não vai esquecer

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A morena estava, mais uma vez, sentada em uma das confortáveis cadeiras da recepção da clínica. Como de costume, ela era a única pessoa ali, já que seu horário era o último antes do almoço. A contadora não se incomodava com a falta de companhia, até porque era um dos poucos momentos em sua semana inteira em que ela conseguia desfrutar do som do silêncio. Marcela estava mesmo certa, afinal. O silêncio era um dos deleites da vida adulta, um tesouro, um prazer.

Prazer... No fundo, o ser humano está sempre buscando por prazeres, independente do tipo ou natureza deles. Os prazeres guiam o querer, e os quereres guiam o ser humano. Somos, no fim das contas, seres reféns dos nossos próprios desejos. Dos nossos próprios anseios e emoções. É fato que somos livres pra fazer o que queremos, mas estamos longe de sermos livres pra querer o que queremos.

E a liberdade da contadora se via cada vez mais restrita, já que a maioria de seus quereres no momento eram relacionados a pessoa que estava dentro da pequena sala a sua frente. Quereres, sem dúvida, pautados na busca por prazer. A morena, mais que tudo, desejava a psicóloga. Desejava repetir o beijo da semana anterior, desejava ir mais longe, desejava sentir novamente a adrenalina de fazer algo errado. Mas, nossas ações não são controladas apenas pelos desejos. Como já citei, também somos reféns de nossas emoções. E as emoções da contadora estavam longe de ser amigáveis com a loira.

Na verdade, Gizelly estava mais do que irritada com a psicóloga. As atitudes controversas da mulher lhe deixavam chateada, confusa, e acima de tudo irada. E, infelizmente, a ira sempre acabava assumindo o controle da contadora em situações não convencionais. Por isso as brigas e a intriga sem fim. O beijo havia sido uma válvula de escape, um surto de coragem, o desejo assumindo o comando por uma pequena fração de tempo. Porém não passou disso, uma exceção. Pelo menos foi isso que a contadora decidiu adotar como verdade. A morena não queria assumir a si mesma que havia baixado a guarda e dado com a cara na parede logo em seguida.

Marcela havia se aberto, mas deu para trás em seguida, e a morena não queria ser vista como uma idiota. E foi por isso que a morena decidiu se fazer de desentendida. Preferia fingir que nada aconteceu do que tirar satisfação e sair com mais uma chateação pra conta.

Não deveria ter reclamado dos sonhos, pelo menos lá essa filha da puta sabia o que queria.

A porta então se abre e um homem deixa o consultório. O jovem cumprimenta a contadora com um leve aceno de cabeça, recebendo um leve sorriso da morena como resposta. Eles já havia se trombado antes, mas não podiam se chamar de conhecidos. Gizelly então se levanta e anda até a porta, respirando fundo e a abrindo para entrar no consultório.

— Boa tarde, Marcela.

— Boa tarde, Gi. — A loira fala retirando os óculos e os guardando na gaveta.

— Tudo bem? — A morena pergunta, agindo como se nada tivesse acontecido.

— Tudo sim, e contigo?

— Tudo nós conformes.

— Certo... — A loira fala e limpa a garganta, claramente nervosa. — Quer falar de algo em específico?

— Não.

— Ok. — A loira fala e então passa um tempo em silêncio, respirando fundo. — Você quer falar sobre semana passada?

— Sobre o que? — A morena se faz de desentendida.

— Você vai fingir que nada aconteceu?

— Se isso me poupar de fazer mais papel de trouxa, sim. — A contadora fala seca.

— Papel de trouxa? — Marcela ergue uma das sobrancelhas. — Tá, enfim, você quer falar ou não?

— Querer eu não quero, mas você está me deixando sem escolha. — A morena fala suspirando. — Ok, eu te beijei, e daí?

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