 
 Asti, notando a distração de todos, se aproximou mais de mim e falou: 
 -Quando eu mergulhar, você faz o mesmo, está bem?
 -O quê você está tramando? -ele riu e piscou.
 Fiz o que ele disse e, ao mergulhar, depois dele, fui surpreendida com um beijo. Não estávamos tão fundo assim pois eu conseguia sentir a areia em meus pés. Então Asti me aproximou mais dele, me puxando pela cintura, até ficarmos sem ar e sermos obrigados a voltar para a superfície. 
 -Bobinho -falei e joguei água nele que retribuiu tal ato. 
 Certificamos para ver se alguém havia visto nossa troca de carinho mas, à primeira vista, tudo estava normal, ele deu um risinho no canto da boca e voltamos para a areia.
 -Então está bom não é criançada? -Heitor levantou-se em um pulo.
 -Está sim, já matei minha vontade de dar uns mergulhos -Lena respondeu espremendo a água dos cabelos loiros, sentada na areia. 
 Pat bufou com algo, desviamos o nosso olhar de Lena e olhamos na direção dele. Nos deparamos, então, com Aquiles e Briseis trocando carícias (b e i j o s) apaixonadas.
 E, eu sei o que você está pensando: mas o que é que tem eles trocarem uns beijinhos e uns abraços? Eu vou lhes responder meus caros leitores: Aquiles era considerado, até então, um guerreiro sem coração e um garanhão, então não estávamos acostumados, mas a cena era tão fofa… ahhh
 -Pronto, além de todos os casalzinhos aqui presentes, mais esses dois trocando afetos -Pat revirou os olhos, novamente, e nós rimos.
 -Como assim "além de todos os casalzinhos aqui presentes"? -Aquiles se endireitou e encarou o primo.
 Eu gelei na hora, será que alguém disse algo a ele? Olhei para Asti ao meu lado e ele estava branco, mas tão branco, que o sol quase refletia nele (risos). 
 -É, além do pessoal aqui, os irmãos parada dura -Pat fez piada, com certeza ele sabe de algo.
 Aquiles olhou meio desconfiado mas deu de ombros e, depois de se levantar, ajudou Bri a fazer o mesmo. 
 Eu amarrei um pano na minha cintura, para cobrir o maiô, e esperei que o pessoal se arrumasse para voltarmos à cidade. 
 Chegamos rápido, um mais cansado que o outro e, é como dizem: água da sono. Como de costume, nós nos sentamos nos sofás e esperamos alguém puxar assunto.
 -Galera, -Aquiles mal sentou e já se levantou.- eu vou subir -ele estendeu a mão para Bri.- Vamos, amor? 
 -Vamos sim, se nos dêem licença… -ela disse educadamente. 
 Aquiles estava sendo muito bom com ela, era até fofo de ver. Depois de ele ajudar ela se levantar, eles subiram a escada, com cuidado, e sumiram pelo longo corredor.
 -Safira, -Pat me chamou após um tempo.- me acompanhe até a biblioteca, tenho que falar com você.
 O loiro se levantou e foi andando, arregalei os olhos para Asti, que repetiu tal gesto, e fui atrás de Pat, todos olharam para nós. Ele abriu a porta para mim e eu entrei antes dele, que fechou a porta.
 -Vocês estão namorando? -ele perguntou antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele estava bem sério. 
 Eu travei na hora, tentei me manter calma, eu não sabia o que Pat poderia fazer se soubesse da verdade mas, talvez seria melhor se ele soubesse… Cruzei os braços e dei um risinho de boca fechada.
 -Por quê diz isso? -o olhei e vi, em seus olhos azuis, meu reflexo. 
 -Por conta de tudo que ele disse, pelo o quê os outros disseram, pelo jeito que ele te olha, pelo seu jeito de o olhar… por tudo -ele gesticulava bastante. 
 -Que jeito a gente se olha? -me fiz de desentendida. 
 -Com amor, Safira -ele se sentou em uma cadeira, me aproximei dele.- Por quê você não me contou? -não posso mais esconder.
 -Eu não queria que você ficasse bravo, ou com ciúmes, não sei… -dei de ombros e desviei meu olhar. 
 Comecei a encarar uma das estantes de livros para evitar olhar Pat nos olhos. Senti que ele começara a acariciar meus cabelos, ele pôs uma das mãos em meu rosto e me virou para ele:
 -Vocês se amam? -ele perguntou seriamente, como eu nunca o havia visto antes. 
 Essa era uma boa pergunta… eu nunca havia gostado de alguém antes mas, com Asti, eu tinha certeza daquele sentimento. Porém, eu não sabia se Asti sentia o mesmo, apesar de tudo o que ele havia dito. 
 -Sim, da minha parte -dei um risinho.
 Ele fechou os olhos, balançou a cabeça de um lado para o outro e voltou a me olhar.
 -Mas, e ele? 
 -Eu não posso falar pelo coração de outra pessoa, Pat. Eu falo pelo meu, deixe que Asti fale pelo dele -ele permaneceu com a expressão natural e isso, de certa forma, me intrigava, eu nem podia imaginar o que se passava pela cabeça dele.
 Ele se levantou, me afastei para dar espaço e ele começou a andar pela biblioteca com os braços para trás. Por fim, parou próximo a janela e me disse:
 -Se, por um acaso, ele não corresponder esse sentimento, eu não quero te ver triste por aí, me ouviu? -sua voz soou com autoridade.
 -Sim, eu não irei ficar… -será que ele realmente gosta de mim?
 Fiquei pensando em tudo o que acontecera desde que eu havia chegado em Tróia e, direta ou indiretamente, Asti sempre estava lá. Mas isso não queria dizer que ele GOSTAVA de mim ou que ele apenas “gostava” de mim. Eu não quero ser iludida!
 -Ei… -Pat me despertou desses pensamentos, com certeza reparou minha preocupação.- Eu não estou dizendo que ele não gosta, sou estou falando caso isso aconteça -balancei a cabeça em concordância e senti uma lágrima caindo no meu rosto.- Ah, Safira… -ele me puxou para perto dele e me abraçou.
 Pat era, apenas, um garoto de dezenove anos mas parecia que ele já havia vivido muito a vida, parecia ser muito experiente e falava firme. 
 -Primo, -falei já mais calma e continuei abraçada com ele.- nós não estamos namorando -nos afastamos um pouco e ele olhou para mim intrigado.- Ele nunca falou disso então, não serei eu a comentar alguma coisa -dei de ombros.- Obrigada, Pat -dei um beijo em seu rosto e, depois de abrir a porta, saí de lá bem rápido. 
 Passei pela sala como um raio e subi as escadas com pressa. Ouvi Asti me chamar, mas prossegui, quando cheguei ao meu quarto, tranquei a porta e me joguei na cama, confesso que algumas lágrimas caíram.
 Em um certo momento, me lembrei de uma parte da história de Pat, sobre os pais dele: Quando Pat era mais jovem, ele provocou a morte de um amigo, Clisónimo, durante um jogo de astrágalos (algo semelhante a dados), daí deu origem a uma guerra, onde os pais dele lutaram e morreram, então ele foi levado para Ftia, onde foi criado por seus tios, Peleu e Tétis, junto a Aquiles. Acho que, por essa razão, Pat teve que amadurecer mais cedo e se tornou mais "experiente", por assim dizer. Foi aí que as lágrimas caíram mais, eu não gosto de histórias assim, tão "pesadas", ainda mais se tratando de meu "primo". 
 -Safira… -alguém me chama na porta, e eu conhecia bem aquela voz.
 Me levantei, enxuguei as lágrimas, dei uma arrumada no vestido e fui abrir a porta. Respirei fundo, coloquei um sorriso no rosto e, quando virei a maçaneta e empurrei a porta, Asti estava lá, com os braços abertos oferecendo-me um abraço. O abracei me acomodando em seus braços e ele beijou minha testa.  
 -Asti, -olhei para ele.- você… você gosta de mim? -ele ergueu uma das sobrancelhas.
 -Por quê isso agora, meu amor? -afastei um pouco a cabeça do peito dele. 
 -Falo sério, você gosta de mim? Ou, como você mesmo disse, só quer dar uns beijinhos em alguém? Por que, se for isso, eu… -e eu fui interrompida quando Asti cobriu meus lábios com os dele.
 O loiro me apertou contra seu peito e passou a mão por meu cabelo, me afastei um pouco, intrigada. 
 -Acho que isso responde sua pergunta, não é? -balancei a cabeça e dei um risinho.- Eu te amo e, se for preciso, enfrento tudo por você, meu amor -lhe sorri, ele retribuiu tal ato e tornou a me beijar. 
 Eu ficava na ponta dos pés, ele era bem mais alto do que eu, mesmo eu tendo crescido um pouco, mas nenhum de nós nos importava. 
 -Asti… -sussurrei.- Eu contei a Pátroclo sobre nós dois -ele se afastou mais e me olhou um pouco espantado.
 -E o quê ele disse? -que apressado.
 -Bem, ele perguntou se nós nos amamos mesmo -dei de ombros e, devagar, ele desceu as mãos para minha cintura.
 -E o que você disse? -ele me deu um rápido beijinho. 
 -Eu falei que, da minha parte, sim -o loiro se fez de espantado.
 -Como assim "da sua parte"? -ele me largou e cruzou os braços, reparei que ele estava mais musculoso. 
 -Como eu disse, eu não posso falar pelo coração dos outros, só pelo o meu. 
 Ouvimos alguém subindo as escadas e olhamos naquela direção rapidamente, vimos várias cabecinhas aparecendo, provavelmente o pessoal estava voltando. 
 Asti me deu mais um rápido beijo e bagunçou meus cabelos.
 -Eu te amo, tire essas coisas da sua cabeça, viu mocinha… 
 -Está bem -revirei os olhos e ri.
 Corremos, cada um para seu quarto, e trancamos a porta. Quando olhei para minha cama, sobre ela havia um lindo vestido, na verdade, era um saia longa e um cropped. A saia tinha um degradê do vinho pro rosa e detalhes em cobre; o cropped era o mesmo rosa da saia e, em vez de mangas, tinha alças de ferro e cobre e algumas pedras safiras, que davam um belo contraste; também havia um tipo de pulseira que eram ligadas por um tecido vinho transparente, era muito lindo; ao lado, tinham uma coroa de safiras e conchas, um colar também de conhas (que se parecia muito com o de Pat) e uma gladiadora de couro e cobre. 
 Procurei por um cartão ou algo que pudesse indicar quem havia deixado tudo aquilo ali, mas não encontrei nada. Dei um pulo quando ouvi alguém batendo na porta.
 -Quem é? -perguntei me virando para ela.
 -Senhorita Safira, o μεσημεριανό (mesimerianó/ almoço) está pronto -uma οικονόμος (oikonómos/ empregada) me avisou.
 -Obrigada, já irei descer -respondi educadamente.
 Voltei a olhar para minha nova roupa e decidi vesti-la, depois de um bom banho, é claro (não sei se vocês repararam, mas eu amo água e, principalmente, tomar banho). Depois de me trocar e pegar meu celular, desci cheia de fome.
 Quando cheguei na sala de jantar, Helena e Briseis estavam chorando, Pat estava debruçado sobre a mesa, Páris ao lado do irmão e, em vez de comida, o meu livro estava nas mãos de Heitor. 
 -O quê é isso? -perguntei me aproximando de Andrômaca.
 -Olhe pela janela, Safira -ele me respondeu e encostou a cabeça no ombro do marido.
 Fiz o que ela pediu e, ao olhar para fora, vi que, do meio do pequeno bosque, havia uma forte luz brilhando, então me lembrei de que, quando tal luz aparecesse, era minha vez de voltar. 
 Meus olhos encheram-se de água, eu não tive forças para voltar a olhar para o pessoal mas, quando Ulisses, Aquiles e Asti chegaram, me virei para eles. 
 -Eu tenho que… -enxuguei uma lágrima.- tenho que ir embora, gente.
 -Mas… -Lena levantou.- e a gente? -ela enxugou as lágrimas.- Eu sei que não podemos te prender aqui mas, vamos sentir tanta saudades -por fim me abraçou e o nosso choro tomou mais força.
 -Ah Safira... -Bri também se aproximou com cuidado e nos abraçou. 
 Quando eu cheguei em Tróia, tudo o que eu queria era sair de lá, mas eu havia aprendido a amar aquele país, eu havia me lembrado de todos, havia conhecido o amor… Era duro ter que partir. 
 Senti alguém limpando minhas lágrimas, levantei meu rosto para ver quem era a tal pessoa e me surpreendi ao ver Aquiles com um sorriso triste bem na minha frente. 
 -Vem cá… -ele me puxou para perto dele me envolvendo em um abraço.
 Era estranho abraçá-lo afinal, eu estava abraçando o Brad Pitt!
 -Eu não tive chance de dizer tudo o que eu queria te dizer, mas -ele acariciava meus cabelos.- você mora em meu coração, prima. 
 Levantei o rosto para olhar para ele e o sorri, ele repetiu tal gesto, peguei em uma de suas mãos e olhei em seus olhos:
 -Me desculpe ser tão chata, é difícil ser prima de gente importante, sabe… -pisquei e rimos, eu em meio aos soluços.
 -Vamos comer -ele falou se afastando um pouco.

𝔼𝕞 𝕞𝕖𝕦 𝕞𝕦𝕟𝕕𝕠...Onde histórias criam vida. Descubra agora