VINTE E TRÊS

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  Minha mão estava enroscada na gola de seu sobretudo, o puxando cada vez mais para mim. Também não tinha planejado aquele ato, mas naquela altura tudo estava fora de controle. Era engraçado como eu conseguia saber que ele queria me soltar tanto quanto eu estava disposta a soltá-lo. Raence parecia ter mais força de vontade, pois foi quem tomou a atitude de nos separar, não completamente. Era bom saber que ansiava tanto por mim quanto eu por ele. Nossos lábios deixaram de se tocar, mas suas mãos seguiam pressionadas em meu corpo, o deixando próximo ao dele. Minha energia se acalmou, tornando-se uma corrente lenta, confortável e acolhedora assim como a sua.

Mirei seus olhos, meu rosto enrubescendo. Não fazia ideia do que viria depois do beijo, não fazia ideia do que dizer. Nunca tinha feito aquilo, era uma sensação esmagadora e eu estava perdida. Quando sua boca abriu e o som a deixou, um pouco do peso deixou meu ombro.

- A primeira pessoa a aceitar quem você é tem que ser você mesma - ele sussurrou. - Só não deve ser sobre o que você pode destruir, mas sobre o quão poderosa você pode ser.

- O que... isso... - engasguei com as palavras. Queria dizer alguma coisa, queria falar o quanto tinha sido incrível, mas ele já sabia de tudo aquilo.

O sorriso pequeno, mas sincero em seus lábios quase me fez derreter. Raence colocou uma mexa do meu cabelo atrás de minha orelha e se inclinou para deixar um beijo suave em minha bochecha, me obrigando a fechar os olhos, como se fosse me ajudar a sentir mais.

- Sabe - sibilou ao pé do meu ouvido -, vê-la sem palavras é muito satisfatório.

Respirei fundo, sentindo sua provocação reverberar dentro de mim. Espalmei as mãos em seu peito e o empurrei levemente.

- Não estou sem palavras, não se ache tão importante.

- Eu jamais cometeria tal erro, princesa - declarou com pompa.

- Obrigada - agradeci em voz baixa. - Por me ajudar, por me treinar, por não ser como os outros.

- Agora é você quem não deveria agradecer por isso. Não é nada demais respeitar você e saber que pode ser tão ou mais forte que eu. Não deve me agradecer apenas por fazer o mínimo.

- Não acho que seja o mínimo. Sabe, antes achei que você era alguém de caráter ruim e inescrupuloso. Quer dizer, perdi as contas de quantas pessoas matou na minha frente. Mas agora, depois de ter passado por algumas coisas e depois de... - hesitei - entender você, só consigo vê-lo como alguém que faz o que deve ser feito e admiro sua coragem para isso. O que eu quero dizer é que depois do que eu fiz, muitos me veriam como um monstro, da mesma forma que eu o vi antes. Mas você, vocês - corrigi - me aceitaram e me entenderam, como eu não tinha sido capaz de entendê-los.

- Eu seria um hipócrita se julgasse seus demônios e seria um mentiroso se dissesse que não gosto deles. Prefiro vê-la com uma chama assassina no olhar, faiscando de ódio por mim ou por quem seja do que vê-la contida, presa como uma fogueira cercada por água. Prefiro vê-la quando cede o controle, quando se deixa sair. Nunca a julgaria por ser quem é, sendo boa ou ruim.

E talvez fosse aquilo que me deixava tão afoita por ele, tão vulnerável para ele. Sua forma de ver as coisas era completamente diferente de tudo o que eu conhecia. Ele me via, a mim realmente. Ele conhecia cada sentimento ruim que já passou pelo meu corpo e me olhava com mais intensidade do que qualquer um já havia me olhado. Parecia me admirar mais do que meu pai, do que Jaxin ou qualquer outro um dia fora capaz de me admirar, apesar de todas as jóias e vestidos bonitos que eu pudesse usar. Ninguém jamais me olhou como ele fazia.

Me sentia mais leve com aquele clima, mais familiarizada. O gelo fora quebrado e me perguntei se ele tinha o feito de propósito. Conhecendo-o, podia imaginar que de fato tinha sido proposital. Sua mão escorregou, lentamente, até alcançar a minha. Como se fosse algo comum, cotidiano, as duas se entrelaçaram. E naquele momento, me vi à vontade para questionar algo que há muito já estava curiosa.

O Diadema Da Coroa [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora