64. Remexendo em coisas enterradas

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Olhei pra ela sorrindo e me virei em sua direção. Peguei sua mão e sorri pra ela. 

- O que você acha de ficar aqui com elas e eu ir primeiro?

- Por que?

- Não podemos deixar elas. Eu falo pra eles que vocês estão aqui e depois venho buscar.

- Tudo bem.

Ela sorriu nervosa e eu lhe puxei pra um beijo, depois saí do carro com as mãos suadas já. Tinha parado o carro do outro lado da rua, então atravessei e respirei fundo antes de tocar a campainha. Fiquei inquieto e percebi Natália me olhar, mesmo através dos vidros escuros, mandei um beijo pra ela e depois me virei, assustado com a porta abrindo.

- Quem é? - Um homem, muito parecido com Natália, apareceu. 

- O senhor é o seu Jonas?

Perguntei estendendo a minha mão pela grade, mas a medida que ele se aproximava, me reconheceu e parou bem próximo, mas não me deu a mão, então recuei. 

- O que você quer aqui?

- Eu vim pela Natália. - Disse percebendo que não ia ser fácil. - Sua filha. 

- Eu não tenho filha! - Ele me olhou com desprezo e eu estremeci. 

- O senhor sabe do que estou falando. 

- Eu não sei. - Fiquei nervoso e minha vontade era virar as costas e levar elas embora, mas eu insisti, pela Natália. 

- Que seja! Sua filha quer ver o senhor. - Falei tentando manter a calma. - Não sei se sabe, mas nós tivemos duas meninas há dois meses. - Ele não respondeu, mas desfez a cara amarrada e ficou me olhando. - Nós nos casamos há alguns meses, pela segunda vez, e Natália me pediu pra trazer ela aqui. Ela sente falta da família. 

- Ela perdeu a família quando traiu minha confiança. - Ele falou sério. 

- Natália é uma mulher incrível, não devia pensar assim dela. Ela errou, nós erramos, mas assumimos isso e construímos uma família. Ela perdeu o menino que estava esperando quando o senhor colocou ela pra fora de casa, passamos por muitas coisas, mas ela nunca esqueceu de vocês.

- Pois então, se ama ela como diz, mande ela esquecer. - Ele me deu as costas e me desesperei.

- O senhor não pode fazer isso! - Falei alto. - Elas estão no carro, Natália e nossas meninas. Por favor!

Ele parou e assim ficou por alguns instantes. Quando se virou, soltei a respiração, achando que tinha conseguido. 

- Eu não quero ver elas, e quero que vá embora.

Fiquei extremamente decepcionado. 

- Tudo bem, mas me deixar falar com a mãe dela. Ela pode querer conhecer e...

- Ela não quer.

- Quero ouvir isso dela.

Ele entrou batendo os pés e logo uma mulher baixa, como Natália, mas bonita como a filha, apareceu, assustada. Veio até mim, sob os gritos do marido, pra ela me dizer que não queria ver elas. Vi em seus olhos que não queria que nada fosse assim, mas que o tempo tinha passado e tudo tinha se perdido nela.

- Como ela está?

- Está no carro. Posso chamar ela? - Sorri. 

- Não, querido. - Pude jurar que vi lágrimas em seus olhos. - É melhor que leve elas embora.

- Suas netas... - Disse inconformado com a situação.

- O tempo passou muito, eu amo minha filha, perdôo ela, mas não dá mais pra nós. 

- Ainda dá tempo, as meninas acabaram de nascer. 

- Não, não fique remexendo em coisas enterradas. Eu sei que ela está bem com você, cuide delas, diga a Natália que eu a amo e perdôo, mas não consigo. Diga que quero que ela seja feliz, e o melhor que tem a fazer é voltar pro carro e seguir com a vida de vocês.

- Não entendo! 

- Não entenda, só respeite. Quero que sejam muito felizes. 

Ela passou a mão pelo meu rosto e depois se virou. O marido passou a mão por suas costas e eles entraram como se nada estivesse acontecendo. Com raiva, chutei a parede e respirei fundo. Mas eu sabia que o melhor agora era realmente ir embora. Não sabia o que falar pra Natália, mas assim que entrei no carro, vi que chorava. 

- Amor... - Estendi meu braço pra ela, mas ela pegou minha mão, deu um beijo.

- Só quero ir embora, por favor. - Assenti e liguei o carro, me preparando pra sair dali o mais rápido possível. E com a cabeça a mil, foi isso que eu fiz. 

Fica (Luan Santana)Onde histórias criam vida. Descubra agora