DEZ

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  Tinha algo em cima de mim, de meu estômago para ser mais específica. Não era muito pesado, mas o suficiente para que eu sentisse. Me forcei a abrir os olhos. O céu estava claro, me fazendo questionar se eu tinha dormido pouco ou por um dia inteiro. Não pensei muito sobre o assunto ao ver as penas brancas da coruja que estava pousada em minha barriga, me encarando fixamente. Perdi o ar. Não sabia dizer exatamente sua espécie, mas era grande e majestosa. Os olhos claros não desviaram dos meus quando suas garras agarraram o tecido de meu vestido e ela levantou voo.

O animal era mais forte do que eu cheguei a pensar e tive que me levantar perante seu impulso. Quando me pus de pé, ela me largou e continuou no ar à minha frente. Estranhei ao não ver o corpo da onça que tinha matado e o galho que usei. Ainda estava sozinha ali, não havia nenhum animal à vista, exceto a coruja. Que de repente começou a voar para longe, parando vez ou outra para olhar para trás. Para mim.

Talvez estivesse ficando maluca, mas senti que deveria segui-la e o fiz. De qualquer forma já estava perdida, não poderia ficar pior. Ela subiu um pouco mais, voando devagar de forma que eu consegui acompanhá-la sem precisar correr. Fiquei um bom tempo a seguindo, imaginando até onde aquilo me levaria. A vi parar mais a frente e acelerei o passo para ver o motivo. A coruja pousou em meu ombro e foi quando eu vi.

O final da floresta, civilização. E bem mais ao fundo, por ser muito grande, era possível ver o castelo. Uma onda fria de alívio percorreu todo o meu corpo e o ar que respirei pareceu muito mais leve, descobri que não conseguia respirar direito apenas naquele momento, quando consegui. Senti o ar límpido preenchendo meus pulmões, exalava e era como se toda a tensão saísse junto.

O pescoço da coruja se virou a noventa graus e ela me encarou, devolvi o olhar e inclinei a cabeça em sua direção. De alguma forma, não me surpreendi quando ela fez o mesmo e encostou a sua em minha testa.

- Obrigada - agradeci em voz baixa. - Muito obrigada!

Suas asas enormes se abriram e ela levantou voo, voltando para dentro da floresta. A partir dali eu estava sozinha de novo. Fechei a capa sobre o vestido para esconder o sangue e andei em direção a cidade. As ruas eram da mesma pedra que a estrada pela qual eu andara por bastante tempo, mas ao contrário de lá, todas eram muito movimentadas. Ouvi risadas altas, pessoas se abraçando, apenas andando pela pequena feira de braços dados... Sorrisos, eu vi sorrisos. O tipo de sorriso que eu esperava ver no meu reino e que não vi.

Uma melodia animada tocava baixo, ficando mais alta a cada passo que eu dava. Quando finalmente encontrei a fonte, cheguei a me emocionar com o que vi. Uma banda tocava no meio de uma praça e havia pessoas, muitas pessoas dançando ao redor. Em pares, sozinhas... Quis ficar ali para sempre, sentir aquela energia para sempre. Quis sentir a alegria que eles sentiam.

Um dia eu sentiria, prometi a mim mesma. Iria arrumar meu reino, torná-lo tudo aquilo que sempre acreditei que era. Iria ser a rainha que tinha nascido para ser e não sabia. Naquele momento tinha que ir embora, achar o castelo de uma vez para poder começar a me organizar. Com o coração pesando, me afastei da música e segui em direção à colina onde o palácio estava bem visível. Pelo caminho fui percebendo o quanto o povo de Raence destoava de sua postura. Todos falantes e felizes enquanto ele era sério e um assassino a sangue frio.

Um assassino ao qual eu pediria ajuda.

Chegar até os portões foi fácil, tão fácil que quando o guarda todo vestido de azul marinho me parou, não estranhei. Algo tinha que dificultar. Talvez eu fosse a maior das tontas por não ter pensado em levar a carta que Raence havia me deixado.

- Eu sou uma convidada do rei! - argumentei.

- Não posso deixá-la entrar sem nenhuma prova, senhorita.

O Diadema Da Coroa [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora