TRINTA E SEIS

563 57 5
                                    

  - Eu odeio esses túneis, verdadeiramente - praguejei.

Raence apenas suspirou em resposta, os dedos firmemente agarrados ao meu pulso, me guiando pelo caminho enquanto sua outra mão carregava a tocha que nos protegia da escuridão absoluta.

- São práticos, apesar de tudo.

- Práticos? Claro, práticos para alguém se perder.

- Quem não conhece, não se arriscaria a andar por eles. Portanto, ninguém se perde.

Não fui capaz de conter o gesto mal educado de revirar os olhos. Pelo menos tinha a certeza de que ele não veria.

- Eu não acho nada prático - declarei, por fim.

Raence parou de repente, seu braço fez uma barreira à minha frente, me impedindo de continuar a andar também. Então, ele levou um dedo aos lábios, pedindo silêncio. Um feixe de luz já chegava até nós, imaginei que estivéssemos próximos.

Ele avançou, a passos calmos e quietos. O segui até a brecha nas rochas, quase uma varanda com vista para a praia. A praia... O cheiro da água salgada me deixou inebriada, ainda com o tempo fechado era uma vista linda. A areia amarelada e o mar azul, as ondas fortes e seguras que batiam impiedosamente nos cascos dos navios que ali estavam parados. Muitos e muitos deles, por toda a costa abaixo de nós, erguendo orgulhosamente a bandeira preta e o crânio que simbolizava Winslov. Apertei os dedos de Raence, animada com algo que eu nunca tinha visto antes. O mar cobria tudo até o horizonte. Era majestoso.

- Ali - apontou.

Segui a direção de seu dedo e foi impossível não arregalar os olhos. Um forte, ou seja lá como eles chamavam, tinha sido construído na beira da praia. Os grandes portões pretos se abriram e diversos soldados saíram, marchando em sintonia pela areia até entrar em um dos navios.

- Este vai sair para interceptar a carga de madeira de Valicent - Raence explicou.

Então, Clare havia conseguido.

Observei atentamente eles tomarem seus postos. Mexendo habilmente em todos os equipamentos. Era o maior navio que eu conseguia ver, pois havia alguns mais distantes que era difícil comparar. As armas eram enormes, os canhões nas laterais pareciam mortais, certeiros.

- Meu pai vai ficar uma fera - sussurrei, quando o navio partiu.

Em contraste com o meu tom, meu coração palpitava de animação. Ele não era tão absoluto afinal.

- Vai, sim.

Me virei em sua direção, sentindo a empolgação corrompendo-me.

- Onde iremos treinar?

Ele sorriu e deu meia volta, me guiando novamente por aqueles túneis escuros e assustadores até um lugar mais apropriado para treinarmos.

(..)

- Senhor - um criado chamou, quando adentramos o palácio novamente. -, isso chegou para a princesa.

Peguei a carta que ele estendia, ignorando a parte em que ele se dirigiu a Raence e não a mim, apesar de eu ser o destinatário e o criado logo se retirou. O rei se colocou atrás de mim, tão interessado quanto eu no conteúdo. Nós dois estávamos suados e cansados pelo treino, mas a excitação logo cresceu em mim de novo, aumentando a cada pedaço de papel rasgado. O selo de coração fez meu sangue gelar. Era uma carta de meu pai.

Senti as mãos de Raence em meus ombros, apertando suavemente, tirando a tensão que me fez travar. Quebrei o selo, a respiração entalada na minha garganta. Abri a folha, exibindo a caligrafia perfeita do meu pai.

O Diadema Da Coroa [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora