Junho/2020
Manu Gavassi
"A saudade não está na distância das coisas, mas numa súbita fratura de nós, num quebrar de alma em que todas as coisas se afundam."
Nosso último dia juntas estava acabando, e eu sentia o seu corpo quente atrás do meu enquanto assistíamos um filme abraçadas, bem apertadas no seu sofá. Fechei os olhos e suspirei profundamente. Eu tentava disfarçar que estava apavorada.
Passei o dia olhando para cada canto daquele apartamento sabendo que cada um deles guardará para sempre uma parte importante da nossa história: o começo. Eu queria lembrar de cada detalhezinho para poder contar de forma apropriada quando eu pudesse. Sinceramente, eu não via a hora de poder viver esse amor com tudo o que temos direto.
Suspirei ao sentir Rafa me apertar mais contra si. Tem algo mais intenso do que os inícios de relacionamentos? Para mim, que nunca vivi realmente um amor tranquilo e saudável, os inícios sempre foram os melhores, acho que unicamente porque nunca vi a plenitude além deles. Rafa me dava esperança de que os inícios poderiam ser pequenos detalhes encantados quando comparados a toda vida que podemos viver juntas.
De repente, sinto seu choro e vejo que o casal no filme está numa espécie de despedida, reviro os olhos. Puta merda! Eu não estava prestando atenção. Remexo meu corpo no pequeno espaço, tentando virar para ela, que tenta sorrir ao ver minha cara preocupada.
Passo a mão por suas costas, tentando amenizar seu choro e beijo seu nariz. Ela sorri um pouco envergonhada.
-- Acho que não foi uma boa escolha de filme, hm? - passo meu nariz no dela, sentindo como ela funga devagarzinho. Noto como me olha intensamente e me puxa para si com seu braço livre, fazendo com que meu rosto encaixe no seu pescoço. Suspiro sentindo seu cheiro, e sinto como ela se arrepia. Sorrio. Vou sentir tanta falta disso! Deus!
A distância é complicada, mas eu tentava focar que estávamos longe exclusivamente por conta da pandemia. Não havia outro motivo - eu repetia pra mim mesma. Não havia outra dificuldade com relação à distância. Se não houvesse pandemia poderíamos estar vivendo nosso amor, ela morando aqui em Sampa ou em Goiânia, para mim daria no mesmo, eu faria de um tudo para estar com ela. Cat tinha razão em dizer que se não fosse a pandemia, não teríamos chances de esconder nosso namoro por muito tempo.
-- Mil quilômetros é distante demais, pequena! - sussurrou e eu comecei a lhe fazer cafuné, sentindo como ela me beijou de uma forma profunda. Seus lábios estavam quentes e molhados, sua língua entrou na minha boca de forma lenta, enquanto ela chupava meu lábio superior com um cuidado estrondoso. Jesus, eu posso jurar que cada pêlo do meu corpo está eriçado nesse exato momento. Eu a olhava perdida e sem fôlego.
-- Manu? Você não tá sentindo doer por eu ter que ir embora amanhã? - ela perguntou com a testa colada na minha, podia sentir a insegurança em sua voz.
Fecho os olhos forte. Minha vontade era pedir para ela não ir, ela poderia trabalhar daqui, mas seria justo com ela e com sua família? Como pedir para ela fazer isso se a gente não poderia simplesmente do nada anunciar que estávamos passando a quarentena juntas? Não teríamos uma justificativa convincente para isso. Sem contar que por lá está mais seguro, ela consegue fazer suas coisas.
-- Manu? - despertei dos pensamentos, fazendo carinho no seu rosto.
-- Claro que sim, meu bem! - disse colocando seu cabelo atrás da orelha e dando um selinho demorado nela. Ela sorriu.
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Ironia do Destino [Ranu]
Fiksi PenggemarSe dependesse do acaso, Manu e Rafa continuariam frequentando os mesmos eventos sem nunca se encontrar, mas o destino tinha outros planos.