CAPÍTULO 9.

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ALESSIA

Toda a casa era linda, uma arquitetura belíssima e intrincada, mas o quarto de Nico era humano, cheio de pedaços sobre a alma dele, cheio dele. No entanto, a beleza de suas fotos perfeitas foram assombradas pelas fotografias violentas; um tubarão comendo um ser humano, um tubarão no meio de um tanque com a água vermelha, uma pessoa com uma chave de fenda enfiada no olho e outra com a garganta cortada… Meu coração bateu mais forte no peito, o medo me tomando. Dei um passo cambaleante para trás e bati em algo duro, logo percebendo que era Nico, pois ele passou os braços ao meu redor e me apertou contra ele. Soltei um suspiro de medo por estar tão perto dele, mesmo que seu calor fosse extremamente bem vindo ao meu coração gelado de espanto.

—Podemos retirar essas fotos. Podemos mudar de quarto. Você só precisa dizer e eu farei. — A voz dele soou estranha, rouca, quase amedrontada. Ele tinha medo de que eu vessse esse seu lado? Ele tinha medo de que eu o odiasse? 

— Você tirou todas essas fotos? — Dei ênfase na palavra todas porque por mais que eu quisesse saber se ele tinha fotografado aquelas mortes, eu não queria perguntar diretamente, não queria… Porra. Não queria provocar mais dor na voz de Nico, mesmo que eu não devesse isso a ele. 

— Sim. — Meu marido sussurrou nervosamente, a voz falhando. Estremeci em seus braços e ele me segurou com mais força. 

— Porquê? — Perguntei mesmo sem saber se gostaria da resposta. Nico suspirou contra meus cabelos e apoiou o nariz em minha cabeça. 

— São monstros. Pessoas nojentas, fodidas pra caralho, há certa parte de mim que fica satisfeita em fotografar suas mortes, porque elas mereceram. 

Nico era um enigma que eu não conseguia resolver, numa analogia idiota, ele era a fase difícil do Candy Crush que eu não conseguira passar, mesmo quando juntos tentamos por seis vezes. Ele era gentil e doce num momento, noutro, se tornava predatório e cruel. Eu ainda não tinha esquecido a escuridão em seus olhos cinzas quando ele surtou e se forçou sobre mim, não conseguia tirar da cabeça o olhar de dor e culpa que veio quando ele percebeu o que tinha feito; havia algo cruel em Nico, mas também havia algo quebrado, e eu me odiava por querer conserta-lo, homens como ele não tinham conserto, não tinham salvação. Porém, mesmo que quisesse fugir, forcei-me a continuar firme, forcei minha voz a sair doce e gentil, porque eu sabia que irrita-lo não era algo que me renderia boas experiências. Se eu quisesse dobrar Nico Parisi, precisava faze-lo gostar de mim. 

— Você pode tirar as fotos ruins enquanto eu tomo banho? — Pedi baixinho. — Eu gosto das outras, mas essas me perturbam. 

— Sim. — Nico respondeu sem hesitação. — Irei tirar todas, não deixarei nenhuma. 

— Nico… — Sussurrei e fiquei feliz por estar de costas para ele, assim ele não veria meu rosto contorcido em pavor. — Depois do banho, precisamos conversar. 

Ele suspirou antes de deixar seus braços caírem e me dar liberdade. Caminhei em direção ao banheiro e me tranquei dentro dele. O lugar tinha um tamanho de um quarto mediano, com uma banheira de hidromassagem luxuosa, dois chuveiros no nível do chão, uma enorme bancada de mármore preto com duas pias e armários sob elas e um espelho de dimensões gigantescas na parede atrás das torneiras. Me encaminhei para um dos chuveiros depois de tirar minhas roupas e tomei o mais logo banho de minha vida, tanto porque me sentia cansada e suja pela viajem, tanto porque não queria sair e enfrentar Nico. Haviam diversas perguntas em minha mente, e eu não sabia se ele responderia pelo menos a metade delas. No entanto, eu não queria viver uma vida miserável, cheia de medo, precisava encontrar alguma forma de chegar até ele, e tinha certeza de que poderia ser mais bem sucedida se usasse gentileza e palavras calmas. Eu costumava ser curta e direta até mesmo com Thomaz e papai, mas a rudez não me levaria a lugar nenhum, não com Nico Parisi. Após quase uma hora de reflexão, desliguei a água e me enrolei numa toalha grande que tampou meu corpo da clavícula até as canelas. Saí do banheiro foi uma verdadeira prova de fogo, que me exigiu coragem, mas felizmente Nico não estava no quarto, as fotos mórbidas também não. Peguei um par de lingerie confortáveis, calça de moletom cinza e uma blusa de seda com alças finas antes de voltar para o banheiro e as vestir rapidamente. Ao sair do banheiro pela segunda vez, não tive a mesma sorte de antes. Nico estava sentado na poltrona de couro frente a cama, observando sua parede repleta de imagens de Las Vegas; ele realmente deveria amar a cidade para dedicar uma parede inteira as paisagens dela. 

— Sobre o que você gostaria de conversar? — Nico perguntou casualmente, mas havia um brilho de ansiedade em seus olhos cinzentos. Me sentei na cama de frente para ele e cruzei as pernas sob mim. 

— Sobre nosso casamento. — Respondi. — Gostaria de falar sobre como iremos levar esse compromisso. 

— O que você sugere? — Nico perguntou apoiando os cotovelos nos joelhos. 

— Bom, num casamento, a confiança é essencial. Então, eu preciso que você me conte o que aconteceu ontem. Você parecia disposto a ser carinhoso e gentil, depois, foi… 

— Um monstro. — Ele completou ressentido. Desviei os olhos, as memórias de seu rosto distorcido em fúria e medo, junto da dor que senti, me fez voltar a ficar receosa. — Eu… Sinto muito. Por minha honra, eu sinto muito. 

Um arrepio correu por minha pele ao ouvi-lo jurar pela honra que sentia muito. A honra de um homem da máfia, especialmente de um Capo, era algo muito sério, e jurar por ela requeria total sinceridade; um mafioso nunca mentiria ao colocar sua honra em jogo, mesmo os russos tinham esse código, e os russos eram bárbaros. 

— Eu acredito. — Disse com sinceridade. — Mas… Não foi isso que eu pedi. 

Nico suspirou e se colocou de pé, ficando de costas para mim enquanto andava pelo quarto. Seu corpo estava inquieto, sua respiração acelerada. 

— Você tocou minha nuca. — Ele disse simplesmente. Continuei calada, sem entender o que ele queria dizer com isso. Era algo normal, não era? — Isso me trouxe lembranças que me tiraram do controle. 

Também me levantei e me aproximei até parar de frente para suas costas. Eu sabia que Nico tinha consciência da minha presença e que não se virava por querer, mas não me importei. Lentamente toquei o lado esquerdo de seu quadril e mantive a mão ali. 

— Se você tivesse me dito antes, eu teria lhe tocado aqui, por exemplo. — Sussurrei. Não tinha ideia do que poderia lhe trazer traumas tão grandes que o simples toque em sua nuca causasse tanto dano. Levei minha mão até seu bíceps e acariciei gentilmente. — Ou aqui. 

Nico exalou profundamente antes de se virar e me encarar, deixei minha mão cair, mas ele a segurou e puxou nossas palmas unidas em direção ao seu peito quente. Meu estômago afundou ao ver a tristeza no olhar dele, a vulnerabilidade, a guerra que parecia travar dentro de si. 

— Quando você estiver pronta, podemos tentar novamente. 

Um sentimento doce e denso se apossou de mim, como mel quente em minhas veias. Eu já havia confiado nele uma vez e isso me rendeu dor e choro, mas ainda assim, a tristeza penetrante em seu olhar me desarmou. Como um homem tão forte, impiedoso e letal poderia parecer tão vulnerável? Um garoto ferido, era isso que Nico parecia, mesmo sendo um homem capaz de matar, torturar, roubar e desmembrar. 

— Podemos nos conhecer melhor antes disso, sim? — Sugeri apertando sua mão. — Conversar, jogar, ver filmes, dormir perto… 

Um pequeno sorriso surgiu no rosto de Nico e ele se aproximou mais de mim, roçando seus lábios em minha bochecha. 

— Beijar está na sua lista? — Ele brincou com uma risada baixa que fez cócegas em meu pescoço. Não pude evitar sorrir. 

— Sim… 

Nico segurou meu rosto entre as mãos e me beijou lentamente, seus lábios deslizando pelos meus numa carícia gentil. Eu o beijei de volta e automaticamente ergui meus braços para abraçar seu pescoço, mas me detive num rompante quando seu corpo ficou tenso e sua boca ficou imóvel contra a minha. Desci meus braços e o abracei pela cintura, afastando minha boca da dele por um momento. 

— Desculpe. — Pedi baixinho contra seus lábios e o abracei com mais força. Nico não disse nada, apenas assentiu, mas felizmente a escuridão em seus olhos se dissipou aos poucos e ele me beijou novamente, com o mesmo carinho e gentileza de antes. Me entreguei ao beijo, deixando que ele guiasse sua língua por minha boca enquanto descia suas mãos por meu corpo.

— Você é linda. — Ele sussurrou contra meus lábios. 

— Você também é. — Tentei fazer parecer uma brincadeira, mas até eu podia ouvir a sinceridade em minha voz. Meu marido sorriu, exibindo os dentes perfeitamente alinhados e eu me peguei admirada por seu belo rosto, por seus longos cabelos loiros, sua barba por fazer, seus olhos cinzentos e cheios de sentimentos. — Tão lindo… 

Meu rosto corou ao dizer aquilo, mas o sorriso tímido de Nico fez meu coração acelerar.

INCÊNDIO - SAGA INEVITÁVEL: LIVRO 2. | CONCLUÍDO.Onde histórias criam vida. Descubra agora