UM

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  - Sei que não gosta...

- ...mas são as minhas obrigações - completei, sem deixar que Nyalia terminasse de falar.

Não fora muito educado de minha parte, realmente, mas ela era a única pessoa do Palácio com quem eu não precisava me preocupar com etiqueta.

- Se fosse por mim, você andaria com seus cabelos soltos - confessou. - Sabe disso.

Sim, eu sabia. Suas mãos eram suaves em meus fios dourados, os puxando para trás prestes a fazer um coque. Me dava dor de cabeça, sempre. Mas o costume mandava que as mulheres de nossa corte andassem com os cabelos devidamente presos.

- Ai! - guinchei, quando ela puxou forte demais.

Nya sorriu e se desculpou. Observei os fios lisos e brilhantes passarem pelo pente através do espelho. Agradecia com tudo de mim o tanto de cuidado que Nya tinha comigo. Encarregada de mim desde pequena, ela foi como uma mãe.

Prendeu meu cabelo em tranças e depois usou os grampos para colá-las ao couro cabeludo. Aquela era a pior parte. Malditos grampos. Em seguida, Nya abriu o armário próximo a penteadeira e me encarou. Analisei as coroas, todas pratas. Algumas continham variados tipos de jóias - meu pai gostava de me presentear -, mas todas sempre eram pratas.

Escolhi uma com diamantes e Nya a colocou em mim, sem precisar usar mais grampos, já que depois de anos de treinamento desde criança, eu conseguira a postura correta para manter a coroa no lugar. Então foi a vez dos saltos.

Com o vestido rosa claro revestido por tule e brilho, optei por um salto do mesmo estilo. Apertava os meus pés, mas fazia parte de ser um membro da realeza.

- Está linda!

Ela sempre dizia a mesma coisa quando terminava de me arrumar. Sorri, grata, e atravessei o quarto que deveria ser grande demais para uma só pessoa. Me olhei no espelho e fiquei satisfeita.

Juntei as mãos na frente da barriga e me virei lentamente para Nya.

- Você é incrível!

- Vá, seu pai te espera para o almoço, criança.

Assenti e respirei fundo antes de sair do quarto. Com a maçaneta da porta nas mãos, verifiquei tudo. Postura, mãos, queixo e até mesmo a velocidade de minha respiração. Com tudo em ordem, fui até meu pai no salão de jantar.

Passara vinte e um anos da minha vida naquele castelo e nunca me deixava de encantar com o quanto tudo era lindo. Todo trabalhado em tons diferentes de rosa. Os corredores enormes, com diferentes flores em diferentes vasos. Sempre havia coisas novas, nunca ficava entediante. Quis parar e estudar cada uma das plantas novas, mas sabia que meu pai me esperava. Poderia fazê-lo outra hora.

Continuei atravessando, achava engraçado o fato de quase nunca esbarrar com os empregados. Quando mais nova aquele fato me chateava, seria bom ter alguém para conversar, mas depois da adolescência eu consegui compreender. As normas diziam que os empregados não deveriam interagir com os membros da realeza. Particularmente, achava uma bobeira, mas ainda não era eu quem ditava as regras. E nunca seria, na verdade. Meu pai andava louco à procura de um marido para mim e, caso me casasse, o reino pertenceria a meu marido e não a mim.

O meu reino.

Com duas batidas na grande porta, esperei a autorização do rei e adentrei o salão. Meu pai esperava à cabeceira da mesa. Vestindo-se como mandava o figurino, blusa, terno, ombreiras, abotoaduras... E a coroa dourada que reluzia em sua cabeça.

- Por que demorou tanto? - questionou, quando me sentei ao seu lado esquerdo.

Pus o pano em meu colo. Pela visão periférica, vi um dos criados se aproximando para me servir. Embora meu pai já houvesse me explicado muitas e muitas vezes, eu ainda não conseguia ver sentido naquilo. Tínhamos mãos saudáveis, graças aos deuses, então por que não podíamos servir a nós mesmos?

O Diadema Da Coroa [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora