6° capítulo

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Briseis me arrastou empolgada pelo meio do salão, era Astíanax, filho de Heitor e Andrômaca que havia retornado. Pelo o que eu estava sabendo, ele estava viajando para conhecer todos os arredores de Tróia para, futuramente, se tornar rei. Quem estava governando era Páris, pois Astíanax ainda era de menor, tinha uns dezesseis ou dezessete anos, aparentemente. 
 Páris apareceu dando um abraço no sobrinho e depois, discretamente, chamou Heitor que o seguiu. Distraída observando tudo, quase levei um susto ao ouvir Briseis me chamar: 
 -Safira, esse é meu primo, Astíanax. Se lembra dele? -Fui até eles. O garoto me olhava o tempo inteiro nos olhos.
 De repente me veio a lembrança de nós brincando de espada e até montando a cavalo. Tudo isso foi rápido e eu deixei escapar um sorriso. 
 -Eu sabia que você iria se lembrar de mim… -ele me abraçou e eu retribui. Foi realmente um abraço de dois amigos que a muito não se viam.- Vou cumprimentar todos e já já conversamos -ele foi se afastando devagar.
 -Ok -foi só o que consegui falar antes que ele saísse.
 Comecei a lembrar de várias coisas, banhos de mar em que todos estavam presentes, cavalgadas longas durante a tarde, jogos e muitas risadas. Me escorei um pouco na parede pois tudo aquilo me deixava, de certo modo, tonta. Eram muitas informações…
 -Safira! -Gritou Helena, me virei para ela.- Venha se sentar aqui comigo -ela bateu em um canto do sofá que estava vazio.
 Andrômaca, Briseis e eu nos sentamos ao lado de Helena. Andrômaca estava com um vestido azul escuro com pedrinhas que brilhavam ao ela se movimentar e Helena, com um vestido azul claro decotado. 
 -Andrômaca -chamei-a.- quantos anos Astíanax tem? -Peguei uma torrada e a mordi.
 -Tem dezesseis, fará dezessete -respondeu simplista e também pegou uma torrada.
 -Safira… -Astíanax chegou.- venha comigo -ele me deu as mãos e fonos até a βιβλιοθήκη (vivliothíki/biblioteca), porém a porta estava fechada. 
 -O que nós vinhemos fazer aqui? -Perguntei me aproximando devagar.
 -Eu vi meu pai, meu tio, Pátroclo, Aquiles e Ulisses entrando aqui -ele falou baixinho.
 -Mas Ulisses está aqui? -Fiz um esforço para me lembrar mas nada.
 -Sim, eu o cumprimentei há alguns minutos e meu tio veio chamá-lo. -Ele encostou o ouvido na porta.- Queria saber o que eles estão falando...
 Realmente a curiosidade era enorme, então eu também encostei meu ouvido na porta para tentar ouvir algo. Eles falavam baixo mas consegui ouvir quando eles perdoaram um ao outro, olhei para Asti e ele para mim animado -ele também não gostava de guerra. De repente a conversa parou.
 -Não ouço nada -murmurei olhando para Astíanax.
 -Nem eu, acho que… -a porta se abriu do nada, cortando a fala de Astíanax e nos levando ao chão. 
 -Muito bonito vocês dois, né… -falou Páris rindo, assim como todos que estavam ali e viram nossa queda.
 Asti e eu nos levantamos rapidamente, dei uma batidinha no vestido para tirar a sujeira, evitei encarar o pessoal, que vergonha. Astíanax pareceu não se importar e cruzou os braços atrás do corpo.
 -Que bom que vocês fizeram as pazes... -ele disse como se acabasse de tirar um 4+ em um jogo de Uno.
 -Ah mocinho, então vocês ouviram mesmo né… que coisa feia -brincou Heitor fazendo cara de bravo.
 Eu tentei ficar séria, de repente, notei um olhar triste presente no rosto de Heitor, Aquiles também viu e falou algo a ele que não ouvi, os dois apertaram as mãos como se fechassem um negócio. 
 -Bem, tudo está ótimo agora e…
 -Não, não está -Heitor cortou a fala de Ulisses e prosseguiu.- Eu sei o que eu fiz e tenho a consciência de que não foi algo puro… -ele não nos olhava nos olhos. 
 -Não, quem errou fui eu -admitiu Pátroclo de cabeça baixa.- Errei ao sair escondido, errei ao pegar a armadura de meu primo sem ele saber, falhei em pensar que poderia enfrentar um dos maiores guerreiros de Tróia -ele nos encarou.- O único que errou aqui, fui eu -ele bateu no próprio peito.
 -Não cara... -e todos deram tapinhas em suas costas.
 Olhei para Asti que estava com os olhos vermelhos e brilhantes, sem nenhuma palavra, eu sabia que ele estava fazendo um GRANDE esforço para conter as lágrimas, então me dei conta que também estava por um fio de cair em prantos. 
 -Vamos voltar à festa agora… -Páris pareceu despertar. 
 Voltamos ao salão, e quando chegamos no lugar onde as meninas estavam, percebemos que Asti e eu não éramos os únicos a estar curiosos…
 -E aí, o que aconteceu? -Nos perguntou Helena ansiosa, até deixou de lado a taça de água que estava tomando. 
 -Eles fizeram as pazes -respondi simplista e sentei no meu lugar. 
 De repente, Páris chamou a atenção de todos na festa, subiu em uma mesa e começou a falar:
 -Καληνύχτα (Kalinýchta/Boa Noite). Gostaria de agradecer a presença de todos aqui, pois essa é uma noite muito especial, -Heitor, Aquiles e Pátroclo se aproximam.- hoje é a noite em que, esses guerreiros e amigos voltaram para a gente, hoje é a noite em que, minha sobrinha de coração -ele olhou em minha direção, senti meu rosto corar.- e meu sobrinho, chegam de suas aventuras e sou grato a isso… um brinde! -Ele ergueu a taça e todos fizeram o mesmo, em seguida uma salva de palmas e ele continuou:- Essa noite fica mais especial ainda pois acabamos de ganhar três grandes nomes para nossa cidade -todos se entreolharam.- Aquiles, Ulisses e Pátroclo vão ser, oficialmente, guerreiros de Tróia -meu queixo caiu, todos bateram palmas e eu fiz o mesmo. De repente Asti me cutucou.
 -Não gostei… -ele se aproximou mais e falou em meu ouvido.
 -Por quê não? -Questionei.
 -Eles não me parecem confiáveis e outra, esqueceu o que fizeram com meu pai, meu avô e minha cidade? -Eu nada disse pois sabia da verdade.
 Asti é um bom menino e, no futuro, dará um bom rei. Ele tem esse espírito de liderança e de justiça igual ao pai, e faz de tudo por sua cidade. Ele também é um bom guerreiro. Me lembro de que quando éramos crianças e brincávamos com espadas de madeira e ele era muito bom, não sei como ele estava naquele momento, afinal, fazia muito tempo. 
 Meus pensamentos foram interrompidos quando, ao som de uma música lenta, Asti se levantou e estendeu a mão para mim como se me convidasse, em silêncio, para uma dança. Eu dei um gole na água que estava em minha frente, peguei a mão dele e ele me conduziu para a pista de dança.
 Algumas tochas foram apagadas, deixando um clima bem de romance mesmo. As mãos dele seguravam minha cintura, eu envolvi meus braços ao redor de seu pescoço e começamos a balançar de um lado para um outro. Em algum momento, nossos olhares se encontram, nunca havia notado como os olhos azuis dele eram bonitos, corei um pouco, ri sem jeito e abaixei a cabeça. 
 -O que foi? -Me perguntou ele com um leve sorriso nos lábios.
 -Nada, -dei de ombros e voltei a olhá-lo nos olhos.- só é engraçado como a gente muda -ele me olhou com  dúvida.- Antes eu não pensava assim, mas agora…
 -O que te faz pensar assim? -Que questionador ele...
 -Sei lá, -dei de ombros.- todos falam que eu mudei, que eu cresci mas, para mim, ainda sou a mesma. 
 -Entendo -ele olhou para o lado e voltou a me encarar.- mas olha que bom… a gente evoluiu, crescemos, -ele parou e riu.- quer dizer, você ainda continua baixinha -rimos, eu dei um tapinha em seu ombro e ele prosseguiu:- e você continua bonita…
 -O… obrigada -agradeçi e senti, além de meu rosto corar, uma sensação diferente, umas borboletas no estômago.
 -É a verdade -ele sacodiu os ombros e continuamos dançando.

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