Insecure

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Liesel P.O.V

Observei aquela barriga por duas semanas e chorei por mais duas depois daquela. 

Eu queria ser mãe, mas em circunstâncias diferentes. Imaginar que aquilo que crescia dentro de mim podia ser fruto de algo que não deveria ter acontecido me deixava tremendo de pavor.

Estamos caminhando até a feira, Finn e Arthur estão comigo, eles não me deixam sozinha sequer um instante. Se eu vou ao banheiro lá estão eles do lado de fora, se vou me deitar durante a tarde lá está algum deles na entrada da casa, vigiando tudo de forma atenta. Michael diz que é somente a família que está cuidando de mim.

Paro em frente a uma barraca de frutas frescas, escolhendo as que mais me pareciam deliciosas e bonitas. Uma mão toca a romã ao mesmo tempo que eu, causando um arrepio. Fixo meu olhar naquele homem, sentindo todo o meu corpo amolecer. 

Os olhos castanhos fundos e o cabelo raspado não me deixavam dúvida de quem ele era, e eu me odiei por aquilo.

- Arthur. - minha voz sai de forma esganiçada e desconexa enquanto tateio o ar atrás de mim, na esperança de chamar a atenção dele. 

Escorrego em um pedaço do calçamento úmido, derrubando comigo parte da banca e dos alimentos. O homem se agacha e estende a palma em minha direção, a ameaça estampada no olhar perigoso que me dirigia, ele havia me reconhecido.

- Melhor tomar cuidado por onde anda, senhorita.

- Liesel! 

Seguro a mão de algum deles enquanto faço esforço para me levantar, olhando em meio às pessoas para saber se aquele homem ainda estava lá. Eu tremia como nunca antes, amedrontada igual uma presa, completamente indefesa.

- Tá tudo bem? - Arthur franze o cenho, visivelmente preocupado.

Concordo, respirando fundo. 

Talvez tivesse sido apenas a minha imaginação.

- Acho que só me assustei. 

- Com o quê? - Finn pergunta.

- Nem eu mesma sei dizer. - viro novamente o pescoço para onde ele estava minutos atrás, absorvendo aquela sensação. - Vamos pra casa, sim?

As compras foram devidamente finalizadas e todos partimos. 

Abracei meu corpo enquanto espiava pelas cortinas da sala de jantar, as crianças estavam de volta, com suas bolas e brincadeiras, mas eu só queria que ele voltasse logo, queria que aquelas coisas todas acabassem de vez.

- Lisie? 

- Estou aqui!

Poucos segundos depois Michael aparecia para dentro da sala, tirando o chapéu e segurando um embrulho de confeitaria, sorria torto.

- Trouxe pra você, achei que poderia gostar.

Pego o embrulho e o desfaço, revelando uma tortinha de frutas com glacê, parecia deliciosa.

- Obrigada. - afago sua mão, colocando-a sobre a mesa. - Mas temos que conversar.

O chapéu fica entre seus dedos, ele aperta a borda de forma nervosa, amassando-a aos poucos.

- Claro. - ele aponta para a cadeira. - Quer se sentar aqui ou...?

- Pode ser na sala de descanso? - aperto os lábios, sentindo o nervosismo querer me fazer explodir.

Vamos para lá e fechamos a porta, sentando um de frente ao outro, sinto como que meu corpo estivesse se pinicando, sem parar, e arrepios correm por minha espinha.

- Acho que está na hora.

- Hora de quê?

- Eu tomei uma decisão. - encaro o tapete que toca meus pés, roçando o dedão em um fio.

- Certo... - a apreensão em sua voz é nítida, ele parece aflito. - E qual foi?

- Não quero ter esse bebê.

Um silêncio pesado se instaura, nós nos observamos, analisando as reações um do outro, desconfortáveis demais para dizer qualquer coisa além daquilo.

- Eu apoio você, independente da sua decisão. - sua cabeça concorda em um movimento breve enquanto ele suspira. - Quero que saiba disso.

Sorrio fino, com o coração batendo como um tambor.

- Obrigada querido, de verdade. - afago sua mão e ele afaga a minha de volta, olhando para fora.

As crianças jogaram uma bola, nesse exato momento, para dentro da janela, e só então percebemos que ela estava aberta, mesmo com a brisa fria do inverno circulando.

Michael a pega, indo em direção a porta e eu o sigo, curiosa sobre o que ele faria até então. Ele a abre, dando passagem para a rua, as crianças tímidas se entreolham, temerosas pela repreensão que viria, eu mesmo toquei seu braço de forma suave, mas nada daquilo aconteceu. A bola foi rodada em suas mãos e Michael sorriu, jogando a bola para cima e a chutando levemente repetidas vezes, os garotos gritaram em comemoração e correram para perto dele, até que finalmente ele se cansou, deixando a bola cair no chão e arfando de forma exagerada. Todas elas se aglomeraram ao seu redor e tentaram tomá-la dele, de forma brincalhona, Michael se rendeu de forma exagerada e devolveu a bola, se sentando na calçada enquanto elas riam e acenavam pequenos ¨tchau's¨ para ele.

Naquela hora percebi o quanto ele queria um filho, e como eu poderia estar tirando isso dele também, era cinquenta e cinquenta.

Mal dormi aquela noite, e muito menos consegui conter a ansiosidade quando fui até a clínica sozinha, ele disse que viria, que passaria rapidamente na empresa e estaria lá antes que eu notasse, mas então o médico entrou e eu continuava ali, sozinha.

- Senhora Liesel? - ele olha uma prancheta, erguendo a sobrancelha.

- Sim, sou eu. - respondo em um fio de voz.

Depois de devidamente iniciado a primeira parte do procedimento, que era a medicação, eu vejo alguém entrar na sala. Meus olhos piscam devagar e eu me sinto sonolenta. Um rosto conhecido se aproxima do meu, fazendo com que eu mesma arregale os olhos da melhor maneira possível, empurrando o braço de forma molenga para lá e para cá.

- Olá querida, vejamos o que está tentando fazer com meu filho.

- Michael. - murmuro de forma angustiada e desajeitada.

Uma lágrima caí preguiçosa enquanto observo de canto de olho uma arma sendo destravada e apontada para o médico, que inutilmente levanta os braços. 

A última coisa que vejo é aquele sorriso maldito satisfeito para mim.

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