Carta branca

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Junho/2020

Manu Gavassi

"Com o tempo, você analisa que abrir mão de algo muito importante, só se faz quando se tem um motivo maior que esse algo: seja um propósito, uma crença, um valor íntimo, uma obstinação qualquer que te oriente para essa escolha que já se sabia tão dolorosa. É um sacrifício voluntário por algo mais pleno, mais grandioso em Beleza."

-- Que puta dor de cabeça! - disse baixinho enquanto tentava levantar da cama.

Olhei em volta calmamente sentindo como o meu cérebro parecia deslocar dentro do meu crânio, parecendo brigar comigo por ter feito essa atrocidade com meu corpo.

Garrafas vazias pelo meu apartamento demonstravam claramente o meu coração cheio de Rafaella. Tomei um dos maiores porres da minha vida na esperança do álcool queimar qualquer vestígio dela do meu pensamento, mas só me frustrei. Essa mulher parecia tatuada em tudo que eu fazia e pensava.

A verdade é que eu precisava me afastar para deixar a raiva e esse ranço no peito passar, mas já sentia o gosto bem amargo de ter que sobreviver sem a sua companhia. Foram 5 meses da sua presença quase que diária e intensa na minha vida, e eu sentia saudade de tê-la em meus braços mais do que minha garganta de água nesse momento. E olha que a ressaca estava gigantesca.

Suspirei frustrada. Será que ela deve estar chateada com o que acabou acontecendo ontem? Não tem como negar que ela me surpreendeu totalmente. Jamais imaginei que ela fosse agir daquela maneira.

-- Nossa! Que cara maravilhosa! - debocha Cat ao me ver entrar na cozinha, e eu faço uma careta de dor. -- Tem remédio pra ressaca na mesa, junto com um café da manhã completo e super reforçado, cheio de coisas que você gosta, dá pra comer uma família inteira! - levantei a sobrancelha. Oi? Quanto tempo eu dormi?

-- O que te deu? - perguntei espantada. Será que substituíram minha irmã, meu Deus?

-- Em mim? Nada! - ela abriu os braços como alegando inocência. -- Acho que você deve perguntar pra sua namorada! Tem um cartão, eu juro que não li! Só vi um "pequena" no envelope e já sabia de quem era. - deu de ombros e riu.

Sua risada entrou pelos meus ouvidos e fez minha cabeça latejar, enquanto eu só permaneci parada com uma cara de quem estava entendendo zero coisas. Achei que numa hora dessas Rafa estaria no mínimo morrendo de medo pelo mico que nos obriguei a pagar ontem. Ela me mandou café da manhã?

Flashback

-- Alô? Manu? - percebi como mesmo tendo meu telefone, ela não acreditou que era eu, e sorri triste pela minha atitude do outro dia.

-- Hey, Cupido! - brinquei. -- Acho que te devo um pedido de desculpas, né? - ouvi como ela respirou um tanto aliviada e soltou uma leve risadinha.

-- Manuzinha! Tá tudo bem! Eu entendo você ter pensado que eu estava nisso, tô tão feliz por você ter ligado! - percebi a animação verdadeira na sua voz.

-- Também tô feliz por ter a oportunidade de te pedir desculpas! Eu não deveria ter te tratado daquela forma, Marcella. - suspirei. -- Desculpa? Mesmo? - ela riu.

-- Cê não teve culpa, sua boba! Eu também teria pensado o mesmo no seu lugar, e acho que teria agido bem pior que você, mas juro por tudo que é mais sagrado que não tenho nada a ver com isso! - ela respirou frustrada e eu sentei dando maior atenção ao que ela parecia precisar dizer. -- Nem tô falando com a Rafa além de assuntos do trabalho, ela contou tudo pra gente hoje de manhã. - senti meu coração doer.

Ironia do Destino [Ranu]Onde histórias criam vida. Descubra agora