ponto fraco

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Marcela era, em geral, uma pessoa muito estável. Conseguia lidar com os próprios sentimentos com tranquilidade. Não podia negar que a terapia era uma das grandes responsáveis por sua saúde mental estar bem, porém não poderia tirar o mérito de sua criação. Não teve pais controladores ou muitas encrencas na infância, foi uma adolescente consciente porém sem deixar de aproveitar a juventude, então não desenvolveu nenhum trauma ou problema muito profundo. Viveu uma vida privilegiada, de fato. Naquele dia, porém, tudo parecia estar desmoronando.

A loira estava envolvida em um relacionamento aberto há mais de três anos, e tudo sempre havia dado muito certo, não havia do que reclamar. Ela e sua namorada moravam juntas há aproximadamente um ano. Sua namorada, Bianca Andrade, era extremamente carinhosa e sempre havia a tratado mais do que bem. Embora se envolvessem com pessoas de fora, ambas sabiam que se amavam e nada mudaria isso. Até que algo mudou. Ou melhor, alguém.

Naquele almoço a psicóloga e sua namorada haviam combinado de almoçar juntas e assim fizeram. Se encontraram num restaurante próximo ao trabalho de Bianca, um lugar que elas iam quando os dois horários permitiam, e pediram o que costumavam pedir. Ao chegar no local a loira percebeu uma postura estranha da parte da morena, mas achou que era apenas achismo. Infelizmente, não era.

— Mar? — A maquiadora chamou, catando a atenção da loira pra si.

Os pedidos já haviam chegado e Marcela já havia comido metade de sua refeição, porém a morena mal havia encostado em seu prato.

— Oi, vida? — Marcela perguntou olhando pra mulher a sua frente.

— A gente precisa conversar. — Bianca disse cruzando as mãos sobre a mesa e abaixando a cabeça, gesto e palavras que fizeram a loira sentir seu corpo inteiro gelar.

— Ahn... Claro!

Marcela abaixou os talheres e limpou os cantos da boca com um guardanapo. A morena permaneceu imóvel, tamborilando o pé no chão de nervosismo. A psicóloga colocou ambas as mãos sobre as da maquiadora, lhe passando apoio e confiança para falar o que ela queria.

— Você sabe que eu não sou boa com palavras, então eu vou direto ao ponto. — A loira acenou que sim com a cabeça. — Eu acho que a gente devia terminar. — Marcela arregalou os olhos ao ouvir aquelas palavras saírem da boca de Bianca. — Acho não, tenho certeza.

— P-por que?!

— Acho que você prefere não saber...

— Eu mereço saber o porquê, Bianca. — A psicóloga a cortou, usando uma voz fria. — Tenho que saber se eu posso fazer algo pra consertar. Quem sabe a gente só dá um tempo ou...

— Eu tô afim de outra pessoa. — A morena falou baixinho.

Nesse momento a psicóloga sentiu sua cabeça girar, e por um instante ela achou que fosse botar pra fora toda sua refeição.

Não pode ser.

— O que? — Marcela perguntou, torcendo pra ter ouvido errado.

— Eu tô gostando de outra pessoa. — A maquiadora falou mais alto e abaixou a cabeça novamente.

Marcela retirou suas mãos das mãos da morena lentamente, assimilando as palavras. Seu peito se apertou, fazendo o ar lhe faltar e as lágrimas quererem surgir em seus olhos quase que instantaneamente. Um gosto amargo tomou conta de sua boca, e a descrição pode parecer exagerada, mas estou até me utilizando de eufemismos. Se a loira fosse descrever ela mesma como se sentiu, as palavras seriam mil vezes mais doloridas.

Para Marcela, Bianca foi a primeira pessoa que realmente a amou de verdade. Elas estavam juntas desde o início da vida adulta, então haviam aprendido muito juntas, vivido muito juntas, amado muito juntas. Imaginar a vida a partir dali sem a maquiadora era assustador, e beirava o impossível. Além de sua namorada, Bia era sua melhor amiga.

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