| N A T H |
— Ele está morto?
— Sim. — jogo o toalha sobre o ombro e o encaro, parando na porta no banheiro — Estava aqui fora me esperando, Rafael? — indago e ele sorri.
— Talvez. — responde lentamente — Fiquei preocupado.
— Não entendi. — replico — O sangue no meu peito não era meu. — explico e suspiro. A vontade de dormir martela minha cabeça sem parar, como uma maldita ressaca. Sinto meu corpo pesado, como se o simples ato de falar fosse exaustivo. Bocejo e passo meu braço, o empurrado de leve.
— Não estava preocupado com o sangue. — murmura e segue atrás de mim — A sua cara, Nathaniel...
— Bonita como sempre. — interrompo e ouço sua risada alta.
— Você é lindo. — diz com a voz mais fina, imitando as mulheres que trazíamos para casa de madrugada. Isso parece ter acontecido em outra vida, embora não tenha sido há menos de um mês, mas Deus sabe o quanto meus últimos dias foram loucos — Mas a sua beleza não é o assunto aqui. — acrescenta mais sério dessa vez e sinto sua mão no meu cotovelo.
— Só estou como sono. — digo.
— Não.
— O que você quer, Rafael? — questiono.
— Quero saber que porcaria aconteceu lá dentro. — vocifera — Você saiu de lá como um raio. O que aquele demônio te disse?
— Comentou sobre uma profecia. — arrasto uma cadeira na cozinha e me sento.
— Qual? — pergunta curioso e me entrega uma cerveja, sentando-se na minha frente.
— Existem tantas assim? — retruco rindo e pressiono a tampa da garrafa entre os dentes para abri-la.
— Você não deveria brincar com coisas assim, cara. — seu timbre soa mais baixo e quase engasgo com a bebida, que descia pela minha garganta em grandes goles.
— Do que tem tanto medo?
— Não é medo, otário. — seguro o riso outra vez e o observo atentamente — É respeito.
— Respeito? — indago surpreso e levanto para buscar outra garrafa.
— Sim. Nem todos são como você. — diz.
— E como eu sou, então? — estico as pernas ao me ajeitar novamente e Rafael leva os dedos a têmpora. Como se minha falta de fé nesses dizeres sem nenhum fundamento, fosse o maior pecado já cometido.
— Você prefere resolver tudo com os punhos.
— Com flores posso garantir que não daria certo. — ironizo e recebo seu olhar zangado de volta.
— Esquece. — balança a mão em desagrado e volta a me olhar — Qual era a profecia?
— Sobre o guerreiro mais forte e outra coisa sobre uma dúvida e tal. — ele torce o lábio em reprovação e reviro os olhos — Sei lá, Rafael. Alguma merda desse tipo.
— Santo Deus. — inspira profundamente — Não use essas palavras para falar sobre coisas sagradas.
— Não são sagradas. — declaro confiante — É apenas um texto inventado por alguém entediado.
— Quer saber? — diz e fica em pé — Não quero mais falar sobre isso. Vou lá me livrar daquele corpo. — ele sai pisando duro e balanço a cabeça tristemente por tê-lo enganado. Não quero te envolver nisso, meu irmão.
— Ótimo. — grito e dou de ombros ao ficar sozinho.
Eu acredito na profecia. Acredito em todas elas, mas como Arcanjo, não posso demonstrar minhas fraquezas. Preciso lidar com elas eu mesmo.
Não posso arrastá-lo para esse mar de problemas. Não quero que ele veja o quanto fui fraco. O quanto fiquei vulnerável. O quanto quase desisti dessa nossa luta como uma convarde, o quanto me senti pendurado por aquela linha fina do que era o certo e do que eu queria. Por ela. Alice é a minha maldita dúvida. Isso se a profecia se referir a mim, o que não acredito muito, porque não sou o mais forte. Nem de longe seria o escolhido. Se entrar na vida dela fosse algum tipo de teste, teria fracassado miseravelmente. Por isso não sou eu. Caso contrário não teria caído na minha própria armadilha. Não teria a segurado em meus braços e a beijado ferozmente sabendo que era última noite, porque eu não queria nem fodendo que fosse. Não teria agido como uma humano tolo. Um guerreiro com um propósito tão grande e valoroso, não teria essa fraqueza. A fraqueza que me fez desviar a visão do meu reflexo no espelho, apenas para não ter a certeza que o meu coração já sabia. O que eu sabia que estaria estampando no meu rosto. Que eu queria mais, como se nada fosse suficiente o bastante.Lembro de levar meus dedos a boca e sentir seu gosto na ponta da minha língua. Lembro com perfeição da cor das suas bochechas. Rosadas e pegando fogo, arfando com a surpresa, para logo em seguida morder o lábio inferior em um convite claro e direto. E aquelas faíscas que seus olhos soltavam, que incendiavam meu corpo inteiro, enquanto implorava para não perder a memória. Eu seria condenado naquele segundo se meu coração fosse colocado em alguma balança, pois eu era somente luxúria e não poderia pensar em nada que me tirasse de perto dela naquela momento.
Não sei quanto tempo vou levar para tirá-la da cabeça e voltar a normalidade, mas sei que é preciso. A eternidade parece longa pra caralho quando se está sozinho, ainda mais quando alguém ocupa uma parte de você que nem sabia estar vazia.
Caminho até a porta quando a campainha toca e o que vejo quase faz meu coração sair diretamente pela porra da minha boca.
— Alice? — minha voz falha e a encaro surpreso.
— Nath. — ela sussurra meu nome e o aperto que sinto no peito quase me faz cair de joelhos. Como é possível que esteja aqui?
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Chama azul
Fantasy| SINOPSE | Aos vinte e seis anos, Alice Vieira estava feliz com o rumo que sua vida estava seguindo. Faltavam apenas alguns meses para se formar na faculdade, onde com honras, foi selecionada para uma bolsa integral em Medicina. Morava com seus pai...