Josephine
Tic-tac, tic-tac, tic-tac...
Desvio o olhar da papelada para o relógio. - Meio dia. - Estico o corpo dando uma conferida no corredor do 12º andar, nenhum movimento suspeito. Não sei se choro ou comemoro. Dizem que as notícias ruins, por aqui, são transmitidas pela manhã, nunca á tarde.Há dias, sinto-me como se estivesse no corredor da morte. Roendo as unhas de ansiedade, sei que há qualquer momento, o carrasco vai entrar na minha sala e anunciar a execução. Eu sei, é só questão de tempo, talvez o RH esteja tão atolado que não conseguiu terminar a papelada da minha demissão. Passada a raiva, dei-me conta do tamanho da confusão na qual me meti.
Naquele sábado à noite, fui ao Café Estrela. Tentei relaxar... E quem disse que consegui? Até conheci dois ou três caras legais. Mas, o mauricinho cretino não saiu da minha cabeça. Inferno! Sua imagem ficou grudada como um carrapato. Era fechar os olhos e ver seu rosto na minha frente. Era abrir os olhos para vê-lo também. Contei meu drama quase compulsivamente. Uns acharam engraçado, outros nem tanto, mas todos foram unânimes em dizer para eu me preparar.
E agora, aqui estou eu nesta agonia bandida. Preparada e esperando. Nem sinal do Fiennes ou de comentários, nada. Tudo exatamente igual ao que era antes, quando eu ignorava a sua existência. O que é estranho e curioso. Sei que minha chefa não vai lá com a minha cara. Se ela soubesse de alguma coisa, já teria feito terrorismo.
A mulher é uma demônia.
Tento me concentrar no projeto à minha frente, não consigo. Jogo a lapiseira e a régua na mesa e me recosto na cadeira dramaticamente. Fecho os olhos respirando o ar abafado.
Ai como eu amo meu trabalho!
A minha sala!
Tudo bem que parece uma caixa de fósforos, mal cabe minha mesa e não tem janelas. Mas não importa, é minha e agora, por causa de uma esguichadinha de nada, estou a ponto de perdê-la.
- Josephine!
Jesus Cristo!
Arregalo os olhos e quase caio da cadeira com o grito. Tenho que segurar na mesa para não me estabacar. - Nossa, Natalia! Quer me matar do coração? - Nossa, digo eu. - Natalia entra em minha sala como um furacão. - O que está acontecendo com você, hein? Anda muito esquisita, Boneca.
- Impressão sua, estou a mesma de sempre.
Desconverso, mas Natalia franze o nariz.
Ela é uma das poucas pessoas que me conhece aqui na Fiennes Nos encontramos por acaso no RH, no primeiro dia. Curiosa já foi perguntando tudo sobre a minha vida e ofereceu-se para me levar até meu setor. Almoçamos e tomamos cafezinho quase todos os dias. Ela tem um tipo alegre e espalhafatoso. Sempre com roupas coloridas e divertidas. Um pouco atípico para uma secretária executiva, ainda mais, quando o cargo exige assessorar o diretor e o CEO mundial da empresa.
Desde então, desenvolvemos uma amizade instantânea. Ela é uma boba e nos fazemos rir o tempo todo.
- Mas não está igual mesmo! Faz mais de uma semana, que nem me chama para um café. Cruzei com o Miguel ontem, ele disse que quase não sai da sala. Está até pálida. É regime? Sabe que é magra, né?
Reviro os olhos. O que Miguel, meu colega de equipe, tinha que fofocar sobre mim? - Não estou de regime. Só que ...
- Só que nada! Precisa de sol.- interrompe arrumando os cabelos curtos impecáveis. Tão pretos que chegam a brilhar. - Venha, vamos almoçar pastel na barraquinha do Kimura. Tem uma reunião de diretoria esta tarde, preciso correr. O Todo Poderoso volta esta tarde. Minha paz acabou. O Shane disse que ele anda o capeta, parece que machucou o rosto e o negócio emperebou.
Quando entendo quem é o Todo Poderoso, congelo. Pereba é mal, muito mal. - Droga! Falei para ele cuidar daquele machucado!
Seus olhos negros dobram de tamanho. - Como assim, falou para ele? E desde quando se conhecem ou se falam? Ele mal tem tempo para circular por aí. - A gentê nem se conhece e nem se fala. - meu estômago ronca, levanto e pego a bolsa. - Foi só um esbarrão acidental.
Ela começa a me puxar para fora da sala, indo em direção ao elevador. - Vai me contar essa coisa de esbarrão acidental, nos mínimos detalhes.
Dito e feito.Natalia não sossegou até arrancar tudo de mim. Nesse tempo que trabalhamos juntas, tirando uma reclamação ou outra, nós nunca falamos abertamente sobre os chefões da cobertura. A minha imagem do CEO da empresa é do senhor na faixa dos sessenta anos, que vi em algumas fotos. Um ser quase mítico e inacessível, sentado entre as nuvens de deste arranha-céu, só admirando seu império. Jamais imaginei que o ranzinza que ela tanto fala, seria um homem jovem e maravilhoso. A louca quase engasgou com a azeitona do pastel de tanto gargalhar. As pessoas em pé, ao nosso redor, se divertiam com as expressões de espanto, nojo e euforia que ela fazia a cada detalhe que eu narrava.
- Sensacional, Boneca! Imagina o susto do Hero quando descobriu que era titica! - Sensacional uma ova! Entendeu que se não fui demitida ainda, foi só porque o Mauric... o Senhor Fiennes não veio trabalhar estes dias. Com certeza, vai ser a primeira coisa que vai fazer quando der as caras.
Ela arranca um pedaço do pastel e enfia na boca. Levanta o dedo, com a unha impecável vermelha, pedindo um minuto. - Esquece que sou a assessora dele? - fala de boca cheia. - Helloooo, ele falaria para mim se fosse demitir alguém... Despachei com ele todos os dias. Fez um monte de pedidos absurdos. Acredita que me infernizou, porque não tinha um crachá? Tenha santa paciência! Que CEO anda por aí com um maldito crachá pendurado no pescoço? Depois pediu para encaminhar a ficha de todos os funcionários do 10º, 12º e 19º e mais um monte de projetos. Fiquei três dias recolhendo as informações!
Agora sou eu, quem quase engasga. Perco a fome e largo metade do pastel no pratinho.
- Lascou-se! É isso!
- É isso o quê? - olha para os lados assustada.
- A ficha! Ele vai me demitir.
Natalia se ajeita no banquinho de plástico. Depois coloca a latinha vazia de refrigerante sobre uma mureta que estamos usando como mesa. - Nossa, faz todo o sentido agora! Tipo uma vingança maligna e para despistar, ele me fez levantar quase duas mil fichas. Como não me toquei disso antes?
- Não debochê, Natalia. É sério, poxa.
- Sério são os quilos que ganhei depois de três pasteis!
Desisto!
Pagamos os pastéis e voltamos caminhando pela calçada no meio de um formigueiro de gente indo e vindo na rua comercial. Na entrada da garagem, quase somos atropeladas por um SUV prata idêntico ao que foi buscá-lo no sábado. Eu deixo escapar um xingamento. Uma onda de adrenalina explode em mim.
É ele, eu sei que é ele!
O carro espera, nos dando passagem, espio de rabo de olho para ver quem está dentro, mas os vidros são muito escuros.
Impossível.
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Um Amor de CEO - Herophine
RomanceAos 25 anos, Josephine Langford, uma mulher decidida e pavio curto, decide radicalizar. Ela rompe com tudo que a sufoca e parte para um recomeço. Uma nova cidade, uma nova casa e novos amigos... A alegre e colorida Vila Madalena é o cenário simple...