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Lúcifer permaneceu de pé na pequena varanda, ainda era vestida pela sútil camisa social branca de botões abertos. Ohana a sua frente podia fitar o abdômen a mostra, a parte superior da lingerie branquíssima como neve. A noite era nublada, não se via estrelas, e a pouca luz da lua, era ofuscada pelos enormes prédios em Los Angeles.

-Ohana: Se fosse humana já teria morrido de cirrose. - afirmou paciente, quando viu a agora então namorada erguer o copo delicado aos lábios com uma quantidade exacerbada de conhaque.

-Anitta: Eu sei. - respondeu-lhe no mesmo tom, paciente. 

-Ohana: Posso te fazer uma pergunta? - questionou calma, encostando-se melhor na proteção.

-Anitta: Faça. - permitiu, erguendo o conhaque aos lábios outra vez. Aquilo era no mínimo, sexy, ao ver da puritana.

-Ohana: O que você enxerga em mim? - questionou baixinho. - Eu costumo dizer que a gente só enxerga aquilo que tem. É como se fôssemos espelhos uns dos outros, tendo a oportunidade de descobrir pequenos fragmentos nossos. Em cada pessoa observada. Não é óbvio? A gente só consegue reconhecer aquilo que um dia já foi conhecido. Né? Então... o que você enxerga em mim?

Aquele falar puro atingiu subconscientemente o Diabo, Lúcifer colocava-se em posição de atenção. Ouvia cada dito com extrema cautela, colocando-se à pensar.

-Ohana: No fundo, nós humanos achamos que a vida funciona como num filme. A gente 'tá sempre querendo saber o que vai acontecer lá no futuro. Qual vai ser a conclusão das nossas tramas. Se tudo que a gente construiu na vida, deu certo ou errado. Então a gente passa anos e anos, à fio. Na expectativa de superar uma única linha de chegada, onde a gente vai olhar e vai dizer: "Que baita filme."

Lúcifer olhava-a com calmaria, mantinha o copo de conhaque a longos segundos sem ir aos lábios. Os olhos bordô davam atenção a cada fala, realmente ouvir aquilo fazia-a entender o emocional da garota.

-Ohana: Mas a vida é um filme, para nós. Nem sempre é um "baita filme", as vezes se finaliza em desgraças. Mas não pra você... ela só continua, e continua... sem um fim. As vezes eu me pergunto: "será que vale a pena, correr atrás de um único final feliz?" Se a vida é sobre aproveitar todo esse caminho.

Larissa permaneceu estática.

-Ohana: Você as vezes diz que sou... otimista. - proferiu e Lúcifer ergueu o olhar, fitando-a outra vez. - Eu sou a pessoa mais pessimista que conheço, desde que vi você. Estou sempre lembrando que um dia, a vida acaba. Me convenci da realidade da morte e de que nada disso aqui é pra sempre. Que eu posso perder tudo que eu tenho... assim... - estalou os dedos. - Eu vivo a vida com uma interminável sensação de nostalgia, saber que tudo isso um dia acaba... me faz simplesmente... querer viver mais do que posso.

-Anitta: Fecha os olhos. - pediu baixinho, após colocar o copo com conhaque sobre a mesa de canto e retornar até a loira. 

Ohana os fechou e sentiu o tocar leve de Lúcifer, o corpo estar próximo ao seu. A brisa fria que vinha, levava seu corpo a arrepiar. Entretanto, toda sua atenção era dada a não tão jovem mulher a sua frente. Mesmo com os olhos fechados, seus ouvidos colocavam-se a mercê dela.

-Anitta: A realidade mundana é a maior ilusão que existe. - disse baixinho, acariciando-lhe a face. - Por quê? Porque cada um de vocês, tem uma percepção diferente, da mesma realidade. As vossas mentes só trabalham com a informação que tem. E cada um de vocês, está em contato com múltiplas informações diferentes. 

Ohana abriu os olhos sorrindo fraco pela explicação bem dada por Lúcifer, ela era bem didática para fazer a loira entender aonde queria chegar.

-Anitta: Então mesmo que as suas percepções sejam muito parecidas... ainda assim não são iguais. Ou seja, a realidade é nada mais daquilo que acredita que ela seja. Correto?

Ohana encarou-a assentindo, e logo viu o sorriso belo e branquíssimo surgir entre os lábios róseos. Permaneceu parada, sentindo o tocar leve ainda mantido por Lúcifer. Os lábios de Larissa possuíam o gosto forte do conhaque, mas seu hálito era leve, aquele cheiro de álcool de alto patamar levava a loira a agraciar-se da elegância de Lúcifer. Qualquer mínimo ato comedido por ela, era simplesmente magnífico.

-Anitta: O que você faz que é muito bom? - questionou baixinho e Ohana pareceu pensativa. - Que seria um desperdício se você não fizesse. - ressaltou levando-a a ficar um pouco mais pensativa. - Algo que você faz de forma única, e pode oferecer para o mundo. - Ohana permaneceu silenciosa, não sabia o que dizer. - Se não consegue me dizer, vou falar o que vejo em você: Você é uma ótima companhia. Faz as pessoas rirem, ah... tem um coração grato como de ninguém! - aquilo fez os olhinhos castanhos marejarem. - Viu? Nem tudo que a gente faz, precisa ser explícito. Você tem tanta coisa boa pra oferecer pro mundo. Não prenda-se ao pensamento de que: "Tudo isso um dia virá a acabar."

-Ohana: Mas virá, meu bem. - soou baixinho, e Lúcifer logo sorriu, negando insistentemente com a cabeça.

-Anitta: Para pra pensar comigo. Se a vida for um jogo, você está perdendo ou ganhando? - questionou e Ohana sussurrou um leve, perdendo. - Por quê?

-Ohana: Eu não sei dizer... - sussurrou paciente. Os olhos castanhos e visivelmente humanos como os seus, ainda chamavam-lhe atenção como as íris bordô.

-Anitta: Você ainda não tem todas as manhas pra passar? Acabou utilizando todas suas vidas? Concretizando todas as suas vontades? Acredite em mim, você ainda tem vida para  utilizar. Este pensamento de: "fim"... é só um pensamento difícil. Você só perde ou ganha um jogo quando ele acaba.

-Ohana: Não tenho muito tempo, não sou como você. Além do mais, não há quem ditar, quando o tempo acabará.

-Anitta: Você não sabe quanto tempo tem... - sussurrou fraco, afagando a bochecha alheia. - Eu sou o Diabo, minha pequena. E se eu disser que tudo que acredita sobre o futuro, é completamente inventado pela sua cabeça? E esse ciclo que se repete entre vida e morte, por cada mundano, é uma coisa pequena.

-Ohana: Lúcifer... - chamou com os olhinhos ainda marejados em confusão, o conforto lhe transmitido a cada palavra a retirava do concretizar.

-Anitta: A minha relação com a busca pela felicidade é uma questão antiga. - disse paciente, tocando o rosto feminino, levando-a fitar-se outra vez. - Nós anjos, sejamos caídos ou ainda puros. Arcanjos, demônios, príncipes infernais... a gente passa a maior parte do tempo, procurando por... decisões que nos farão mais felizes ao fim. Então a gente recalcula a rota, recomeça, redireciona, reestrutura, renasce. Para que... em meio a essa confusão toda, encontremos ao menos um resquício de felicidade.

-Ohana: Não entendo. - disse baixinho.

-Anitta: Passei milênios para encontrar-te, não deixarei ir em 70 ou mais anos. - disse baixinho. - Não, não vou deixar que se vá, após concluir uma vida renomada, com uma carreira incrível. Darei a ti a sensação magnífica da vida, assim como destes a mim. O vangloriado, Amor.

-Ohana: Não quero perder você, nunca. - disse baixinho. - Talvez ser pura como diz-me não parece ser uma boa ideia. As vezes paro pra pensar e acho que o inferno seria-me um ótimo caminho. Ao menos eu estaria perto de você, mesmo que não pudesse tocar-te.

-Anitta: Não coloque-se a pensar assim. O inferno é um lugar belo para mim, mas não para os que vão por pecado. - explicou paciente.

-Ohana: Então... teremos uma vida incrível, como um "baita filme"? E depois... levarás-me para o túmulo? - sorriu fraco, com os olhinhos ainda marejados.

-Anitta: Não levarei-te ao túmulo. - sorriu fraco. - Levarei-te ao trono, para que reine comigo.

Desejo Pecaminoso - OhanittaOnde histórias criam vida. Descubra agora