Julho/2020
Rafa Kalimann"Só há uma força capaz de construir por toda a eternidade: o Amor."
O que vem depois do entendimento mútuo de amar e ser correspondida? Essa pergunta surge na minha cabeça enquanto a água gelada cai pelo meu corpo e eu tento conter, ao menos um pouco, do tesão e do sorriso bobo que só ela é capaz de me causar. Porque tô pensando nisso? Simples. Eu nunca vivi essa parte das relações. Já namorei, casei, separei, mas nunca antes olhei pra alguém tendo a plena consciência de que amava e era amada sem ressalva e pelo que éramos. Pacote completo, cartas na mesa. Sem jogos, sem insinuações, sem talvezes, sem traições, sem enrolação. Tudo isso é novidade pra mim! O que esperar?
Busco na memória os casais que conheço, mas não conheço intimamente nenhum casal que possa ser espelho. Tato e Dani, Marcella e Rodolfo. Eles são casais maravilhosos, eu admiro, eles se amam, casaram, têm filhos, mas não tem essa paixão, não tem essa vontade dilacerante de ficar junto, de fundir um com o outro, não tem toda essa intensidade que no início parecia vir só dela e agora irradia de todo o meu ser. O amor deles é em fogo brando, banho maria. Eu sinto todo o meu corpo queimar. O nosso amor é chama alta demais.
Eles passaram por alguns perrengues, mas nada comparado com o que parece ser a luta diária de um casal gay, e ainda por cima de famosas. Estamos fodidas. Como se já não fosse muito ter que lidar com tudo o que um casal gay normalmente já lida, tem a indústria, o público, a mídia, as equipes, os projetos, a exposição, a cobrança, a ideia de perfeição de vida que um total de zero pessoas têm.
Me sinto um tanto frustrada por não ter conhecimento de sequer um casal gay famoso mais representativo, com prospecção suficiente da sua vida a dois pra me servir de inspiração. Será que a Manu conhece algum? Lembro dos filmes, novelas, séries. Nada. Acho que sempre perdi essa parte dos romances que vejo porque nenhum parece me ajudar.
Repasso o roteiro dos meus casais preferidos. Eles se conhecem num encontro oito ou oitenta, ou sequer se dão conta que se apaixonarão ou se apaixonam logo de cara. Depois eles se percebem apaixonados e sempre surge um milhão de problemas que os fazem duvidar um do outro ou do amor que sentem ou recebem. Quase sempre tem um vilão, alguém que trabalha contra. Então, lá pelos capítulos finais, tudo começa a dar certo como não deu nos outros 90% da história, os problemas começam a ser resolvidos um atrás do outro, eles ficam juntos e logo se casam ou têm filho no capítulo final. Cadê o mundo de coisas que existem no dia a dia? Cadê o ensinamento de como construir uma relação de forma saudável?
É. Não parece que as novelas são de alguma valia pra me ajudar a entender o que vem agora. Até pra casar e ter filho não vai ser igual, basta lembrar como meus amigos gays encontram dificuldades nas coisas mais rotineiras da vida de um casal pra ter certeza que as coisas pra nós são sempre mais difíceis. Acho que talvez eu precise começar a consumir conteúdo lésbico, talvez alguns livros, séries, filmes. Onde será que encontro? Será que vai ter o que eu procuro?
Faço uma nota mental pra falar com Manu sobre isso depois, suspiro feliz sentindo os fios macios da toalha passarem por meu corpo e saio do banheiro completamente nua com um sorriso ao pensar que Manu deve estar tendo uma síncope pela minha demora. As minhas provocações a fizeram sair correndo do chuveiro aos gritos divertidos de que sequer meu corpo molhado iria removê-la da ideia de se alimentar...de comida. Dou uma meia parada ainda rindo pela lembrança e olhando ao redor do quarto, mas meu sorriso logo fecha ao não encontrá-la. Pelo jeito ela cumpriu a promessa de que se em 10 minutos eu não estivesse pronta, não iria me esperar. Faço um biquinho. Poxa.
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Ironia do Destino [Ranu]
FanficSe dependesse do acaso, Manu e Rafa continuariam frequentando os mesmos eventos sem nunca se encontrar, mas o destino tinha outros planos.