Acordei com o barulho da chuva que caía lá fora, me levantei, coloquei meu chinelão, fui até a janela e olhei. Não havia uma só alma viva lá fora, só era possível ouvir a melodia das gotas de água que caiam sobre o chão.
Deveria ser umas nove horas, tomei meu banho e, quando fui colocar o meu vestido, reparei que havia, em meu braço, manchas roxas, - deve ser onde Asti me segurou.- toquei e elas doíam. Resolvi colocar um vestido de mangas leves, ele era creme com detalhes em rosa, também coloquei uma cordinha na cintura para enfeitar. Penteei meu cabelo, o prendi em um rabo de cavalo, coloquei minhas gladiadoras que ganhei de Briseis, limpei meus óculos e desci.
Cheguei na sala de jantar e me deparei com meus primos, Heitor e Páris, eles conversavam e, quando me viram, pararam. Eu estava terrivelmente exausta, não havia dormido tão bem assim, dormi com o dia já amanhecendo, além disso, comecei a sentir uma dor horrível no pé, acho que estou com olheiras, pensei e passei a mão sobre os olhos.
-Pararam de falar por que? -Minha voz falhava, eu cheguei e fiquei em pé ao lado de Heitor.
-Por nada não -Páris respondeu rindo e, notando meu sorriso triste, perguntou:- O que foi?
-Nada… -tossi.- eu só estou com um pouco de dor, mas não é nada -eles se entreolharam e Heitor colocou a mão na minha testa.
-Safira, você está quente, acho que está com febre… -ele pareceu preocupado.
-Deixe-me ver -Aquiles se levantou, deu a volta, foi onde eu estava e colocou a mão sobre minha testa.- É, está sim -ele me olhou preocupado.- O que você está sentindo?
-Ah, -escorei na cadeira.- dor no pé -e tossi.
-Ah… -Páris deixou escapar.- deve ser o lance do livro, certeza. Aquiles -ele o chamou.- acho que seria melhor você se afastar um pouco dela.
-Por quê? -Ele deu um passo para trás.- Isso tem haver comigo?
-Porque, se ela está com dor no pé, é por conta do que aconteceu com…
-Não -interrompi.- Não é por causa de você, é que ontem eu tropecei de manhã no estábulo e estou com um pouco de dor -olhei para Páris, ele cruzou os braços.
-Ah é, mas você nem comentou nada sobre o ocorrido… -Heitor parecia confuso, assim como os meus primos.
-Ah, não valia a pena, tinha sido uma coisa pequena.
-AH FOI SIM… -Falou Páris ironicamente, o olhei com os olhos arregalados.
-Bem, não importa, -Heitor se levantou.- vou chamar o γιατρός (giatrós/ médico) e ele dirá o que você tem.
Se o γιατρός (giatrós/ médico) vier, ele vai ver meu braço roxo, não posso deixar ele vir.
-Não! -Impedi e tossi em seguida, eles me olharam espantados.
-Por quê não, Safira? -Heitor era bem, BEM, mais alto que eu.
-Porque não, eu estou melhor, sério… -de repente, me bateu um mal estar, parecido com o que aconteceu quando eu cheguei perto de Pat a alguns dias, me sentei em uma cadeira e debrucei na mesa.
-Viu só! Você não está bem! -Páris levantou e todos foram onde eu estava.
-Vou chamar o γιατρός (giatrós/ médico) -Pat saiu correndo, ele não pode se agitar tanto.
Fiquei na cadeira mesmo até que Andrômaca chegou correndo com Pat, ela levantou minha cabeça e verificou se eu estava com febre:
-Você está com dor no pé? -Ela perguntou preocupada.
-Sim… -tossi e me debrucei novamente sobre a mesa.
-Ah, isso é coisa do livro… -ela olhou para os meninos e se voltou para mim.- Você consegue andar? -Levantei a cabeça e fui me levantando devagar, eu estava pálida, olhei ao redor e vi os olhares aflitos.
Fiquei de pé, estava com muita dor, mas aguentei. Heitor rapidamente deu apoio a mim, me senti mais leve, fomos andando até a sala de estar, me deitei em um sofá e todos se mantiveram ao meu lado. Andrômaca começou a me examinar, meu cabelo estava ficando loiro.
-Acho que devíamos chamar um γιατρός (giatrós/ médico)... -Pat tornou a repetir.
-Na... não -arrisquei falar, Páris balançou a cabeça negativamente.
-Não há necessidade, -Andrômaca falou depois de um tempo.- isso já vai passar.
-Mas por que isso aconteceu? -Pat debruçou no sofá olhando para Andrômaca.
-Ah, o clima, chuva, água. E outra… ela passou muito nervoso ontem -a olhei, será que ela sabe?- por conta de Asti -ufaaa.- Fique um pouquinho aqui Safira, -ela voltou a olhar para mim.- a gente te faz companhia, depois tomamos o πρωινό (proinó/ café da manhã) -concordei com a cabeça e fechei um pouco os olhos.
Aos poucos a dor foi passando, a febre baixou, já me sentia mais forte, estava mais corada e a disposição voltou. Abri os olhos, me sentei e deparei com Pat, que estava lendo, e Aquiles, que estava quase dormindo, sentados em um sofá a minha frente. Pat desviou os olhos do livro e se levantou rapidamente, fazendo com que Aquiles despertase.
-Calma Safira, não se levante assim tão rápido… -ele foi para mais perto de mim.
-Eu estou bem, -espreguicei, minha voz não falhou.- só estou com fome -Aquiles riu se levantando.
-É, sabíamos que você ia dizer isso -Pat se levantou e ele estendeu a mão para me ajudar a levantar.- Vamos, você vai comer e depois temos uma surpresa -ele e Pat foram andando na frente, os segui, só que mais lentamente.
-Eita, de novo essa de surpresa? Estou curiosa -eles se entreolharam e sorriram.
Chegamos na sala de jantar, todos estavam lá inclusive Asti, eu estava seguindo o plano de Briseis então, o ignorei. Segui com meus primos e notei que havia uma cadeira vazia entre Pat e Ulisses. Passei por Briseis e ela me segurou:
-Sente-se ali, não faça perguntas por enquanto -ela piscou, lhe sorri e fui, de cabeça erguida, para meu novo lugar.
Nesta manhã, Asti não me olhou, permaneceu o πρωινό (proinó/ café da manhã) inteiro de cabeça baixa, não olhava para ninguém. De vez enquanto, Andrômaca o espiava, diferente de Heitor que também o ignorou.
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𝔼𝕞 𝕞𝕖𝕦 𝕞𝕦𝕟𝕕𝕠...
Historical FictionSafira é uma garota de dezesseis anos e que tem uma rotina bastante normal. Nas suas férias de julho, em uma noite, ela resolve assistir seu filme preferido: Tróia (2004), quando algo diferente acontece e ela entra para dentro do filme. Tudo no fi...