Um baú aberto

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Os dias seguintes foram os mais estranhos da vida de Snape. Jamais tivera um inquilino em sua casa, nem mesmo uma visita esporádica que não fosse Dumbledore. Era completamente difícil se acostumar com um ser que dependia de si, de sua proteção e seus cuidados, mesmo que esse ser mal falasse ou pedisse algo.

Após o primeiro dia quando demonstrou claramente quem era o dono da casa e quem dava as ordens, percebeu que o mesmo mudara completamente seu comportamento passando de um garoto mimado, irritante, arrogante e rebelde para um garoto calado e distante.

Devido a estranheza com esse novo jeito de agir que Harry demonstrava, Snape resolveu observá-lo por um tempo, deixar que ele agisse sem a sua intervenção e assim acabou descobrindo uma rotina que talvez o menino fizesse inconscientemente, mas que era peculiar. Todo dia Harry acordava bem cedo, quando o sol começava a mostrar sua luz no horizonte, arrumava seu quarto rapidamente, tomava banho e antes que Snape pudesse pensar em levantar-se de sua cama, o menino já arrumara o café da manhã, porém não se alimentava, apenas deixava suco, pão, ovos e bacon para Snape e saia para o jardim onde começava a cuidar de algumas plantas velhas e mortas. Somente após Snape terminar seu café é que ele entrava comia duas torradas com um copo de suco e limpava a cozinha voltando imediatamente para o jardim. Mal se alimentava no restante do dia e quando fazia era sozinho e em quantidades insuficientes para alguém de sua idade, ele nunca jantava nem pedia algo em especial para comer.

No começo aquela atitude não pareceu nada de importante, talvez apenas uma rebeldia pela mudança repentina de vida misturada por uma gratidão inconsciente por ter saído das garras do tio louco. Mas depois de um tempo tornara-se preocupante. Havia dias em que não escutava outra frase que não fosse "sim, senhor" sair da boca do jovem. O que no começo parecia ser uma atitude favorável ao seu convívio, tornara-se apreensivo.

Snape sabia que o vínculo de sangue que fora passado para ele só conseguiria se sustentar fortemente se o menino tivesse um bom convívio consigo, ou melhor, se algum sentimento complacente florescesse e o permitisse pelo menos pensar que ali ele estava seguro e que Snape fosse alguém que estava ali para lhe dar proteção e não simplesmente acabar com sua vida. Dumbledore lhe explicou que o vínculo seria forte no começo e depois iria começar a enfraquecer, podendo ficar fraco demais ou extinguir-se completamente deixando o menino completamente vulnerável. Por isso seria necessário que o bom convívio e até mesmo um sentimento favorável o fortalecesse.

Colocando em sua mente que a sua preocupação era única e exclusivamente pela segurança do mundo bruxo que dependia da sobrevivência do menino, abriu a porta que levava para o jardim e o viu abaixado sem camisa perto de um canteiro velho que agora estava com a terra revirada e a maioria das plantas velhas arrancadas. O sol estava queimando no céu e as costas dele suavam deixando as gotas desceram por sua pele e muitas vezes passarem por algumas cicatrizes antigas. Os olhos negros agora observavam com cuidado o que antes não havia reparado. O corpo do jovem de dezesseis anos era muito pequeno e magro para sua idade e posição de jogador de quadribol. Isso o intrigava. Quando Harry se mexia era possível ver suas costelas aparecerem por baixo de sua pele pálida.

- Potter! – Chamou Snape com a testa franzida.

Harry assustou-se e olhou para trás rapidamente vendo Snape parado atrás de si vestido com uma calça negra e uma camisa branca olhando-o atentamente e até mesmo o assustando com seu olhar inquisidor.

- Limpe sua mão e me encontre na sala.

Dizendo isso entrou na casa deixando Harry sem saber o motivo daquele tom irritado e urgente. Pelo que se lembrava não havia feito nada para desgosto do professor. Seguira sempre com sua rotina ficando o máximo que conseguia longe do homem e tentando ao máximo não lhe causar algum tipo de aborrecimento. Havia dias em que nem ao menos o via. Obedecendo a ordem dada, entrou na casa e lavou as mãos, colocou a camiseta e foi para a sala encontrando Snape sentado na poltrona velha com as pernas cruzadas e a mão fechada apoiando o queixo travado. Seus olhos eram frios e raivosos, sua testa estava franzida mostrando uma linha de ruga em sua têmpora que pulsava fortemente. O corpo de Harry tremeu ante aquela visão.

Traiçoeiros Sentimentos (Severitus)Onde histórias criam vida. Descubra agora