_Não precisa se dar ao trabalho. Ela não vai mudar.... Nunca mudou. -Soltei um sorriso forçado._Ela parece ser tão legal... -Lauana expressava descontentamento.
_Ela é. Não é uma pessoa ruim. Nós duas é que não nos damos bem na maior parte do tempo. -Sorri.
_Você já preencheu o formulário? -Ela fugiu do assunto.
_Sim. Fui jogada para o tiro esportivo e você?
_Ah, você está de sacanagem? Meu sonho era estar nas aulas de tiro. Eu fui jogada para natação. -Ela revirou os olhos.
_Você reclama demais, cara. -Ri.
_Se não for para reclamar como uma senhora de oitenta anos, eu nem quero. -Ela ajeitou os cabelos e sorriu.
_Mas então, não acha que a gente deveria voltar para a sala? -Me levantei.
Ela assentiu com a cabeça e nós voltamos para a sala.
•
Assisti as aulas de termodinâmica com muita atenção, ainda mais porque eu odeio física. Às vezes eu me pergunto se aqui é realmente o lugar ideal para mim. A professora até que era legal. A mais descontraída até agora, claro, sem perder a formalidade. Mas ela não tinha cara de mal e não me dava medo.
_Mal posso esperar até o final do dia, quero voltar para casa. -Lau se jogou na cama.
_Eu vou sair amanhã, Lau. Hoje eu tenho que ficar. -Bufei.
_Mas nosso show está de pé, não é? -Ela indagou, tirando seus sapatos.
_ Está! Eu só preciso ficar aqui até amanhã às tarde. Depois da barca é rapidinho. -Sorri.
_Mara, eu tenho natação agora. Mais tarde nos falamos, pode ser? -Ela sorriu e me deu um beijinho no topo da cabeça.
_ Quantas vezes na semana? -Perguntei.
_Duas. Segunda e sexta. -Ela sorriu e saiu do quarto.
Deitei na cama e fiquei olhando para o teto, pensando em como as coisas mudam de uma hora para a outra. Há um ano atrás eu era apenas uma menina que não fazia ideia do que queria e hoje... Eu estou aqui dentro. Às vezes eu sinto como se tivesse me encaixado no mundo, outras vezes me pergunto se realmente pertenço a este lugar.
Saí do quarto e desci as escadas. Fui andando em direção ao Pontal, não queria socializar. Abri meu livro e me afundei no meu universo quase que, particular. Estava em outra dimensão. Não me cansava de ler, pela décima vez, o livro "a viajante do tempo". Quando menos espero, meu silêncio é interrompido.
_Você está em todos o lugares mesmo. -Disse uma voz que meu corpo
conhecia muito bem._Bom dia, professora Marília. -Sorri.
_Posso me sentar? -Ela perguntou.
_ Sim. -Disse chegando para o lado.
_Então você gosta de ler? -Ela perguntou num tom descontraído.
Ela era natural e sútil, na maior parte do tempo. Mas ela me tirava da minha bolha que construí e isso mexia comigo em todos os sentidos. E então, não conseguia falar. Essa mulher causava espasmos em lugares que eu não sabia que eram sensíveis. Ela virava e revirava a minha cabeça quantas vezes quisesse. Já sabia do poder que sua presença causava em mim. Era visível. Eu tinha vontade de sair correndo, ao passo que, tinha vontade de nunca mais sair dali.
_ O gato comeu sua língua? -Ela riu.
_A-ah, me d-desculpe. -Gaguejei.
_ Tudo bem. -Ela sorriu.
_Como você veio parar aqui? -Ela perguntou.
_Fiz a prova e passei em primeiro lugar, então vim para cá. -Sorri.
_ E você? -Perguntei timidamente.
_ Longa história... -Suspirou. - _Meu pai era Capitão de guerra da marinha. Então, basicamente, cresci aqui dentro. -Ela sorriu.
_ É... Sei como é... -Fechei o livro.
_Ele faleceu no dia da minha formatura. Já estava muito doente. Às vezes parece que ele só estava esperando por isso... -Seu tom era triste.
_ Ele está num lugar onde não há dor. -Tentei confortá-la.
_Às vezes eu me pergunto se ele se orgulha da mulher que me tornei. -Ela tirou os olhos dos meus e olhou para o céu.
_Tenho certeza de que sim, senhorita Dias. Você é extraordinária. -As palavras saíram antes que eu pudesse perceber.
_Então você me acha extraordinária? -Seu tom era meio rouco e sexy.
_M-me desculpe. -Eu me embolei nas palavras e coloquei as mãos no rosto, escondendo minha vergonha.
Ela me olhou, mais uma vez. Senti seus olhos percorrerem todo o meu corpo, enquanto eu tentava me acalmar. Marília fez carinho na minha mão com a ponta dos dedos. Parecia fazer com naturalidade, não tinha medo e não estava nervosa... Já eu... Eu estava uma pilha de nervos! Queria gritar e queria ficar em silêncio. Minhas mãos suavam frio e meu rosto estava vermelho. Sentia meu coração palpitar aqui dentro. Era inacreditável. Ela só pode ser feiticeira, das brabas! Daquelas me sopram pó e deixam a gente com os olhos violetas!
O efeito que Marília causava em mim era tempestuoso. Varria tudo o que eu tinha construído, bem como vivido. Era como se eu tivesse acabado de nascer e não soubesse absolutamente nada da vida, nem mesmo quem era. Ao mesmo tempo, era como se eu pertencesse aquele momento. Emanava paz infinita, pois estar em sua presença, também me fazia poder finalmente, respirar sem medo.Mas o medo... Às vezes consome a gente, não é?
_ Eu preciso ir, senhorita Pereira. -Ela se recompôs e levantou.
_Não se atrase para a minha aula. -Disse ela, e em seguida, saiu andando.
Esperei ela sair e me joguei no gramado. Coloquei o livro em cima do meu rosto, enquanto tentava processar tudo aquilo.
_ É coisa da sua cabeça, Maraísa. Ela não estava fazendo nada demais. -meu subconsciente tentava me acalmar.
Você nem se quer consegue entender o que se passa dentro de ti. Precisa se manter calma, Maraísa. Você pode acabar se prejudicando.
Peguei meu livro e fui para o refeitório. Olhei a hora no relógio, eram dez para uma. Comi rapidinho e subi para o dormitório.
_Lauana? -Entrei com cuidado no quarto, rezando para ela não estar ali e não me perguntar sobre a minha cara pálida.
Ela estava. Sentada, mexendo no celular. Toda desengonçada, mas muito fofa. Lau estava sendo uma boa amiga, até. Tudo bem que às vezes ela é atrasada e avoada, mas eu supero.
_E aí, maluca. Pensei que você tivesse voltado para casa à nado. -Ela disse.
_Eu estava lendo. -Baguncei ainda mais o cabelo.
_Hm... Por que está vermelha? -Ela me olhou nos olhos.
_Calor... Muito calor. -Desconversei.
_Não sabia que calor tinha forma humana. -Ela caçoou.
_Vai tomar o seu banho para irmos para a aula. Sabe que a senhorita Dias não gosta de atrasos. -Ela jogou minha toalha.
Entrei para o chuveiro e fiquei ali, pensando, enquanto a água caía sob meu corpo. Não podia evitar os arrepios que vieram quando eu pensei em Marília. Definitivamente eu não sabia o que estava acontecendo comigo.
Por que você faz questão de ser presente em mim?
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Indomável coração || Malila
FanfictionCarla Maraísa é uma adolescente de dezessete anos que acabou de entrar para a tão sonhada escola naval brasileira, uma instituição de Ensino Superior da Marinha do Brasil que tem por objetivo formar mental e fisicamente jovens brasileiros que irão o...