CAPÍTULO 47.

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ALESSIA.

Mesmo vivendo sob o teto do meu pai, com minhas irmãs e mamãe, eu não me sentia em casa. Eu não sabia mais se algum dia voltaria a me sentir em casa. Havia tomado Las Vegas como meu lar e agora não tinha mais nada; nem minha casa, nem meu marido. As semanas se passaram numa confusão de sentimentos, ao mesmo tempo que eu sentia ódio de Nico pelo que fez, eu sentia a saudade arrebatadora que destruía meu coração. Meu único consolo era estar gerando uma vida, e esse também era o único motivo pelo qual eu comia e bebia. Pensei que ansiaria por algo assim, por ficar longe de Nico, mas agora era como uma faca no meu peito. Dez meses atrás eu não seria capaz de imaginar que ficar sem ele me destruiria lentamente. 

Eu era o fantasma da mulher que tinha sido no passado e sequer conseguia ficar feliz por meu filho. Em três meses de gravidez, eu não sentia nada. Carina dizia que tinha amado seus filhos assim que soube que eles estavam em sua barriga, mas eu simplesmente não sentia nada diferente. Mamãe tinha dito que quando eu ouvisse o som do coração do bebê batendo, eu o amaria. Não aconteceu. O tum tum tum alto e ritmado só me trouxe uma grande sensação de vazio. 

Alessa entrou no meu quarto num rompante e trancou a porta atrás de si. Eu ergui meus olhos para seu rosto concentrado e cheios de raiva. 

— Até quando você vai ficar trancada nesse quarto esperando que Nico milagrosamente mude de ideia e te leve para Las Vegas novamente? — Minha irmã tomou cuidado para manter a voz baixa, mas eu sabia que ela tinha vontade de gritar. 

— Não force a barra, Alessa. — Eu pedi com sinceridade. Não estava no humor de brigar e tinha a impressão que se eu começasse a falar não pararia nunca mais. 

— Eu sei que você deseja passar a gravidez ao lado do pai do seu filho, mas ele não quer Alessia. E do jeito que as coisas estão em Vegas, esse é o melhor. 

Eu sabia bem a que ela estava se referindo. A Camorra tinha se tornado ainda mais temida nos últimos dois meses e apesar da Aliança, Thomaz estava preocupado. Nico estava dizimando qualquer um que ele desconfiasse de tê-lo traído junto de Dante; mais de trinta soldados tinham sido mortos, a Camorra passava por tempos obscuros e as pessoas começavam a seguir Nico por medo e não pelo respeito que tinham outrora. Não havia nenhuma notícia sobre Nino, então presumi que Nico o tinha mantido fora dos olhares públicos. 

— Alessa, por favor. — Eu pedi uma última vez. Meus lábios estavam dormentes e meu coração batia acelerado; eu queria uma briga, queria descontar toda minha frustração, mas não queria que fosse com a minha irmã. 

— Eu sei que você gosta dele… 

Foi a gota d'água. 

— Você acha que eu gosto dele? — Eu sibilei. — Eu o amo, Alessa! Eu estou sofrendo todos os dias como um inferno porque ficar longe dele está me destruindo! 

— Alessia, você está iludida pelo homem que pensa que ele é! 

— Você tem raiva dele pelo homem que  você pensa que ele é! Ele tem os malditos problemas dele, mas você acha que eu o amaria se ele não fosse bom para mim? — Eu realmente odiava os hormônios da gravidez. Eu nunca tinha sido chorona assim no passado, mas agora estava desabando em lágrimas enquanto minha irmã me observava com assombro. — Sabe o que é pior, Alessa? Eu sei que ele me ama e que ele não consegue aceitar nada de bom na vida dele, sei que ele está sofrendo tanto quanto eu e é como se eu conseguisse sentir a dor dele! 

— Irmã… — Alessa disse baixinho antes de se aproximar e colocar as mãos em meus ombros que tremiam pelo choro. — Eu sinto muito. 

Eu chorei ainda mais com suas palavras doces e gentis. 

— Porque ele não pode ficar comigo? Com o filho dele? — Eu tive vergonha do quão patética eu soava, mas não havia julgamento nos olhos de minha gêmea. — Eu só queria estar com ele… 

Alessa me abraçou apertado e eu deixei as lágrimas descerem contra o ombro dela. 

×
×
× 

Outro mês se passou. A dor aos poucos foi diminuindo, dando espaço a raiva. Eu amava Nico, mas sua renuncia ao nosso casamento estava me destruindo. Ele poderia não está sofrendo, afinal. O que eu sabia? Ele sequer tinha me mandado uma mensagem, mas eu também não tinha. Continuariamos no nosso tratamento silencioso pelo resto da vida ou até nosso filho nascer. O inchaço em minha barriga tinha se tornado mais proeminente, os quatro meses de gestação tinham mostrado seu preço. Grávida. E todo mundo sabia. Eu podia ouvir os sussurros das pessoas quando eu saia com meus pais e irmãs. Todos se perguntavam se eu tinha sido devolvida aos meus pais, se meu marido estava insatisfeito comigo, ou pior, se o bebê que eu carregava não era dele. Eu quase ri ao ouvir esse último. Se Nico desconfiasse que eu carregava o filho de outro homem, ele me mataria sem pestanejar. 

Me deitei na cama para tentar dormir e novamente a tristeza me tomou. Eu conseguia passar o dia sem pensar nele, mas a noite era brutal. Enquanto eu rolava insone pela cama seus olhos cinzas pairavam em minha mente. Nem mesmo mudar o lado da cama fazia alguma diferença; ele não estava ali. Mas eu estava e não conseguia continuar sem ele. As lágrimas vieram como todas as noites e eu as deixei rolar por meu rosto conforme a dor era demais para suportar. Como em todas as noites também peguei o celular e abri sua janela de mensagens, como em todas as noites eu encarei através da cortina de lágrimas de lágrimas seu nome salvo como amor, como em todas as noites, eu desliguei o telefone sem mandar qualquer mensagem e me acomodei na cama chorando até adormecer. 

Como em todas as noites, a dor fora tão grande que me senti grata por dormir sozinha no quarto de hóspedes, onde podia chorar por horas a fio sem ninguém para me achar patética, sem ninguém para me julgar… Sem ninguém para me acolher.

INCÊNDIO - SAGA INEVITÁVEL: LIVRO 2. | CONCLUÍDO.Onde histórias criam vida. Descubra agora