| A L I C E |
Não.
Isso não deveria ter funcionado comigo. Estava certa de que eu tinha sido livrada, de alguma forma, dessa insanidade toda. Pensei que tivesse sido poupada ... meu Deus do céu. E agora?
Observo meu reflexo no espelho e meus olhos, azuis e tão lindos, me encaram de volta, mas não são meus. Eu não sou assim. Por mais que o resultado tenha me surpreendido, isso foge de quem eu sou. Quero meu castanho de volta. Parece até estupidez, eu sei. Isso soa meio idiota mesmo, mas preciso disso. Preciso saber que estou no meu próprio comando. Não quero nada dele em mim.
Sem o meu poder, você não seria capaz de enxergar o que eu preciso que veja
E com um estalo, suas palavras retornam a minha mente, fazendo essa confusão se tornar um pouco mais branda. Talvez essa coisa na minha cara seja para isso. Mas que inferno esse homem quer me mostrar? O que eu preciso ver para que isso termine de vez?
Ele disse que duraria apenas poucos dias, que a fração foi pequena demais e que vai acabar tão rápido quanto começou, mas também acreditou que seu poder não tinha efeito sobre mim e veja só. Demorou mais que o esperado, mas aconteceu. Quem diabos pode confirmar que vai embora logo também? Eu sei que ele não. Estou perdida. Como posso seguir a minha rotina, como posso ficar perto dos meus pais agora, merda? Que desculpa poderia inventar para sumir por uma semana ou até mais?
É isso.
Vou perder o meu emprego, reprovar no último semestre e nem sei mais o que. A quantidade de coisas ruins que vem acontecendo na minha vida por causa do Nathaniel é incontável e a minha raiva só aumenta. Nem mesmo toda a sua beleza estranha é capaz de impedir que esse sentimento seja maior. Eu o odeio. Muito.
Passo as mãos por meus cabelo e o enrolo sobre a cabeça. Retiro toda a minha roupa e procuro por alguma outra mudança. Avalio minuciosamente cada parte do meu corpo, rezando para que não encontre mais nada diferente. Suspiro alto quando o alivio me atinge e abaixo a cabeça brevemente para respirar mais tranquila. Além da alteração na cor da minha íris, todo o resto parece exatamente igual. Graças a Deus.
Puxo um roupão pendurado na porta e passo meus braços pela abertura, amarrando fortemente na cintura. Caminho até a mesa ao lado da porta e pego meu celular. Pondero entre fazer ou não, mas acabo me rendendo, preciso saber se terei mais alguma surpresa.
— Aonde você está? — vocifera ao atender no primeiro toque.
— Não te interessa. — retruco — Só estou ligando para avisar que começou. — O silêncio na linha parece durar uma eternidade, até penso em desligar achando que caiu a ligação ou algo do tipo, mas o barulho da sua respiração indica que Nathaniel ainda está lá.
— Como você sabe? — questiona.
— Meus olhos estão iguais ao seu. — murmuro.
— Só isso? — pergunta curioso.
— Sim e nem senti nada. Seu poder deve ser fraco. Depois eu quem sou intediante. — debocho e posso imaginá-lo travando o maxilar pelo ataque ao seu ego. Isso me faz bem.
— Foi só isso? — pergunta firme, ignorando a minha provocação.
— Não. — digo séria — Nasceram chifres na minha testa e agora posso voar igual a Malévola.
— Quem? — pergunta.
— Malévola.
— Não sei o que isso quer dizer, Alice e não vou pesquisar novamente.
— Tudo bem, você está perdendo um ótimo filme.
— Ainda te acho esquisita. — reviro os olhos e estico as pernas ao deitar de costas na cama.
— O que mais pode acontecer? — indago — Preciso ficar preparada.
— Não sei.
— Como assim não sabe? — inspiro fundo e aperto a ponta do meu nariz para acalmar meus nervos — Qual o seu problema, Nathaniel? Eu tenho que saber. Não posso ficar escondida para sempre.
— Então você se escondeu de mim. — comenta e ouço o seu riso baixo e ainda mais rouco que o comum.
— Estou descansando. — argumento — É exaustivo lidar com você.
— Interessante. — sua risada aumenta e afasto do ouvido.
— Não, cansativo. — insisto.
— Precisamos começar o trabalho. — avisa.
— Não. Hoje vou dormir e ficar longe de tudo. — explico e tento deixar minha voz brava, mas ela apenas soa como um lamento.
— Alice. — meu nome rola pela sua boca e sinto como se ele estivesse aqui. Aquela sensação que já conheço bem. Viro a cabeça para os lados, procurando por ele e um peso invisível some do meu peito com a certeza de que ainda estou sozinha.
— Você estragou minha aula e depois o meu plantão. Não vai estragar a minha folga também.
— Tudo bem, querida. — diz rapidamente e fácil demais.
— Ótimo. — digo — Te ligo amanhã ou se mais alguma coisa acontecer até lá.
— Certo. Até daqui a pouco, então.
— Espera ... O que? — pergunto exasperada e me sento com um só movimento.
— Você não quis dizer aonde está ...
— E ainda não vou. — complemento confiante.
— Maravilha, adoro uma boa caçada.
— Você não ousaria. — esbravejo e antes mesmo de jogar o aparelho para longe no colchão, ouço sua despedida.
— Até já, Alice.
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Chama azul
Fantasy| SINOPSE | Aos vinte e seis anos, Alice Vieira estava feliz com o rumo que sua vida estava seguindo. Faltavam apenas alguns meses para se formar na faculdade, onde com honras, foi selecionada para uma bolsa integral em Medicina. Morava com seus pai...