48° Capítulo.

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Briseis e Aquiles chegaram pouco antes do δείπνο (deípno/ jantar) e, aparentemente, estavam muito bem. Pat passou o dia no quarto e isso, de certa forma, me preocupava. 
 Então pediram a Asti e a mim para ir chamar Pat no quarto, não fizemos diferente. Subimos as escadas em uma fração de segundos apostando quem chegaria primeiro, resultado: ele chegou primeiro, aff (risos). 
 Notei que a porta do quarto de meu primo estava meio aberta, conseguiámos ver pela pequena abertura que as tochas estavam acesas.
 Parece bobagem reparar nisso mas, quando se vive em um castelo que está sendo ameaçado de invasão, tudo requer a máxima atenção. 
 Asti e eu nos aproximamos sem fazer barulho e olhamos para dentro do quarto, Pat estava em pé de frente para a janela, os cabelos soltos, estava sem camisa e sem sapatos. Ele apenas encarava a janela quando se virou para o lado, pegou um pequeno punhal que estava em uma banca próxima, agarrou-o forte com as duas mãos e posicionou este contra seu peito. Não pensei duas vezes, abri a porta com certa violência, corri até ele e segurei sua mão. Ele protestou:
 -Me solte! -e me empurrou para longe dele.
 Com movimentos rápidos e involuntários ele me segurou assim que percebeu que eu iria cair deixando, assim, o punhal escapar de sua mão. 
 Sem reação, me deixei ser segurada por ele. Nós estávamos bem próximos pude, assim, olhar no fundo de seus olhos nos quais enxerguei a bondade e a culpa. Sabia, então, que tudo que ele estava fazendo não era intencional, talvez estivesse tentando fugir de algo. Ele fechou os olhos e uma lágrima escapou, então nos endireitamos e ele se sentou em uma cadeira que estava próxima. 
 Ele estava realmente muito abalado, ele apoiou os cotovelos nos joelhos e deixou as lágrimas caírem, parecia que toda a dor e a culpa iam sair de dentro dele igual àquelas lágrimas. 
 Me abaixei perto do loiro e o abracei, ele não resistiu ao abraço, pelo contrário, se acomodou em meus braços. Não me importei com as lágrimas caindo e molhando o meu vestido e nem com o que Asti  (que estava assistindo a tudo da porta) pensava. 
 -Pat, -comecei a falar ainda abraçada com ele.- por quê você ia fazer aquilo? 
 Ele levantou, limpou os olhos com as palmas das mãos e deu uma arrumadinha no cabelo o jogando para o lado. Ele não tinha o rosto de quem acabara de chorar, não estava vermelho nem inchado. 
 -Eu só atrapalho todo mundo, sempre foi assim e nunca vai mudar…
 -Não fale isso primo -o interrompi, afastei cuidadosamente uma mecha de cabelo do meu rosto. 
 -Eu falo sim, é a verdade -ele deu de ombros.- Quer ver? Se não fosse por conta de uma burrada minha, meus pais, Heitor e Aquiles não teriam morrido -ele bateu no próprio peito e continuou.- Se não fosse por culpa minha, Tróia não teria sido invadida -ele desviou o olhar do meu e as lágrimas ganharam mais força.- Se eu estivesse lá, Leia estaria viva agora e…
 -Não, -coloquei o dedo indicador sobre seus lábios o impedindo de falar.- não termine de dizer essa bobagem.
 Asti pegou o punhal do chão e o colocou sobre a mesa, em seguida se abaixou perto de mim e olhou para Pat: 
 -Pátroclo, você não tem culpa do que aconteceu, e olha que eu sou a última pessoa de quem você esperava ouvir isso, certo? -Pat concordou e ele continuou.- Eu me lembro que uma menina que eu conheci, -ele apontou para mim e piscou.- falou a seguinte frase: "Tudo tem seu tempo e sua hora para acontecer e nós não conseguimos interferir nele, então tudo, apenas, acontece quando é para acontecer, do jeitinho que é para acontecer…
 -"Tudo acontece por um motivo" -completei com uma doce nostalgia dos tempos bons.
 Asti deu um tapinha no meu ombro, se levantou e saiu, nos deixando a sós. As lágrimas de Pat cessaram, ele arrumou a postura e eu me levantei, peguei nas mãos dele e falei:
 -Não me deixe aqui sozinha, por favor -ele me olhou e concordou com a cabeça.- Vista uma camisa e desça para comer -me retirei, deixando Pat sentado na cadeira sozinho no quarto, ele precisava sentir-se um pouco confiante.
 Desci correndo as escadas e dei de cara com Bri que estava a me esperar, ela me abraçou e eu a abracei de volta. Olhei por cima de seu ombro e vi Heitor e Asti chegarem.
 -O que aconteceu? -eu me distanciei um pouco para explicar. 
 -Ele quis se matar -Bri levou as mãos a boca, surpresa.- Se nós não tivéssemos chegado a tempo, essa hora ele estaria morto -uma lágrima solitária caiu, a limpei e prossegui:- Tenho medo de ele ainda tentar fazer isso. 
 -Você conversou com ele? -Heitor se aproximou mais com os olhos preocupados. 
 -Sim, falei várias coisas mas, pelo o quê eu entendi, ele se culpa por tudo de ruim que acontece e nós sabemos que é mentira… 
 -É, -Asti parou ao lado do pai e cruzou os braços- mas será que ele sabe? -touché.
 -Pelo jeito não -respondi com certa tristeza.- Eu não sei mais o que fazer! 
 -Você fez uma coisa muito boa -Heitor pôs a mão em meu ombro.- Você impediu ele de fazer aquela maluquice e isso é ótimo -ele me sorriu.- Agora, é escolha dele seguir o que você disse ou não, se ele não seguir -ficamos sérios.- não se sinta culpada, você tentou. 
 -Obrigada gente… -disse isso me apoiando no corrimão da escada com o olhar tímido.
 -Venha, a comida está pronta -Heitor disse com um sorriso acolhedor. 
 Logo depois que nos sentamos a mesa, Pat chegou totalmente trocado e menos abalado, acho que consegui convencê-lo de não fazer aquela bobagem...
Após o δείπνο (deípno/ janta), fomos todos para a sala, Asti e eu nos sentamos no chão e reparamos quando Pat saiu para o jardim. Nós nos entreolhamos e eu senti alguém cutucando minhas costas, me virei para ver quem era, Aquiles. Ele se inclinou bem para frente deixando de prestar atenção na conversa dos "adultos" e perguntou-me:
 -O quê aconteceu com Pátroclo?
 Me virei um pouco para trás, para ele conseguir me ouvir em meio aos barulhos.
 -Ele tentou… -respirei fundo e as palavras não queriam sair.- ele tentou se matar…
 Reparei na expressão de Aquiles, vi a dúvida de quem não tinha certeza do que acabara de ouvir. 
 -Como é? -ele quase colocou a mão no meu braço bem na parte onde estava roxo, mas percebeu na hora e nem chegou a tocá-lo.
 -Ele tentou se matar -que horrível dizer isso. 
 A feição de Aquiles se enfureceu, seus olhos azuis estavam prestes a ficarem vermelhos de tanta raiva, ele se levantou rapidamente, fiz o mesmo. Todos pararam de conversar e prestaram atenção.

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