Again, them

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Acordo com a cabeça latejando de forma infernal.

Estou jogada em um quarto sujo e escuro, fedendo a mofo e sabe-se lá mais o que.

- Porra, não. - toco onde dói, sentindo um nó na garganta se formar. - Não caralho, porra de vida fudida de merda.

Acho que estou surtando, e nem é atoa. Eu literalmente quase fui morta há dois dias, fui vendida pelo meu pai há quase um mês, peguei primos que são metidos até o pescoço em crimes - eu suponho, pois não os vi fazer nada de errado até agora - e agora fui sequestrada por uma prostituta.

Um brutamontes entra no quarto e com ele está Sierra!

- Manda ela vestir isso ou quebra ela de porrada, você decide. - Sierra fala tudo isso olhando pra mim, que quero esganá-la.

- Eu não vou usar essa merda.

Era uma lingerie azul turquesa, aparentava ser extremamente cara e infelizmente também muito linda.

- Já sabe então Ezio. - estalando os dedos, ela se vai.

O tal Ezio se aproxima, com cara de poucos amigos.

Ele era familiar.

- Veste isso. - a mão que estendeu a lingerie era maior que minha cabeça, o que me encheu de medo.

Bastava um soco dele pra que eu fosse parar na lua, e quem sabe onde acordaria depois.

- Pode se virar, por favor? - minha voz soa baixa e trêmula.

- Não.

Respiro fundo, tentando não surtar enquanto troco de roupas na frente de um estranho. Tento fazer tudo com cuidado, me escondendo nas sombras.

- Sem gracinha, volta pra luz ou vai apanhar. - a voz dele é como um trovão.

Quando o faço, já estou vestida com a lingerie.

- Você foi pro escuro e agora vou ter que te revistar pra garantir que não tem nada aí, meu bem.

Suas mãos pesadas e nojentas passeiam de forma lenta e torturante por todo o meu corpo, apalpando-o sem dó.

- Tá tudo uma beleza hein, meu bem?

Gritar com ele só pioraria as coisas, então tudo que fiz foi derrubar algumas lágrimas em silêncio. Quando terminou de saciar sua vontade grotesca, Ezio me empurrou até uma sala onde estavam outras garotas. 

Todas levantaram o olhar em minha direção, e todos eles tinham pena estampada.

- Oi amiga, qual é seu nome? - uma garota asiática se aproxima.

Ela vestia trajes exóticos e decotados, criando um ar de fantasia ao seu redor, era linda.

- Liesel... - murmuro, sentindo as palmas das mãos se encharcando de suor.

- Não fica assim amiga, nós também passamos por isso antes. - outra garota, dessa vez negra e de cabelos extremamente cacheados e cheios de vida, se aproxima também.

- É, nenhuma de nós está aqui por que quer não.

E então eram quase todas ao meu redor. Todas elas estavam sendo solidárias, demonstrando o quanto foi difícil no começo.

- Amiga, se você for boa, eles até que são legais. - a asiática fala, suspirando. - Vai por mim, bancar a rebelde só te faz passar por isso.

Ela ergueu a saia e mostrou várias cicatrizes, fora queimada muitas e muitas vezes.

- Deschen tem razão, se a gente se rebela é cacete pra todo lado. - uma moça extremamente pálida fala, mostrando suas cicatrizes também. - E não é só você que apanha, somos todas nós juntas.

Fiquei arrepiada, ali era um antro de horrores e Michael se relacionava com alguém que compactuava com tráfico sexual de mulheres.

Deschen veio como imigrante ilegal, a promessa era de uma vida melhor do que na Coréia do Norte, lugar o qual não poderia voltar nem se quisesse, eles a matariam por ser considerada traidora da nação. Roxie, a garota negra, era dos Estados Unidos e estava estudando um semestre de intercâmbio para a conclusão do doutorado. Rachel, a garota pálida, era natural do interior da Inglaterra, passeou pela rua errada e parou aqui.

Haviam tantas delas, todas marginalizadas e esquecidas pela sociedade. Hannah, uma alemã, disse que até mesmo vendas de garotas já aconteceram. Segundo ela, houve um leilão pela internet, todas tiveram que usar roupas que os nojentos atrás dos computadores pediam, para no final uma delas ser mandada para sabe se lá Deus onde.

Foi quando Sierra mais lucrou, segundo Gal.

- Vocês nunca tentaram escapar daqui? Todas juntas? - questionei, falando em um tom próximo ao sussurro.

- Uma vez. - Roxie diz, acendendo um cigarro. - Eles mataram Jules e Macy pra nos ensinar uma lição. Primeiro torturaram elas, depois jogaram sal grosso em seus corpos e gasolina. No fim, nos levaram pra vê-las sendo queimadas vivas e jogadas no mar.

- Depois disso nós só aceitamos, vivemos um dia de cada vez. - Gal completa, seu olhar melancólico estava longe.

Fungo, me sentindo terrivelmente triste por todas elas. Quantas mulheres viviam naquelas condições subumanas? Quantas simplesmente desapareceram e nunca mais voltaram para casa? Nenhuma notícia, nenhum corpo, nada. É como se elas nunca tivessem existido e ninguém mais liga também.

Estamos tão ocupados vivendo nossas vidas perfeitas que a frieza do mundo lá fora não nos atinge mais, as coisas são o que são...

O meu pai dizia isso.

¨ Não adianta querer mudar o mundo todo Lisie, as coisas são o que são. Se eu for chorar por cada criança que morre de fome... não paro de chorar nunca mais. ¨

Pensando bem, ele sempre fora um homem cego, eu só não fazia questão de perceber. Ele e Theo eram iguais, por isso eu estou aqui.

- Mas conta pra gente amiga, como veio parar aqui? - Deschen pergunta, bebendo um pouco de algo incolor.

- Eu fui vendida pela minha família pra um criminoso. Consegui escapar e meia hora depois vim parar aqui. - franzo o cenho, tentando procurar a garota que me atraiu. - Foi você, você que me levou pro lugar onde me desacordaram.

Pisei duro até a única das garotas que não se misturou. 

Ela me dirigiu um olhar entediado enquanto passava blush nas maçãs do rosto e depois pegava um bolo gigante de dinheiro nas mãos.

- Quem é que fala com estranhos, fala sério amiga. - os olhos castanhos brilharam de maldade. - Pra alguém bonitinha como você só podia ser burra igual, né.

- Catarina!

Sierra aparece e a garota se levanta, jogando beijos para todas.

Havia uma névoa negra que as cercavam enquanto Catarina passava, esnobe e arrogante. Ela parecia acreditar que era melhor do que todas ali.

- Catarina é uma traidora, ela atrai garotas inocentes pra ganhar privilégios com a Sierra. - Roxie diz, travando o maxilar. - Foi ela quem enganou a Jules e a Gal.

- Tome muito cuidado Lisie, elas ouvem tudo que falamos aqui.

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