02 de julho de 2015.
Estava enrolado num lençol quando escutei meu celular tremer pela milésima vez.
- Natália... - Gargalhei baixo. - Eu não estou nem aí pra você.
Uma ruiva dormia ao meu lado e eu ainda estava anestesiado pelo prazer. E eu não deixaria Natália atrapalhar minha calma aquela hora no telefone.
Mas o celular tremeu de novo, e de novo. E meio irritado peguei. A ligação caiu e alí pude ver. Eram quase 06h00 e havia 50 ligações da casa dos meus pais e mais 20 de Natália. Na mesma hora fiquei muito irritado. Não era possível ela colocar minha mãe pra ligar atrás de mim. Mas o telefone tocou de novo e eu resolvi atender.
- Oi, mãe.
- Luan, pelo amor de Deus! - Ela chorava e eu me assustei. - Onde você está?
- Eu tô... - Não consegui pensar meio assustado. - Mãe, está me assustando, o que foi?
- A Natália, filho! Vem pro hospital agora. - Ouvi meu pai dizer pra passar pra ele, mas não esperei e desliguei.
Natália no hospital e eu alí. Era só o que me faltava. Fiquei preocupado com meu filho e me senti muito mal por ter escutado o telefone e não atender por causa que estava fazendo algo muito melhor, pelo menos foi o que pensei. Acordei a mulher e mandei ela se trocar enquanto tomava banho. Meu cheiro me denunciava e eu não poderia ir assim. Tomei o banho mais rápido da minha vida e quando saí, ela já estava trocada.
- Tem um ponto de táxi aqui do lado. Eu vou te deixar lá. - Me troquei com pressa.
- Tudo bem, gatinho, mas me dá seu telefone.
- Olha, não vai dar, mesmo. - Coloquei minha camiseta. - Minha esposa está no hospital, eu nem devia estar aqui. Me dá o seu que eu te ligo.
- Mas eu pensei que... - Falava com ela enquanto pegava minhas coisas.
- Eu adorei, sério. Mas agora eu tenho que ir mesmo.
Levei ela pro táxi e assim que virei a esquina, joguei o papel pela janela. Dirigia rápido e nervoso, e logo cheguei no hospital. Perguntei por Natália e me levaram a uma sala de espera. Encontrei meus pais chorando abraçados.
- Luan! - Minha mãe correu e me abraçou.
- O que foi? - Assustei pela reação dela.
- Luan, a Natália...
- O que houve com ela? - Quase gritei.
- Ela passou mal! - Meu pai disse. - Perdeu muito sangue... Tiveram que fazer uma cesária.
- Ele só tem seis meses, pai! - Gritava.
- Luan, o médico disse que não foi tão grave...
- Então está tudo bem!
- Espera! - Ele segurou sentando no sofá. - Eles teriam ficado bem, mas o socorro demorou... Você não estava em casa e... Acho que ela tentou te procurar, ligar, demorou muito, Luan.
- Mas vai ficar tudo bem, não vai? - Chorava em pânico. Eu só consegui pensar no telefone tocando.
- Ele nasceu, fraco. Ele estava com os batimentos bem fracos, filho... - Tapei meus ouvidos e chorei mais. - Fazem duas horas que ele nasceu, mas morreu a quase uma hora.
Meus olhos se arregalaram e meu chão parecia ter sumido. Mas minhas lágrimas secaram. Eu não conseguia nem respirar. Naquele momento senti tudo que meu pai dizia. Todas as preocupações e os cuidados e entendi o porquê brigaram tanto e pediam pra tomar tanto cuidado. Eu senti o que era ser pai alí, sem nem mais ser um, sem nunca ter pegado ao colo meu menino.
Falta de socorro.
Era por isso que ele havia morrido.
Falta de socorro.
Essas palavras gritavam na minha cabeça e eu perdi os sentidos.
16 de janeiro de 2018.
Ainda olhava ela dormir com lágrimas nos olhos. A dor daquela perda preenche meu coração. Só Deus sabe o que passei depois daquele dia, por meses a fio. E me isolei na minha própria dor, esquecendo a de Natália. Meu mundo desandou ainda mais depois disso, como se já não tivesse desandado por conta da mudança repentina, da gravidez e do casamento. Afinal, decidi casar por me sentir culpado pela vida da garota ter sumido aos seus pés. Era a coisa certa a fazer e eu fiz, mas não estava preparado pra tudo aquilo junto. As responsabilidades subiram em cima de mim e me afogaram nos meus sentimentos. Fiquei preso alí, e por isso, andava, andava e não conseguia sair daquele labirinto, não conseguia aceitar Natália na minha vida. Com ela veio a vida botando tudo de cabeça pra baixo, com ela veio a dor da perda. Não conseguia me perdoar por não ter socorrido ela. Não conseguia me desculpar nunca por ter quebrado minha promessa de cuidar deles, da pior maneira possível: na cama com outra.
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Fica (Luan Santana)
Fiksi Penggemar(CONCLUÍDA) Uma história de anos marcada de um lado pela falta de amor, e de outro pelo excesso dele. Natália e Luan são casados, mas a moça, apesar de amá-lo incondicionalmente, não recebe um tratamento a altura. Uma história marcada por marcas do...