QUATORZE

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  No dia seguinte me acordaram ao alvorecer. O sol ainda despontava no horizonte. A escuridão sendo preenchida, o momento exato em que luz e trevas se encontravam. Quando terminei de me banhar, o breu já fora completamente extinguido.

- Separamos um vestido de viagem para que fique mais confortável - Mortri avisou-me, me mostrando o vestido marrom opaco e simples.

Estranhei a cor apagada e neutra. Clarence dissera que tínhamos que chegar demonstrando autoridade e eu iria chegar vestida daquela forma? O vestido era típico de uma camponesa bem desafortunada. Não era feio, era só simples. Contrastava com a ideia de me mostrar potente.

- O rei preferiu que usasse peças neutras na viagem para que não seja reconhecida e, possivelmente, atacada.

- Não vamos viajar com guarda?

- Sim, claro - Aphil tomou a frente -, só é mais seguro, alteza.

- Se é desta forma, tudo bem.

Não foi difícil o vestir. Não tinha laços nem truques aos quais estávamos acostumadas a ver em vestidos mais trabalhados. As mangas cobriam até meu pulso, colada em meu braço quase como uma camisa de força. Prederam meu cabelo em um rabo de cavalo alto, por pedido meu. Apenas para ficar mais confortável na carruagem. As jóias e tiaras que Raence havia separado para mim estavam todas dentro de uma caixa, que já tinha sido levada, assim como meus vestidos novos, para o bagageiro.

Duas leves batidas na porta anunciaram o recém-chegado. O criado entrou após uma palavra de permissão e fez uma pequena reverência antes de me informar que as carruagens apenas me esperavam. As moças desceram comigo, me acompanharam até a porta do palácio e de lá segui sozinha até a estrada. Raence, que estava parado em frente à porta, soltou um sorriso zombeteiro ao me olhar dos pés a cabeça.

- Devo dizer que seu gosto para moda é impecável, majestade. - comentei, levando um pé minimamente para trás em uma mesura.

- Certamente que sim - ele respondeu, meneando a cabeça.

O rei estendeu sua mão para mim, com a outra bem escondida em suas costas. Aceitei o gesto de gentileza. Sua mão não era macia como geralmente eram as de membros da realeza, mas talvez fosse o calor, ou o toque suave que contrastava com seu jeito bruto, mas alguma coisa me fizera estremecer. Me fizera acender. Me perguntei se, pela forma como me olhava, ele também havia sentido. Antes que eu pudesse pensar muito, uma rajada forte de vento me estapeou e eu acordei. Não declinei sua ajuda para subir na carruagem, mas, quando dentro, logo soltei sua mão. Encarei meus próprios dedos, um pouco intimidada com o momento estranho. Percebi, pela visão periférica os poucos segundos - que para mim foram como uma eternidade - que Raence continuou parado na mesma posição em que o deixara. Como se ainda sentisse minha mão na sua.

- Vamos! - ele gritou, dando um tapa na lateral do veículo antes de entrar.

O cocheiro atiçou o cavalo e arrancou. Nossos corpos deram um pequeno solavanco com a partida e começaram a balançar conforme as rodas passavam sobre as pedras. Havia uma outra carruagem à nossa frente e mais uma atrás, além dos soldados que nos cercavam à cavalo. Na que eu me encontrava, apenas Raence me fazia companhia.

- Onde estão Clarence e o senhor Jerich? - perguntei, sem o encarar.

- Clare está logo atrás de nós e Jerich à frente com as bagagens.

- Não seria mais prudente que eu viajasse com outra moça?

Ele virou-se para mim, como se pudesse projetar algum pensamento para minha mente, me fazer acreditar no que ele quisesse que eu acreditasse. O rosto inalterado, inalcançável. O maxilar definido trincado. Imaginei que ele realmente pudesse convencer qualquer pessoa apenas pela forma que se portava. Intimidante.

O Diadema Da Coroa [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora